Pressupostos textuais do comentário
Ponto 1 - Infelicidade terminológica da expressão (dignified existence)
1.1 - Carácter vazio de conteúdo da expressão
1.2 - Proposta de preenchimento da expressão como tutela objectiva, conferida reflexamente pela ordem jurídica aos animais
Ponto 2 - Carácter sistemático do texto que nos revela ao longo desenlace silogístico um argumento de proximidade entre humanidade e animalidade
2.1 - Como dar Liberdades a um ser não pensante e sem noção da sua Liberdade
Ponto 3 - A "dignified existence" como questão de Justiça
Ponto 4 - A pretensa insuficiência dos mecanismos de justiça

A questão tratada no texto objecto de comentário, remete-nos ainda que não directamente, para um porta-estandarte típico dos Ecofundamentalistas, os supostos direitos dos Animais. Terão os animais verdadeiramente direitos? Terão sequer direitos ou será esta "dignified existence" uma tutela objectiva conferida aos animais reflexamente?
Os animais não são titulares de relações jurídicas, é certo que existem normas jurídicas dirigidas no interesse dos animais, como aquelas que por exemplo proíbem os mais tratos sobre os mesmos ( Dec.-Lei 5650 de 19 de Maio de 1919) ou que determinam medidas no sentido da sua protecção ( Lei 90/88 relativa ao Lobo Ibérico), porém tal não quer dizer que se estabeleçam regras entre homens e animais e que estes tenham direitos subjectivos a serem bem tratados e protegidos.
O fim desta tutela jurídica é "o bom costume ofendido pelas sevícias inúteis ou a utilidade que eles podem representar para a sociedade"-GROPPALI.
Estamos sim perante normas jurídicas ordenadas para fins sociais, ou seja as vantagens que os animais retiram das disposições legais que lhes são favoráveis constituem efeitos secundários e reflexos da tutela jurídica que lhes é indirectamente dispensada.
A discussão da possibilidade de a personalidade jurídica ser conferida a animais deve-se à acção e persistência das associações de defesa dos animais e de protecção do ambiente e à sua visão ecofundamentalista, tanto do ambiente, como dos animais, que levou em 1978 à proclamação em Paris da Declaração Universal dos Direitos do Animal, em cujo preâmbulo se diz «Todo o animal possui direitos», e se consagram direitos à igualdade, à existência, ao respeito mesmo depois de mortos, à duração de vida de acordo com a sua longevidade natural, além de se prescrever que os direitos dos animais devem ser defendidos por lei, como se de Direitos do Homem se tratasse.
Torna-se aliciante dotar o animal de personalidade jurídica. Alega-se também que dotados de personalidade jurídica os animais poderiam ter os seus interesses jurídicamente tutelados e representados em juízo por terceiros da mesma forma que ocorre com os incapazes.
A questão é que a personalidade jurídica mantém laços demasiado estreitos com a capacidade jurídica apesar destas não se confundirem.
Perante os incapazes há meramente uma limitação no tocante à capacidade jurídica, pois a personalidade jurídica não lhes é concedida de forma limitada, por sua vez o animal não pode ser dotado de personalidade jurídica, porque esta seria limitada assim como os seus efeitos.
A atribuição de personalidade jurídica aos animais com o argumento destes serem capazes de sofrer assenta numa pretensa igualdade entre os animais e os incapazes, baseada em critérios de racionalidade.
Alega-se que a inteligência e consciência de alguns incapazes não é superior à dos animais. Tal concepção afigura-se-nos repugnante do ponto de vista da dignidade da pessoa humana, pois o animal em algumas circunstâncias pode a título de exemplo, aparentar ser mais inteligente do que a criança, apesar da criança crescer, ter consciência e domínio das suas funções psíquicas, o que nunca acontecerá com o animal, pois este nunca terá tomada de consciência de si próprio.
Defender uma igualdade entre animais e incapazes é abrir a porta a uma ideologia capturante, equiparada às atrocidades cometidas em favor das segregações sociais, exploração humana e até mesmo ideiais nazis de uma pretensa raça superior.
A personificação dos animais desembocaria no reconhecer duma dignidade similar à humana, mas tal personificação nem sempre foi preconizada para dar melhor tratamento jurídico aos animais, pelo contrário, por vezes os pontos comuns que os aproximam foram invocados para negar a personalidade jurídica a certos humanos.
Há assim, quem argumente que reconhecer os direitos dos animais vem em conssonância com o reconhecimento de direitos a categorias cada vez mais amplas de beneficiários, através de uma tese de continuidade: estrangeiros, escravos, índios, negros, mulheres e tão logo os animais.
Esta argumentação representa uma fraqueza: Se não existem diferenças significativas entre humanos e animais, como justificar que apenas os humanos de entre de todas as criaturas devam respeitar a vida dos outros ser vivos?
Ora, os animais não hão de ter deveres e muito menos devem respeitar obrigações nas suas respectivas relações, pois falta-lhes a racionalidade.
Os defensores dos direitos dos animais, baseiam-se também por vezes em critérios de proximidade com as pessoas para alegar pretensos direitos dos animais.
Afigura-se-nos demasiado cruel, considerarmos a emancipação de algumas espécies animais levando em consideração relações de proximidade, pois tal faz com que sejam livres de opressão apenas os animais dóceis, que exteriorizam sentimentos que são perceptíveis ao homem, como se essa emancipação fosse um prémio pela sua sociabilidade.
Diz-se frequentemente que os animais amam e receiam, coloca-se-nos porém difícil imaginar um predador, que sente piedade da presa. Os animais agem por instinto, necessidade, e razões de sobrevivência, não hesitam em matar para se alimentar. É esta permanente ausência de consciência da sua animalidade, um dos maiores critérios de distinção entre o animal e o homem. A inconstestável sensibilidade dos animais, para os ecofundamentalistas, justificaria o facto destes serem sujeitos de direito, porém esta sensibilidade não lhes é suficiente, para atribuir personalidade jurídica, pois a simples sensibilidade que leva os defensores dos animais a defender tal posição, apresenta-se como um critério de exteriorização deste sentimento por parte dos mesmos.
Imagine-se, o sofrimento que é capaz de despertar nas pessoas, os maus tratos a um animal. Tal sentimento dimana da nossa parametrização moral, parametrização essa que assentando na dignidade da pessoa humana nos regula através de uma igualdade fundamental de todos na humanidade comum.
Tal facto leva-nos a confundir a dignidade da pessoa humana com uma pretensa dignidade do animal. Há que separar as àguas e não ceder a esta tentação, que nos parece moralmente justa e de acordo com a nossa humanidade própria, apesar de o homem não se confundir com o animal.
É a ideia de bem que moralmente nos parametriza que nos seduz quanto à atribuição de direitos aos animais. A ideia de bem que moralmente nos parametriza, é herdeira da nossa filiação valorativa cristã, logo a igualdade fundamental de todos é-o na humanidade comum ( Benedictus XVI), e não na animalidade comum.
A título ilustrativo apraz-nos referir um texto Bíblico que nos diz: "Deus outorgou ao homem o domínio de todas as criaturas.E disse Deus: façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; domine ele os peixes do mar, as aves do Céus, todos os animais domésticos e toda a Terra" ( Bíblia Sagrada, Gênesis, I, 24-26).
Integrando agora jurídicamente todo este nosso discurso, é deveras relevante relatar o enquadramento jurídico dos animais no nosso ordenamento.
O Código Civil define coisa como tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas(202ºCód.Civil). Havendo vários tipos de relações jurídicas que têm por objecto os animais(493º e 502ºCód.Civil) logo nos apercebemos que estes são classificados como coisas no sistema jurídico português. Os animais são coisas móveis (204 º e 205º Cód.Civil).
Os animais domésticos são objecto de direitos, podendo sobre eles incidir os direitos de posse e de propriedade. Os animais abandonados são considerados res nullius e podem ser adquiridos por ocupação(1318º Cód.Civil), em relação aos animas selvagens alguns são susceptíveis de ocupação por meio de caça(1319º Cód.Civil, 5º/1 da Lei 30 de 86 e 7º do Dec.-Lei 136 de 96).
A captura e comercialização de alguns animais estão legalmente vedadas, se a captura é vedada consequentemente também o é, a posse e a propriedade destes animais.
Os animais cuja apropriação seja proibida, não podem ser transaccionados e a sua posse é precária.
Quem tiver assumido o encargo de vigilância de quaisquer animais responde pelos danos que estes causarem, salvo se se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos teriam sido produzidos, ainda que não houvesse culpa sua, além disso quem em seu próprio interesse utilizar animais, responde pelos danos que estes causarem, desde que os danos resultem do perigo especial que envolve a sua utilização, sendo os poderes de controlo e direcção dos animais caracterizadores desta responsabilidade.
Em suma, tendo em conta o que foi exposto anteriormente, dignidade deverá ser somente a da pessoa, e não a do animal, há uma manifesta infelicidade terminológica na expressão"dignified existence", pelo que achamos tal expressão completamente vazia de conteúdo.
"Dignified existence" é uma questão de justiça, uma questão de propriedade, uma questão de tutela moral que nos parametriza e do amor que como pessoas que somos, devemos ter aos animais.
Os mecanismos de justiça, são os mesmos dados a um proprietário de uma coisa móvel. Embora haja leis que tutelam os animais no seu interesse. Ainda que nos seja difícil, conceber o animal como coisa, se verdadeiramente respeitarmos a tutela objectiva conferida às coisas nenhum animal sofrerá sevícias degradantes, pois todo o direito tem por pedra angular uma ideia de bem que moralmente nos parametriza, assente na dignidade da pessoa humana, o que reflexa e indirectamente nos irá impedir de praticarmos comportamentos moralmente inadequados em relação a animais.

Francisco Lourenço nº 14023
Artur Silva nº 14402
Subturma 11

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