Mais boas vindas (e mais trabalhinho...)

Saudações a tod@s!


Renovo os votos de boas-vindas ao blog de Direito do Ambiente e espero também que quantidade e qualidade das intervenções sejam elevadas. Para além das boas vindas aproveito para vos chamar a atenção para o facto de estarem dois acórdãos na Secção de Jurisprudência, que vos pedia para comentarem através da caixa de comentários (ou, caso prefiram uma intervenção mais longa, através de um post na secção de jurisprudência), se possível em articulação com o Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de Dezembro, cujo link se encontra na secção de Legislação. A temática é a dos direitos dos animais.



Um dos acórdãos, colocado a 5 de Março, é um acórdão do STJ relativo a tiro aos pombos. Existe jurisprudência e doutrina conexa, cujas referências podem encontrar na Revista de Direito Privado n.º 12 (Outubro/Dezembro de 2005), onde também encontram uma anotação a este e outro acórdão, da Relação de Guimarães. O outro é um exemplo da jurisprudência do Tribunal Constitucional quanto ao regime de detenção da canídeos, em que o relevo dos animais para o problema é curiosamente distinto (é este o acórdão que devem ler em articulação com o DL 314/2003).



Bom trabalho!


14 comentários:

  1. Anónimo disse...

    Tiro aos Pombos...

    Não obstante a existência de normas protectoras dos animais, as decisões dos tribunais reproduzem uma hierarquia de valores e de bens jurídicos de tipo conservador. É notável que as sentenças proferidas nos tribunais de primeira instância, na generalidade dos casos tendem a fazer uma composição ambientalmente mais favorável ao nível da ponderação dos valores em questão. São decisões que valorizam o vínculo ecológico no sentido da imposição de restrições a outros direitos de tipo mais clássico, como o direito de propriedade e o direito de iniciativa privada. Os tribunais superiores, ao contrário, são mais resistentes em dar um acolhimento amplo aos valores ambientais, prevalecendo os direitos de tipo clássico.
    Tal ocorreu no acórdão do STJ em 2004, sobre a actividade de tiro aos pombos. Nas primeiras instâncias a actividade foi considerada ilícita, face à Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro. O STJ, todavia, considerou que os conceitos de violência injustificada, de morte, lesão grave, sofrimento cruel e prolongado a que se reporta o art.1.º, n.º1 da respectiva Lei significavam um acto gratuito de força ou brutalidade que causassem dor física intensa ou a eliminação vital dos animais, sem justificativa ou utilidade para o homem. Considerou, portanto, a actividade lícita, pois a morte infligida aos pombos não era meramente gratuita e traduzia-se numa modalidade desportiva com tradição e relevância em Portugal.
    Ora, como refere Helena Neves, a interpretação do STJ parece-nos incongruente com a intenção axiológico-normativa da Lei n.º92/95, quando considera a actividade de tiro aos pombos como tradição cultural portuguesa. Trata-se de uma interpretação muito ampla do conceito de necessidade contido no art.1.º, n.º1. Tal actividade não é necessária do ponto de vista do equilíbrio ambiental e da alimentação humana e não é necessária à luz da tradição portuguesa. Não se pode invocar esta actividade como tradição cultural pois, se a mesma assim o fosse, deveria ter sido salvaguardada pela lei, tal como ocorreu com as touradas, a caça e a arte equestre (art.1.º, n.º3, a) e f) da Lei n.º92/95.
    Admitir esta actividade significaria abrir a possibilidade para a prática de luta de galos, luta de cães e outras práticas bárbaras contra os animais. A actividade de tiro aos pombos visa apenas o desporto e a satisfação de actividades lúdicas e pode ser realizado optando-se por alvos não-vivos, como pratos e hélices.
    Os pombos não têm quaisquer hipóteses de sobrevivência, pois as suas penas são arrancadas para que não consigam voar para muito longe. São colocados num local escuro para não verem quando estiverem em contacto com a luz, tornando-se, assim, num alvo mais fácil para os atiradores. Se sobreviverem à primeira revoada, outro praticante os apanhará nas proximidades e voarão mais uma vez para a morte.
    Todos os anos são mortos pelo menos entre 45 000 e 60 000 pombos em treinos e provas de tiro com alvos vivos, em Portugal.
    O ser humano não pode consolar-se moralmente com a constatação de que o sofrimento dos animais contribui para o progresso, evitando que triviais interesses lúdicos prevaleçam face ao sofrimento desnecessário dos animais. O sofrimento inútil dos animais, mesmo que para fins humanos, merece reprovação.

    "Matar animais por desporto, prazer, aventura e pelas suas peles, é um fenómeno que é ao mesmo tempo cruel e repugnante. Não há justificativa na satisfação de uma brutalidade dessas", Sua Santidade Dalai Lama.

    "Virá o dia em que a matança de um animal será considerado crime tanto quanto o assassinato de um homem", Leonardo da Vinci.

    Raquel Torres, subturma 4.  

  2. Ana Fuzeiro - subturma 12 disse...

    Tiro aos pombos

    Relativamente à questão da licitude ou ilicitude da actividade de tiro com armas de caça aos pombos em voo,o Acordão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 Outubro de 2004, seguiu uma orientação contrária à seguida pelo Tribunal da Relação de Guimarães a 29 de Outubro de 2003.
    Eu concordo com a argumentação e com a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, que se prounciou pela ilicitude da actividade de tiro aos pombos e pela substituição de alvos vivos por alvos não vivos. Por sua vez, o STJ pronunciou-se pela licitude da actividade de tiro com armas de caça aos pombos em voo. O STJ entendeu que os animais não são titulares de direitos, afirmando que, o que existe são deveres das pessoas para com os animais. Defende este Tribunal que os animais são coisas móveis e não são titulares de direitos subjectivos, afirmando que a protecção que a lei confere aos animais não assenta na ideia de titularidade de direitos por parte dos animais, mas na intenção de os proteger contra violências cruéis, desumanas ou gratuitas para as quais não exista justificação ou tradição cultural bastante. No entanto, esta posição não me parece defensável por várias razões.Em primeiro lugar, não me parece defensável porque a Lei nº 92/95 afirma claramente várias medidas de protecção dos animais, entre as quais a proibição de se lhes infligir a morte, sofrimento cruel e prolongado ou graves lesões sem necessidade. Estes são os parâmetros mínimos, as medidas gerais de protecção dos animais previstas no direito português. Resulta também da Declaração Universal dos Direitos do Animal que a integridade física e a vida do animal merecem a protecção do Direito.
    Para além disto, os animais não podem nem devem ser vistos como coisas móveis, com a conotação de objecto inanimado. Os animais constituem uma categoria especial de objectos de direito, devendo existir regimes autónomos e específicos para animais, não sendo de reconduzir os animais a uma simples classificação de coisa móvel.
    Desta forma, o facto de os animais não humanos não gozarem da protecção jurídica que é conferida aos seres humanos não constitui fundamento para ser negado aos animais a tutela que o legislador nacional e a comunidade internacional lhes conferiu.
    Também não posso concordar com a equiparação da actividade de tiro aos pombos com a tourada,a caça, a arte equestre ou com a investigação científica, utilizada pelos defensores da licitude do tiro aos pombos. De facto, as referidas actividades permitem a morte, o sofrimento cruel e prolongado e/ou graves lesões dos animais. Contudo, tratam-se de excepções à regra, que foram expressamente previstas na lei, por respeito a antigas tradições da cultura portuguesa ou para permitir o avanço da medicina e da ciência, o que não se verifica com o tiro aos pombos. A prática de tiro aos pombos não foi ressalvada na excepcional autorização legal daquelas actividades, pelo que se insere no âmbito da proibição do artº 1/1 da Lei nº 92/95.
    A prática de tiro aos pombos não se equipara à prática de caça, actividade esta especialmente regulada em lei. Logo, não se pode aplicar analogicamente o regime especial relativo às largadas nos campos de treino de caça à prática de tiro a pombos, porque apesar de haver, no plano descritivo, uma semelhança entre as duas práticas, no plano normativo a diferença é evidente. No caso das largadas estamos no âmbito da lei da caça (actividade permitida por lei mediante certas condições), tratando-se de uma actividade instrumental a uma prática excepcionalmente lícita. No caso do tiro aos pombos estamos perante uma prática que visa somente a satisfação de actividades lúdicas em que a utilização de alvos vivos pode ser substituída pela utilização de pratos ou hélices, sem que daí se possa retirar eficácia na realização dos objectivos. De facto,a aferição da destreza, o divertimento, a competição não são reduzidos pelo facto de serem utilizados alvos inanimados. O tiro a hélices ou a pratos apenas não satisfaz o desejo de infligir violência, sofrimento e morte a animais.
    Na prática de tiro aos pombos existe um sofrimento prévio ao próprio abate. Trata-se de uma actividade que causa, sem necessidade, o sofrimento cruel e prolongado a animais, uma vez que são-lhes arrancadas penas da cauda antes de lhes ser permitido o voo final e o animal ao ser atingido por uma bala de chumbo, e não morre imediatamente(o que é o mais comum)fica em agonia, durante várias horas, em situação de sofrimento cruel e prolongado e com lesões graves, até que sejam encontrados e os matem por quebra de pescoço.
    A violência que caracteriza esta prática não pode ser justificada pelos fins que se visam atingir. Sendo os objectivos da referida prática exercitar a destreza dos atiradores na prática de tiro ao alvo em movimento e a diversão dos seus praticantes, esses objectivos são igualmente garantidos com o recurso a meio técnicos muito eficazes que reproduzem o voo dos pombos. Desta forma, o tiro aos pombos é uma actividade manifestamente desnecessária porque existe uma alternativa em tudo equivalente: o tiro aos pratos ou às hélices.
    Também não procede o argumento favorável à licitude da actividade de tiro aos pombos que se fundamenta na afirmação de que esta é uma prática com tradição e relevância em Portugal. Não procede porque apesar de ser real a existência de muitos clubes de tiro no nosso país, o facto é que estes se dedicam à prática do tiro, que é inclusivamente uma prática olímpica e não à prática de tiro aos pombos que é invulgar na maioria dos referidos clubes.
    Por tudo o quanto foi referido, entendo que a decisão do Tribunal da Relação de Guimarães é a que está conforme ao ordenamento jurídico, visto na sua globalidade. A actividade de tiro aos pombos consiste numa actividade que causa, sem necessidade, normalmente a morte, e frequentemente o sofrimento cruel e prolongado e lesões graves dos animais, configurando um grave e desnecessário atentado à integridade física e à vida desses animais.

    Ana Fuzeiro
    Subturma 12  

  3. Anónimo disse...

    Comentário ao Acórdão do STJ de 19 de Outubro de 2004

    Este Acórdão aborda a questão da licitude da actividade de tiro aos pombos.
    Uma associação zoófila pede a declaração da ilicitude da actividade de tiro aos pombos praticada por uma pessoa colectiva de utilidade pública desportiva que organizou um concurso de tiro com chumbo, com utilização de pombos, prática que a associação considera cruel e uma violência injustificada contra os animais. Esta actividade não tem tradição cultural em Portugal e os pombos poderiam ser substituídos por alvos artificiais, mão havendo, nesse caso, qualquer deturpação da actividade.
    O Tribunal analisa os vários argumentos apresentados por ambas as partes e chega a conclusões que, na minha opinião, são criticáveis.
    Levanta-se a questão de saber se a proibição do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 92/95 de 12 de Setembro (lei esta que proíbe a violência injustificada sobre os animais) abrange a actividade do tiro ao pombo: “São proibidas todas as violências injustificadas contra animais, considerando-se como tais os actos consistentes em, sem necessidade, se inflingir a morte, o sofrimento cruel e prolongado ou graves lesões a um animal”. São analisados alguns conceitos indeterminados desta norma, como a violência injustificada que, na opinião do Tribunal, é “o desnecessário acto de força ou de brutalidade contra os animais e o conceito de sofrimento cruel e prolongado, que representará “dor física assaz e intensa e por tempo considerável face ao circunstancialismo envolvido”. Perante tais conceitos e os elementos disponíveis sobre os casos, o Tribunal considera que não existe violência injustificada ou sofrimento cruel e prolongado,afastando a aplicação do art. 1.º n.º 1 da referida lei, o que, no mínimo, não pode deixar de ser surpreendente e, até chocante, uma vez que são claramente descritas práticas que não podem deixar de provocar sofrimento e dor a qualquer ser vivo.
    O Acórdão demonstra, através do elemento histórico, que a lei acima referida não tinha intenção de abranger a actividade de tiro ao pombo, uma vez que essa prática tinha já sido discutida no passado, e foi feita a opção de não a incluir na lei. Assim sendo, chega- se a conclusão que o legislador pretende manter a licitude desta actividade. Considera, ainda, que o fim da lei é “proteger os animais de violências cruéis ou desumanas e gratuitas, para as quais não exista justificação ou tradição cultural bastante”, ou seja, desde que haja uma tradição cultural, os animais podem sofrer maus tratos e ser alvo de práticas cruéis…Parece que, seguindo esta interpretação, a protecção que a lei oferece não é suficiente, se permite actividades deste género tornando-se necessário a sua complementação.
    Concordo quando o Tribunal afirma que os animais não são titulares de direitos subjectivos, sendo tratados no nosso ordenamento jurídico como coisas, e como tal o que existe é o dever das pessoas em relação a eles, mas a verdade é que algumas das posições defendidas neste acórdão vão muito para além desta qualifição e ignoram a protecção que lhes deve ser concedida. Parece que essa protecção acaba quando o ser humano pode de alguma forma tirar prazer numa actividade que lhes provoque sofrimento, e quando exista beneficio para a actividade económica. Mas a que preço? Será que é suficiente pensarmos que estamos perante uma espécie que facilmente se reproduz, não havendo perigo de extinção? A meu ver, não é isso que está em causa, mas sim onde é traçado o limite hoje e onde será traçado amanhã. Que género de argumentos iremos mais utilizar para levarmos a cabo este tipo de actividades? A defesa das tradições por mais cruéis e injustificadas que sejam? Um pais que acabe com estas práticas não está apenas a tratar com respeito os animais, mas a demonstrar respeito por qualquer forma de vida.

    Filipa Rodrigues Subturma 2  

  4. Anónimo disse...

    A questão essencial do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 2004 é saber da legalidade ou ilegalidade em Portugal da modalidade de tiro aos pombos com alvos vivos. Ou seja, a questão é saber se esta actividade desportiva é ou não abrangida pela proibição do artigo 1º/1 da Lei nº 92/95 de 12 de Setembro.
    No entanto, e como questão prévia, continua-se a debater a atribuição de verdadeiros direitos aos animais. Ou seja, o Homem tem direitos sobre a Natureza e tem deveres para com ela. O que está em aberto e deve ser discutido é o problema de saber se a Natureza tem direitos para com o Homem e aí se insere a problemática dos direitos dos animais.
    E, pelo menos por enquanto, os animais não são sujeitos de direito nem podem ser titulares de relações jurídicas. Neste ponto concordo com o acórdão. Pode-se falar em “direitos dos animais” não no sentido jurídico do termo, mas sim no sentido de “deveres do Homem para com os animais”. Os ditos “direitos” funcionam como obrigações dos seus proprietários, as quais constituem verdadeiras limitações à sua utilização.
    É neste sentido que devem ser entendidos os textos internacionais (como a Declaração Universal dos Direitos do Animal) sobre a protecção dos animais quando se referem ao seu direito à vida, à integridade física, à liberdade e ao respeito.
    No acórdão em análise é discutido se a prática desportiva do tiro com chumbo aos pombos em voo ofende ou não o direito à vida e à integridade física desses animais por lhes serem arrancadas penas da cauda antes de serem libertos e no âmbito dessas provas, mortos.
    Apesar do artigo 1º/1 da Lei nº 92/95 proibir em regra a morte desnecessária dos animais, isso não significa que eles sejam titulares de direitos subjectivos à vida e à integridade física, pois são coisas móveis nos termos dos artigos 202º e seguintes do C.C.
    A Lei nº 92/95 contem normas jurídicas dirigidas no interesse dos animais nomeadamente prevenindo maus tratos e proibindo práticas de crueldade e violência física ou psíquica. Todavia isso não significa que os animais tenham verdadeiros direitos subjectivos.
    A falta de razão inibe os animais de serem sujeitos de direito mas a sua sensibilidade torna-os merecedores de uma tutela jurídica específica. É neste sentido (o de atribuir uma tutela específica a todo o animal) que deve ser entendida a finalidade da Lei nº 92/95 de 12 de Setembro.
    Por isso, qualquer utilização dos animais que seja contrária à protecção dada pelos diplomas legais, pode e deve ser proibida, não por existirem verdadeiros direitos subjectivos dos animais, mas sim por serem merecedores de uma tutela jurídica específica.
    É isto precisamente o que se passa na situação descrita no acórdão em análise. A Lei nº 92/95 proíbe no seu artigo 1º/1 todas as violências injustificadas contra animais, complementando no seu nº 3 com a proibição de utilização dos animais para fins didácticos, exibições ou actividades semelhantes (que é o que acontece na modalidade desportiva de tiro com chumbo aos pombos em voo), salvo experiência científica de comprovada necessidade (que não se verifica nessa prática desportiva).
    Embora a proibição expressa das provas de tiro com animais vivos não tenha passado para a lei em análise e tenha ficado pelos trabalhos preparatórios, não se pode concluir pela licitude da prática desportiva de tiro ao voo de pombos, precisamente porque essa proibição já consta do artigo 1º/1 da Lei nº 92/95.
    Como essa modalidade desportiva utiliza os animais para um fim contrário à protecção que lhes é dada pelo diploma, deve ser considerada ilegal e por isso proibida.

    Lara Rodrigues, subturma 2  

  5. subturma3 disse...

    A problemática dos direitos dos animais é hoje muito actual. Dentre as várias perspectivas apresentadas parece-nos desde logo, face a nossa lei, de repudiar a tese de que os animais são titulares de direitos, uma vez que são considerados coisas. Inclinamo-nos mais para a tese de que os animais não devem ser sujeitos a situações penosas e cruéis porque ao homem, ser racional, cabe acautela-los uma vez que integram o habitat comum. Não que se tenha um dever jurídico de proteger os animais mas isto não significa que se sujeitem a situações penosas e degradantes só por impulsos perversos e fúteis quando não há razões culturais que o justifiquem. Mais assim é porque actualmente a tendência, quer de instrumentos jurídicos internacionais quer comunitários caminha no sentido de admitir a protecção dos animais de condutas abusivas.
    Exceptuam-se claro está as excepções que a lei expressamente prevê mas que se justificam por motivos ora históricos ora culturais. O condenável é a submissão dos animais a actos cruéis perfeitamente evitáveis porque passíveis de serem substituídos por objectos que desempenhariam as mesmas funções.
    É esta a linha de raciocínio que o acórdão da Relação de Guimarães de 29.10.2003 faz quando ajuíza da conformidade da prática de tiro aos pombos e conclui pela sua ilicitude uma vez que os alvos (pombos) eram perfeitamente substituíveis por objectos. Para além deste argumento o tiro aos pombos não é excepcionado na lei como o são a caça ou as touradas.
    Mas tal não implica que por vezes não seja necessário regulamentar as condições de conservação dos animais seja por motivos de saúde pública seja por respeito aos direitos subjectivos que podem ser afectados. É o que faz o decreto-lei nº 314/2003 quando estabelece medidas sanitárias a que os animais domésticos devem ser submetidos e quando estabelece igualmente as condições em que os particulares devem possuir os animais nas suas casas.
    Contudo o artigo 3º, nº6 do decreto-lei foi declarado inconstitucional e consequentemente desaplicado pois que ao atribuir competência aos tribunais judiciais (para emitir o mandato judicial que permitia aceder ao local onde o animal se encontrava) o governo está a definir a competência dos tribunais o que só pode fazer mediante autorização legislativa da Assembleia da República dada a sua reserva de competência prevista no artigo 165º,nº1,alínea p) da Constituição.
    Para além do já referido é também de invocar que estamos perante um acto administrativo o que nos remete para a competência dos tribunais administrativos.Pode parecer algo estranho porque a ordem judicial parece ser destinada a permitir a entrada das autoridades em casa de um particular para se apoderar dos animais aí existentes, o que nos levaria para os tribunais judiciais, mas ainda assim o acto traduz um poder público e coercivo de “ius imperii” típico de direito administrativo.
    Maria Francisca Fé sub 3  

  6. Unknown disse...

    A questão dos direitos dos animais é uma questão muito discutida e muito pouco defendida e protegida, seja pelo estado seja pelos cidadãos.
    Parece que a nossa ordem jurídica não esta ainda preparada para lidar e aceitar os direitos dos animais, com todas as consequências que isso trás para nós e a nossa sociedade.
    Quanto esta questão, vejamos o acórdão em questão de 2004 do STJ, quanto aos tiros aos pombos, nas primeiras instâncias os tribunais aplicaram a lei 92/95 de 12 de Setembro, considerando a conduta ilícita; já este tribunal em questão determinou a licitude da conduta por considerar que a morte infringida aos pombos não era meramente gratuita mas que traduzia uma actividade desportiva com tradição e relevância em Portugal.
    Exacta posição não parece correcta pois entende-se que esta actividade não é necessária do ponto de vista do equilíbrio ambiental e da alimentação humana e não é necessária à luz da tradição portuguesa. Não se pode invocar esta actividade como tradição cultural pois, se a mesma assim o fosse, deveria ter sido salvaguardada pela lei, tal como ocorreu com as touradas, a caça e a arte equestre. Se admitíssemos esta situação estaríamos a abrir a porta à aceitação de outras praticas bárbaras, que não têm outros fins senão o desporto e o prazer.
    O STJ entendeu que os animais não são titulares de direitos, afirmando que, o que existe são deveres das pessoas para com os animais. Defende este Tribunal que os animais são coisas móveis e não são titulares de direitos subjectivos, afirmando que a protecção que a lei confere aos animais não assenta na ideia de titularidade de direitos por parte dos animais, mas na intenção de os proteger contra violências cruéis, desumanas ou gratuitas para as quais não exista justificação ou tradição cultural bastante.
    Como já tive oportunidade de referir em comentário anterior concordo com esta ideia de que não há direitos dos animais e que entendo que esta categoria de coisas deveria ser autonomizada das outras, no entanto discordo totalmente da solução adoptada pelo tribunal, não posso concordar com a licitude desta prática.
    Não procede o argumento favorável à licitude da actividade de tiro aos pombos que se fundamenta na afirmação de que esta é uma prática com tradição e relevância em Portugal. Não procede porque apesar de ser real a existência de muitos clubes de tiro no nosso país, o facto é que estes se dedicam à prática do tiro, que é inclusivamente uma prática olímpica e não à prática de tiro aos pombos que é invulgar na maioria dos referidos clubes.
    Na prática de tiro aos pombos existe um sofrimento prévio ao próprio abate. Trata-se de uma actividade que causa, sem necessidade, o sofrimento cruel e prolongado a animais, uma vez que são-lhes arrancadas penas da cauda antes de lhes ser permitido o voo final e o animal ao ser atingido por uma bala de chumbo, e não morre imediatamente(o que é o mais comum)fica em agonia, durante várias horas, em situação de sofrimento cruel e prolongado e com lesões graves, até que sejam encontrados e os matem por quebra de pescoço.
    A violência que caracteriza esta prática não pode ser justificada pelos fins de exercitar a destreza dos atiradores na prática de tiro ao alvo em movimento e a diversão dos seus praticantes, esses objectivos são igualmente garantidos com o recurso a meio técnicos muito eficazes que reproduzem o voo dos pombos.
    Por tudo parece-me que a argumentação preferível é do Tribunal de primeira instancia, o de Guimarães,
    No entanto parece-se que este é o espelho das ideias da sociedade, e que só será possível alterar definitivamente a posição dos tribunais quando os próprios cidadãos defenderem outras ideias neste âmbito.

    Inês Neto subturma1 nº14361  

  7. Anónimo disse...

    O confronto entre a protecção dos animais e o património cultural está longe de ter uma solução unânime. Prova disso é este Acórdão do STJ que declara a licitude da prática do tiro aos pombos, depois de, em instâncias anteriores, a mesma prática ter sido considerada ilícita.
    Esta ambiguidade de decisões dos nossos tribunais tem por base a interpretação da Lei 92/95, de 12 de Setembro, que confere protecção especial aos animais.
    Esta lei refere no seu art.1º, nº1: “São proibidas todas as violências injustificadas contra animais, considerando-se como tais os actos consistentes em, sem necessidade, se infligir a morte, o sofrimento cruel e prolongado ou graves lesões a um animal”.
    Esta lei confere verdadeiros direitos aos animais?
    Ao longo dos tempos tem havido uma maior preocupação com os animais e o seu bem-estar.
    Actualmente, surgem, à escala global, cada vez mais medidas de salvaguarda dos ecossistemas e dos animais nele inseridos, nomeadamente das espécies em vias de extinção.
    Esta maior protecção dos animais prende-se com o maior conhecimento e consciência da sociedade actual das consequências nefastas ao ambiente, provocadas pelo desenvolvimento económico ao longo dos séculos.
    Mas não só: a sociedade evoluiu no sentido de “humanizar” os outros seres vivos. É reconhecido o sofrimento dos animais.
    Deste modo, começaram a surgir leis e medidas de protecção dos animais, para prevenir abusos, maus-tratos e violência injustificada sobre os animais.
    Os animais não têm verdadeiros direitos – no nosso Código Civil, os animais são considerados coisas móveis (art.202º, e SS.) e não têm personalidade jurídica, pelo que não têm verdadeiramente e em termos absolutos, direito à vida e à integridade física, não tendo verdadeiros direitos subjectivos.
    No entanto, as medidas de protecção e diplomas actuais como a Declaração Universal dos Direitos do Animal, sugerem-nos uma tutela especial dos animais, não sendo os animais, em termos absolutos e actualmente, apenas coisas.
    É neste sentido que surge a Lei 92/95, como protecção dos animais contra a violência gratuita por parte do Homem.
    Assim sendo, como classificar a prática do tiro aos pombos?
    O STJ reconhece que tal prática inflige sofrimento e dor aos pombos, mas considera estar esta violência plenamente justificada, visto o tiro aos pombos ser uma prática desportiva de longa tradição em Portugal, sendo parte integrante do património cultural português (estando, portanto, ao nível das actividades excepcionadas por lei: a tourada – como património cultural, as experiências médicas absolutamente necessárias e a caça).
    Não parece ser evidente que o tiro aos pombos seja uma tradição relevante do património cultural português: é uma prática sectorial dentro da modalidade desportiva de tiro, existente em pouquíssimos clubes de tiro, sendo praticamente irrelevante em termos de efectivos praticantes e em nada é, em termos culturais, comparável à tourada.
    Evidente parece a violência contra os pombos, antes e durante o exercício da dita actividade, totalmente gratuita, sem necessidade e sem justificação cultural plausível – o património cultural deve ser preservado, contudo deve, também ser relevante em termos sociais, o que não nos parece que o seja no caso concreto.

    Inês Marçal subturma 3 nº14497  

  8. Anónimo disse...

    Comentário ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Outubro de 2004


    A questão abordada neste acórdão refere-se à licitude da prática desportiva de tiro com chumbo aos pombos em voo, onde se por um lado a autora, diga-se, uma associação zoófila, defende a ilicitude desta actividade, os réus, por seu turno, não só defendem a sua licitude como ainda promovem a prática da actividade em causa.
    De facto, atendendo às alegações feitas pela autora em sede de recurso de revista, esta vem alegar questões que suscitam algumas divergências a nível jurídico e a nível sócio-cultural. Primeiramente, refere a Lei nº 92/95, de 12 de Setembro relativa à protecção dos animais, salientando que o âmbito desta visa o respeito pelo direito dos animais, que são proibidas todas as violências injustificadas contra animais, que o uso dos animais para divertimento pessoal é equivalente a retirar-lhes qualquer espécie de protecção ou valor próprio. Efectivamente, perante estes argumentos cumpre referir que ainda que os animais não tenham direitos e que face à lei estes são considerados coisas, facto é, que a Lei nº 92/95 vem atribuir alguns deveres ao Homem, no sentido de proteger os animais e de respeitá-los. Contudo, não será a prática de tiro com chumbo aos pombos em voo um desrespeito para com os animais? Afinal, trata-se de uma prática desportiva e não de um acto necessário aos interesses do Homem. A lei nº 92/95, admite algumas excepções aos fins proclamados por esta, nomeadamente no tocante a tradições, como as que existem quanto às touradas e à caça. Todavia, a prática de tiro com chumbo aos pombos em voo, ainda que não seja muito comentada, apresenta-se como uma actividade praticada há muito tempo, pelo que não será também esta uma tradição? A associação zoófila, defensora dos animais, defende que esta não é uma prática com tradição, pelo que não deve ser admitida uma vez que também não implica qualquer valor cultural. Cumpre discordar deste argumento, primeiramente porque se trata de uma actividade que é praticada há muito tempo e depois porque afirmar que não há aqui qualquer valor cultural é relativo. Ainda que a sociedade mais jovem apresente actualmente uma consciência mais sensível para os “direitos, liberdades e garantias dos animais”, facto é que a consciência das pessoas mais velhas foi educada com base em ideais diferentes pelo que a ideia de “valor cultural” não pode ser colocada em causa sem antes se atender a todo um desenvolvimento social que está inerente. Assim, e uma vez que a lei nº 92/95 não apresenta uma enumeração taxativa das suas excepções, faz sentido para muitos considerar que a actividade em causa pode ser considerada como uma tradição com valor cultural, tal como as touradas e a caça.
    Outras das situações alegadas pela autora, prende-se com o sofrimento que é causado aos animais, uma vez que esta prática envolve a utilização de alvos vivos, pombos, aos quais são arrancados as penas da cauda antes de serem libertos, e posteriormente, no âmbito destas provas, são mortos. Efectivamente, cumpre questionar até que ponto não haverá aqui um sofrimento para os pombos? Arrancar as penas da cauda aos pombos, atendendo que essas penas são as mais fortes, deixando os pombos feridos provoca nestes uma lesão física, bem como os pombos deixam de ter as suas plenas capacidades de voo. Este é um dos argumentos que se apresenta mais favorável à ilicitude desta prática desportiva, uma vez que ainda que se possa aceitar que ela seja uma excepção à lei nº 92/95 em virtude de ser considerada uma tradição, por outro lado, retirar aos pombos as suas capacidades plenas, deixando-os feridos, contraria o disposto no artigo 1º número 1 da lei citada. Assim, ainda que a morte dos pombos seja rápida e não envolva um sofrimento prolongado, já o acto de arrancar as penas da cauda constitui uma violência injustificada, cruel e de grande sofrimento.
    Posto isto, cumpre agora comentar a questão essencial: será que a modalidade de tiro aos pombos é legal ou ilegal, em Portugal? Para chegar a uma decisão, o Supremo Tribunal de Justiça analisou cinco problemas inerentes a esta situação.
    Relativamente ao núcleo fáctico provado relevante para a decisão, este apresenta situações relevantes, nomeadamente, no processo de libertação dos pombos nada é especificado quanto ao que acontece aos pombos que não são atingidos, nem ao seu tempo de vida quando os pombos são atingidos pelo tiro e não morrem imediatamente. Uma vez retiradas as penas da cauda, situação que por si é cruel, os pombos ao não serem atingidos, significa que ficarão em sofrimento por tempo indeterminado, o que leva a constatar uma violência desnecessária e simultâneamente um desrespeito para com os animais. O mesmo se aplica aos pombos que são atingidos e que não morrem imediatamente, pois desde o momento em que são atingidos até ao momento da morte verifica-se, mais uma vez, um grande sofrimento. Estas situações descritas levam a questionar até que ponto não haverá aqui uma violação do artigo 1º número 1 da lei nº 92/95.
    Outra situação importante prende-se com o facto de esta actividade desportiva ser praticada em várias zonas do país há mais de um século e meio. Caberá, então, esta prática desportiva numa excepção ao artigo 1º número 1 da lei nº 92/95? Atendendo ao que já foi dito relativamente às touradas e à caça, parece que a resposta é afirmativa.
    Quanto à problemática do núcleo normativo essencialmente aplicável no caso em espécie, parece relevante salientar que dos fundamentos apresentados pelo Supremo Tribunal de Justiça, há uma ideia de consciência no tocante aos direitos dos animais. Ainda que os animais não tenham direitos, facto é que atendendo à legislação nacional há uma tendência cada vez maior para a protecção dos animais, e que se verifica antes de mais, no Estado.
    Interpretando agora o sentido das normas do artigo 1º número 1 da lei nº 92/95, o acórdão em análise dá uma definição de violência injustificada, como sendo o acto de força desnecessário ou de brutalidade contra os animais. E não será o que acontece nesta situação, no momento em que se retiram as penas da cauda dos pombos, deixando-os em sofrimento e incapacitados? Porque não proceder, então, à pratica do tiro com chumbo ao pombo em voo, mas sem este procedimento inicial? De facto seria prudente, uma vez que permitia aos pombos que não são atingidos pelo tiro, continuarem a sua vida em condições dignas para estes. Bem como, no momento em que são largados, teriam as suas capacidades plenas, o que levaria a uma maior probabilidade de poderem fugir.
    Situação curiosa é aquela que resulta do acórdão quando refere a discussão parlamentar onde se concluiu que os homens “não podem prescindir da existência dos animais, os não devem torturar gratuitamente e devem reduzir, até onde for possível, o seu sofrimento, mas tendo em atenção a realidade portuguesa.” Esta frase transmite a ideia daquilo que se deveria verificar na prática. Ainda que haja tradições que são permitidas pela lei, tais devem sujeitar os animais ao mínimo de violência possível.
    Posteriormente, o acórdão refere ainda o facto de os pombos se reproduzirem facilmente, pelo que não há risco da sua esxtinção, sendo a prática desportiva em causa um factor de promoção do crescimento da espécie. Todavia, cumpre discordar desta ideia uma vez que o que está em causa não é o risco de extinção dos pombos. E mesmo que os pombos se reproduzam facilmente, havendo uma infestação de pombos, compete as autoridades resolver esse problema de forma rápida e eficaz de modo a que não haja um sofrimento prolongado. Mas o que está aqui em causa é a questão de se promover o crescimento dos pombos simplesmente para depois os matar. Até que ponto é que se pode alterar as regras da Natureza? Não esquecendo, obviamente, que estes pombos reproduzem-se em cativeiro, o que significa por outro lado, que nunca foram habituados a ser independentes, pelo que a sua sobrevivência (caso sobrevivam aos tiros) será reduzida quando em contacto com um mundo que não conhecem.
    Assim, atendendo a tudo quanto se disse, cumpre atentar finalmente à questão de saber se a proibição do artigo 1º número 1 da Lei nº 92/95, abrange ou não a actividade desportiva de tiro ao voo de pombos. O acórdão conclui no tocante a este ponto que “a morte infligida aos pombos não é meramente gratuita ou improvisada, porque se inscreve numa prática desportiva já antiga, integrada na tradição (...) e consequentemente faz parte do nosso património cultural. Efectivamente, não se pode negar que esta prática não seja uma tradição pois reúne todas as condições para tal. Assim, se são permitidas as touradas e a caça, então esta prática desportiva também deverá ser permitida com base no mesmo fundamento das primeiras, até porque as excepções ao artigo em causa não são taxativas. A única diferença que existe entre estas é que enquanto nas primeiras os animais são utilizados nas suas perfeitas condições, nesta última, os pombos são lançados para o ar em condições limitadas pois não possuem as suas capacidades plenas. E é neste facto que reside a opinião de que esta prática desportiva devia ser proibida quando são arrancadas as penas da cauda aos pombos. Assim, não se contesta que esta prática desportiva seja uma tradição e como tal permitida, contudo deveria ser proibido o procedimento de arrancar as penas da cauda dos pombos uma vez que não se justifica dada a finalidade da prática desportiva. Contudo, não obstante a decisão do Supremo Tribunal de Justiça, o problema desta situação reside no próprio artigo da Lei nº 92/95 já citado, uma vez que este apresenta uma grande discricionariedade. Dado que o tema da protecção dos animais é bastante polémico nos dias de hoje, apresentando uma grande divergência de pensamentos na sociedade, é complicado para o legislador tomar uma posição concreta. Assim, existem várias situações de fronteira às quais é complicado dizer se são proibidas pela lei ou não. Exemplificando, se nesta situação o tribunal decidiu que o recurso era improcedente, o mesmo já não se verifica na decisão tomada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, quando em 2004, inverteu esta tendência defendendo a tese da ilicitude do tiro aos pombos.
    Efectivamente, é dificil tomar uma posição no tocante a esta situação pois ainda que se defenda os direitos dos animais, facto é que as tradições são permitidas por lei e por sua vez, o artigo 1º número 1 da Lei nº 92/95 é pouco claro no tocante a esta situação, pelo que resta simplesmente apelar à consciência da sociedade para um tratamento mais justo a estes seres indefesos.


    (Paula Cristina Morais, subturma 1)  

  9. Anónimo disse...

    A proibição de actividades que tenham como objecto animais está dependente da verificação das previsões constantes do art.º 1 da Lei n.º 92/95. Assim, cumpre analisar este artigo. No seu n.º 1 encontramos a proibição geral de violência contra animais e no seu n.º 3 as proibições específicas. Tendo em consideração o caso do tiro aos pombos, e na falta de proibição específica constante do n.º 3 (conforme argumentação do STJ, no acórdão relativo a esta actividade), há que tentar reconduzi-lo à regra do n.º 1. Sendo a actividade do tiro aos pombos uma actividade que, manifestamente, leva à morte dos mesmos (tal nunca é negado pelo STJ), o resultado previsto no preceito encontra-se preenchido, restando assim o ponto principal da questão: a necessidade (ou falta dela). No entendimento do STJ, este conceito indeterminado é concretizado “… no confronto com o Homem e o seu desenvolvimento integral…” quando não haja “justificação razoável” ou “utilidade” nos danos infligidos aos animais. No entanto, acaba por considerar que existe esta justificação e esta utilidade no caso do tiro aos pombos, por consistir este numa tradição cultural e em actividade relevante do ponto de vista socioeconómico, respectivamente, estabelecendo um paralelo com outras actividades/tradições não abrangidas pelas proibições.
    Aqui reside, em minha opinião e salvo o devido respeito, o erro desta interpretação. O conceito de justificação razoável deve ser entendido como “necessidade em sentido estrito”, abrangendo situações como o estado de necessidade e outros casos de actuação indispensável, não comportando por isso a tradição cultural como causa de justificação. O conceito de utilidade deve ser reconduzido a uma “necessidade em sentido amplo”, contemplando situações em que os referidos danos infligidos aos animais tenham uma utilidade para o ser humano enquanto espécie, como por razões científicas ou de alimentação. Tudo o resto será proibido, incluindo actividades como as touradas, a arte equestre e o tiro aos pombos. A permissão destas actividades opera através de excepção legal expressa na própria Lei n.º 92/95 (caso das touradas e da arte equestre) ou em legislação especial. Não sendo este o caso do tiro aos pombos, é de aplicar a regra geral do n.º 1, nos termos acima descritos, resultando, por isso, na sua proibição.

    Francisco Costa nº14415 Subturma 2  

  10. Anónimo disse...

    O que está em causa no acórdão do STJ de 19 de Outubro de 2004 é a questão da legalidade ou ilegalidade do tiro aos pombos como modalidade desportiva. Para se obter uma resposta para esta questão é muito importante analisar se esta actividade se enquadra ou não na proibição do artigo 1º/1 da Lei nº 92/95 de 12 de Setembro. Mas cumpre neste âmbito suscitar também a questão de saber se devemos atribuir verdadeiros direitos aos animais ou não, sendo certo, como já referi noutros comentários que a minha posição é no sentido de negar a atribuição de direitos aos animais. O que aqui vem à tona é a o facto de se discutir se esta modalidade desportiva ofende o direito á vida e à integridade física destes animais, uma vez que o artigo 1º/1 da Lei nº 92/95 proíbe a morte desnecessária dos animais.
    Como interpretar então esta questão, e como resolvê-la?
    Em primeiro lugar cumpre dizer que, de facto, a referida Lei, enuncia esta proibição. Esta Lei contém normas dirigidas aos interesses dos animais, nomeadamente no sentido proibir aos Homens a prática de crueldades e violência para com eles e prevenindo todo o tipo de maus-tratos. Ora, isto não significa que os animais tenham direitos. Já apontámos noutro comentário inúmeras razões para esta nossa posição. No entanto, apesar dos animais não serem sujeitos de direitos, a sua fragilidade, sensibilidade e importância torna-os merecedores de alguma tutela. Ora, a Lei nº 92/95 deve ser entendida como tendo a finalidade de atribuir uma tutela jurídica específica aos animais. Assim sendo, Cumpre concluir que o tiro ao pombo deve ser proibido, não porque os animais têm direitos., mas pelas razões acima apontadas. Cabe deixar uma última opinião: o tiro aos pombos é uma “modalidade desportiva” inaceitável e que deve ser considerado como uma forma de morte desnecessária dos animais para efeitos da Lei que temos vindo a analisar.  

  11. Anónimo disse...

    Tiro aos pombos em Portugal:

    Vária tem sido a jurisprudência acerca da actividade de tiro aos pombos aduzindo, cada um dos Acordãos, várias argumentações quer a favor da licitude, no actual ordenamento jurídico português, da actividade referida, à luz da interpretação actualista da Lei 92/95 de 12 de Setembro, como o faz o Acórdão do STJ de 19/10/04; quer contra essa licitude, de acordo com Acórdão da Relação de Guimarães de 29/10/2003.
    Iremos analisar os vários argumentos a favor e contra cada uma das posições e concluir com o nosso comentário pessoal. Começamos com os argumentos a favor da ilegalidade pois tem sido esse o sentido da esmagadora maioria dos tribunais comuns portugueses que se têm pronunciado, e de seguida analisaremos se terão algum fundamento os argumentos da opinião minoritária contrária constante, nomeadamente, do Acórdão do STJ referido.

    1- "É uma violência injustificada contra animais...": Ora, de facto, na grande maioria dos casos, o mais frequente é ocorrer a morte dos pombos, esse é o principal objectivo desta actividade.
    Contudo, em certas ocasiões pode não ocorrer a morte ou, ocorrendo, seguir-se ao sofrimento cruel e prolongado dos pombos, com graves lesões no corpo do animal, ao contrário do que diz o STJ pois para esta instãncia, não existindo acto de força ou brutalidade desnecessária contra animais, não há sofrimento cruel e prolongado. Só muito raramente ocorre lesão corporal. São os casos em que o pombo não é atingido ou a lesão é insignificante, a penetração do chumbo no corpo é pouco profunda, não possuindo intensidade suficiente.
    Os actos são levados a cabo "sem necessidade". Tratando-se de uma actividade desportiva, de acordo com o entendimento dos seus organizadores, desde logo está afastada a necessidade. Se não vejamos:
    A) Não é benéfica para a alimentação humana.
    Ainda que se admita que as aves abatidas são aproveitadas na alimentação de lares e instituições de solidariedade, não é a benemerência que releva de toda esta actividade pois, os donativos poderiam ser feitos directamente a essas instituições, sem chumbo e com controlo sanitário das aves, poupando-se em todas as despesas de organização, transporte e armas.
    Além disso, não existem situações de fome muito flagrante em Portugal e as que existem não são, obviamente, resolvidas por esta prática.

    B) Não visa o equilíbrio ambiental.
    Estas técnicas visam, em última instância, a eliminação das espécies. Se se pretendesse preservar as espécies os animais seriam mantidos no seu habitat natural, em liberdade, e não se reproduziam com a finalidade única de comerialização. Estes animais nascem para ser abatidos.
    Se se vizasse a estabilidade dos ecosistemas, os animais eram aí mantidos, o que não acontece nesta actividade.

    C) Há uma alternativa equivalente com alvos não vivos.
    Cada vez se utiliza mais, no estrangeiro e em Portugal, o tiro aos pratos a às hélices com a mesma eficácia que têm os alvos vivos. Imitam, até, a imprevisibilidade dos pombos e nem sequer têm o inconveniente de o pombo não querer sair quando se lhe abre a porta. Também são imprevisiveis e difíceis de alvejar. Portanto, verifica-se que não é uma actividade inevitável mas antes desnecessária, dado que existem alternativas equivalentes.

    2- Não estão preenchidas as situações excepcionais permissivas do art.º1.º/3.
    Não há nenhum tipo de situação que se possa reconduzir ao tiro aos pombos. Contudo, isto não torna a actividade lícita pois o termo "também" mostra-nos que o n.º3 procede a uma extensão da previsão do n.º1 do art.º1.º da Lei 92/95 pelo que, basta ser uma actividade proibida à luz da cláusula geral do n.º1 para não termos de recorrer ao n.º3 do referido artigo.

    3- Devemos fazer interpretação do art.º1.º conforme à CRP.
    A constituição ambiental (art.º 9.º c) e d) e art.º66.º) deve ser critério interpretativo suplementar na hermenêutica das fontes infra-constitucionais, devendo o intérprete escolher um sentido normativo que mais próximo esteja da orientação constitucional que exista sobre aquele assunto, isto é, fazer uma interpretação conforme à CRP da legislação infra-constitucional.
    Ora, a CRP encerra uma orientação a favor da Natureza, beneficiando-a contra a actividade agressiva do Homem, pelo que temos que preencher os conceitos indeterminados de modo a favorecer a Natureza, nomeadamente o de "necessidade", no sentido de proteger os animais contra as pessoas que os pretendem aniquilar e considerando a actividade de tiro aos pombos legalmente não justificada.

    4- Não violar a Declaração Universal dos Direitos do Animal.
    A Declaração Universal dos Direitos do Animal, embora não tenha eficácia convencional pois pois é apenas uma declaração, tem força jurídica pois muitas das suas normas têm raíz costumeira. Algumas das normas desta convenção vigoram na ordem jurídica interna a título de Direito Internacional Comum, com recepção automática pelo art.º8.º/1 CRP,logo, acrescem à Lei 92/95 como protectoras dos animais. A actividade do tiro aos pombos põe em causa o art.º3.º desta Declaração , o mesmo é dizer, a integridade física dos animais.
    Além disso, à luz do art.º11.º, proibe-se a morte dos animais, salvo em caso de "necessidade". Ora, não se podendo justificar esta prática por qualquer razão atendível, nem motivo de necessidade, estamos perante um biocídio.
    Deste modo se apresenta mais um argumento, de cariz internacional, no sentido de se afirmar um grave e desnecessário atentado à integridade física e à vida desses animais.

    5- Fazer interpretação conforme ao Direito Comunitário, nomeadamente, ao Protocolo Relativo à Protecção e ao Bem-estar dos Animais.
    Enquanto princípio corolário da efectividade e cooperação leal, a interpretação conforme a este Protocolo, anexo ao Tratado de Amesterdão, obriga-nos a respeitar o bem estar dos animais enquanto seres dotados de sensibilidade e a conferir-lhes uma protecção reforçada, o mesmo é dizer, a afastar a licitude do tiro aos pombos por não ser uma actividade salvaguardada e "necessária" pelo referido protocolo.

    Quanto aos argumentos a favor da legalidade do tiro aos pombos:

    6- Os animais não são titulares de direitos, as pessoas é que têm deveres para com eles.
    Frase muitas vezes referida pelo STJ que revela uma perspectiva claramente antropocentrista do direito do ambiente e que é usada por alguns como argumento para afastar a ilicitude do tiro aos pombos.
    Contudo, ainda que se considere os animais como coisas, teriamos sempre de afirmar que são res sui generis dadas as suas características especiais, há indubitavelmente leis que os visam proteger, nomeadamente, o art.º1.º da Lei 92/95 que é um parâmetro mínimo a ser observado na protecção dos animais, embora se possa discutir qual o seu âmbito.

    7- A tourada, a caça, a pesca, a arte equestre e a investigação científica são permitidas por lei.
    E também nestas actividades se verifica o sofrimento cruel e prolongado, lesões graves e, nalguns casos, a morte dos animais.
    De facto, estamos perante expressas excepções à regra, previstas no n.º3 do art.º1.º da Lei 92/95, para atender a valores superiores em confronto com os direitos dos animais. Todavia, o mesmo não se passa com o tiro aos pombos. Esta actividade não foi excluida expressamente da proibição legal, através de uma interpretação enunciativa a contrario, pelo que se inscreve claramente na proibição geral do n.º1 do referido artigo.

    Argumento também invocado por alguns consiste em reconduzir a actividade de tiro aos pombos à caça, o que afastaria a ilicitude daquela actividade.
    Todavia, o tiro aos pombos destina-se apenas a abater essas aves, retirando-as previamente do seu habitat natural e colocando-as numa caixa, ou seja, é uma actividade totalmente desligada da Natureza, ao contrário da caça na qual o animal está no seu habitat natural e o Homem busca-o sem qualquer intervenção prévia. Assim se demonstra a diferença nítida entre ambas as actividades, a qual justifica um tratamento jurídico diferente.
    Além disso, permite-se a caça de pombos, no decreto-lei 202/2004 de 18/8, o que acresce a favor do entendimento que não se pode enquadrar o tiro aos pombos na excepção constante do art.º1.º n.º3 f) in fine, pois caça de pombos é diferente do tiro aos pombos.

    Outros invocam ainda que a lei admite as largadas nos campos de treinos de caça, aplicando ao tiro aos pombos esse regime por analogia. Mas, no plano normativo é evidente a diferença entre ambos. As largadas são instrumentais à caça e portanto regem-se pela lei da caça, pois visam apurar a perícia dos caçadores, ao passo que o tiro aos pombos não tem ligação com a caça, pelas razões já enunciadas.

    8- Desapareceu, durante o debate parlamentar, a proibição das provas de tiro a alvos vivos.
    Este facto demonstra-nos que o legislador alterou a sua valoração acerca desta questão, entre o projecto de lei e a lei. Trata-se do elemento histórico de interpretação, o qual não pode deixar de ser levado em consideração e que nos aponta claramente para a legalidade desta prática, pois foi essa a intenção do legislador.
    Contra-argumenta-se que essa proibição já estaria no n.º1 do art.º1.º, pelo que o legislador não se quiz repetir. Contudo, este contra-argumento não procede pois, se assim fosse, não haveria nenhuma das alíneas do n.º3. A razão que justifica a existência de uma das alíneas do n.º3 também justifica a do tiro aos pombos, caso o legislador o entendesse contrário à lei.
    Contra-alega-se, ainda, que o procedimento legislativo é muito complexo e existe um complexo de arranjos inerente a qualquer decisão parlamentar que é quase impossível atribuir ao desaparecimento de uma alínea a licitude de uma actividade. Este argumento também não procede, carecendo de qualquer sentido uma justificação assente no procedimento legislativo, pois este mesmo procedimento é o usado para todos os diplomas legais e é através dele que emana a vontade do legislador em todos os casos. Este procedimento não é excepcional para esta lei logo não serve para a excepcionar face às demais, nas quais se regulam algumas situações e se deixam outras de fora, deliberadamente.
    Um terceiro contra-argumento prende-se com a não sobrevalorização do elemento histórico, atribuindo-lhe tão drásticas consequências. Não se deve passar de prática proibida a permitida só por ter sido suprimida a alínea no debate parlamentar. Mas, é precisamente para isso que serve este debate, para dali sair a vontade definitiva do povo português. Se não pudesse ter essas consequências práticas, o debate parlamentar não teria qualquer utilidade e poderiamos apresentar logo as leis sem qualquer debate nem propostas.
    Alegação válida e que afastaria esta argumentação é a que se prende como facto de a cláusula geral do n.º1 já prever a ilicitude desta prática e portanto, sendo o n.º3 meramente exemplificativo, ainda que o legislador se tenha esquecido ou tenha deliberadamente deixado de fora o tiro aos pombos, esta actividade inscreve-se, tal como outras condutas não previstas no n.º3, no âmbito do n.º1, mediante exercício interpretativo do aplicador.

    9- Existe um costume contra legem derrogatório da proibição geral desta prática, a qual faz parte da tradição cultural portuguesa. Isto tornaria o tiro aos pombos permitido.
    Este argumento é invocado por quem considera a prática do tiro aos pombos abrangida pela proibição do n.º1 do art.º1.º e está dependente da observação de dois requisitos: que a prática de tiro aos pombos seja uma prática reiterada e que haja a convicção da sua obrigatoriedade. Aqui reside precisamente o problema. Estamos perante uma actividade pouco frequente , até porque muitas vezes se recorre a alvos artificiais e, além disso, perante as decisões jurisprudênciais que proibiram vários concursos, não houve alegações no sentido de convicção da obrigatoriedade mas sim da ilicitude. Nunca houve desobediência, o que revela não haver costume.
    Acresce que estamos perante uma actividade sem qualquer tradição em Portugal e com pouca adesão social, pese embora o elevado número de clubes de tiro que é uma modalidade olímpica mas, que nada tem a ver com pombos. Ainda que existisse essa tradição em Portugal, a lei sempre lhe prevaleceria pois corresponde à vontade actual e politicamente organizada de um povo, através de uma organização representativa da sua soberania.

    10- A Federação Portuguesa de Tiro goza de utilidade pública desportiva, o que torna o tiro aos pombos lícito.
    Não se pode inferir essa conclusão. A utilidade pública desta entidade não contradiz a proibição do tiro aos pombos. O tiro é um desporto olímpico antigo e respeitado mas isso não significa que todas as actividades organizadas por esta entidade sejam lícitas, e o tiro aos pombos é prova disso mesmo.

    11- O tiro aos pombos contribui para a sobrevivência da espécie "Zuritos", promovendo o seu crescimento. (Argumento da não identidade)
    Sem esta prática os pombos não existiriam.
    Ora, além de ser do conhecimento geral que os pombos se reproduzem muito facilmente, não havendo qualquer risco da sua extinção, é inaceitável que, em nome da mera existência, se justifique qualquer fim para os pombos. Como refere Fernando Araújo, chegaríamos ao argumento absurdo que "certos animais deveriam pagar com a vida... o benefício da vida que lhe demos!"

    Por tudo quanto referimos anteriormente, e partindo do princípio que o legislador é sensato, somos levados a concluir pela ilicitude da prática de tiro aos pombos pois está em causa uma actividade que causa, sem necessidade, normalmente a morte, e frequentemente o sofrimento cruel e prolongado e lesões graves aos animais, pelo que tem razão o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 29/10/03, bem como muitos outros tribunais de primeira instância ao longo de vários anos ,pois caso contrário, seriamos levados a abrir a possibilidade de práticas como a luta de galos, luta de cães, o tiro às perdizes e outras práticas bárbaras contra os animais, justificadas apenas na diversão dos praticantes destes deportos, satisfação de actividades lúdicas e consequente equilíbrio bio-psíquico do Homem.
    Assim, temos de discordar da jurisprudência do STJ, no seu Acórdão de 19/10/04, quando afirma que "[...] a prática desportiva de tiro ao voo de pombos não se enquadra na proibição a que se reporta o proémio e o n.º1 do art.º1.º, nem o seu n.º3, alínea e), da Lei n.º92/95, de 12/9, pelo que não é proibida no nosso ordenamento jurídico" ,pois, este tribunal partiu de uma noção muito ampla de "necessidade", de modo a incluir a tradição cultural portuguesa que torna justificada e útil a morte dos pombos nas provas de tiro.


    Marina Isabel C. Pereira
    Sub.4, n.º 14674  

  12. Anónimo disse...

    Tiro aos pombos:
    A análise deste acórdão passa pela temática dos direitos dos animais.
    Não sou insensível a esta questão, na medida em que sou da opinião de que, apesar de não se lhes dever conferir direitos em virtude de não possuírem personalidade jurídica, se deve conferir aos animais uma tutela que garanta o seu bem-estar e integridade física.
    Quando o STJ se pronuncia pela licitude da actividade do tiro aos pombos, invocando que esta é uma excepção à proibição do artigo 1º/1 da Lei 92/95, invocando que é uma prática tradicional e desportiva, conferindo a esta espécie animal um carácter de mero objecto, merece reprovação, em meu entender.
    Primeiro, porque todo o procedimento que envolve a prática de tiro aos pombos é extremamente cruel, já que lhes são removidas as penas da cauda para que o respectivo voo seja menos ágil, e após serem baleados levam horas a morrer, prolongando-se a sua agonia e desespero. Não compreendo como é que uma actividade lúdica ou de mera experiência possa justificar tais actos desumanos, até porque há formas de substituí-los, através da alternativa de tiro aos pratos, por exemplo. Assim, torna-se desnecessário em absoluto o tiro aos pombos com carácter desportivo, tendo em conta as alternativas existentes.
    Depois há que analisar a questão de se poder enquadrar esta actividade em práticas culturais suficientemente relevantes para que se possa explorar o sofrimento e a morte de certas espécies, tais como os touros. Não parece viável que se possa defender a referida excepção no caso do tiro aos pombos, não parece existir uma tradição que justifique tal prática. Como tal, deve aplicar-se aqui as normas de protecção dos animais decorrentes da Lei 92/95, e negar que esta actividade seja equiparada, por via da analogia, às touradas ou à caça, uma vez que estas comportam regulamentação especial, constituindo casos excepcionais, e como tal, tudo o que é excepção não pode permitir interpretação analógica.
    Em conclusão, estou de acordo com a decisão do Tribunal da Relação de Guimarães quando se decide pela ilicitude da actividade de tiro aos pombos, e com a sua proposta de os substituir por objectos inanimados, tais como pratos e hélices. Acredito que este sofrimentos por que os pombos passam no decurso desta actividade é perfeitamente dispensável. Não sou sequer da opinião de que as touradas (ou outras actividades que envolvam a exploração do sofrimento e da morte dos animais em si envolvidos) devam ser justificadas por tradições antigas, logo, neste caso não se comprovando sequer a existência de um motivo justificante, e tendo em conta a anterior argumentação, ainda menos me posso mostrar a favor da licitude da actividade do tiro aos pombos.

    Ana Isabel Cid nº14661  

  13. Anónimo disse...

    Tiro aos pombos:
    A análise deste acórdão passa pela temática dos direitos dos animais.
    Não sou insensível a esta questão, na medida em que sou da opinião de que, apesar de não se lhes dever conferir direitos em virtude de não possuírem personalidade jurídica, se deve conferir aos animais uma tutela que garanta o seu bem-estar e integridade física.
    Quando o STJ se pronuncia pela licitude da actividade do tiro aos pombos, invocando que esta é uma excepção à proibição do artigo 1º/1 da Lei 92/95, invocando que é uma prática tradicional e desportiva, conferindo a esta espécie animal um carácter de mero objecto, merece reprovação, em meu entender.
    Primeiro, porque todo o procedimento que envolve a prática de tiro aos pombos é extremamente cruel, já que lhes são removidas as penas da cauda para que o respectivo voo seja menos ágil, e após serem baleados levam horas a morrer, prolongando-se a sua agonia e desespero. Não compreendo como é que uma actividade lúdica ou de mera experiência possa justificar tais actos desumanos, até porque há formas de substituí-los, através da alternativa de tiro aos pratos, por exemplo. Assim, torna-se desnecessário em absoluto o tiro aos pombos com carácter desportivo, tendo em conta as alternativas existentes.
    Depois há que analisar a questão de se poder enquadrar esta actividade em práticas culturais suficientemente relevantes para que se possa explorar o sofrimento e a morte de certas espécies, tais como os touros. Não parece viável que se possa defender a referida excepção no caso do tiro aos pombos, não parece existir uma tradição que justifique tal prática. Como tal, deve aplicar-se aqui as normas de protecção dos animais decorrentes da Lei 92/95, e negar que esta actividade seja equiparada, por via da analogia, às touradas ou à caça, uma vez que estas comportam regulamentação especial, constituindo casos excepcionais, e como tal, tudo o que é excepção não pode permitir interpretação analógica.
    Em conclusão, estou de acordo com a decisão do Tribunal da Relação de Guimarães quando se decide pela ilicitude da actividade de tiro aos pombos, e com a sua proposta de os substituir por objectos inanimados, tais como pratos e hélices. Acredito que este sofrimentos por que os pombos passam no decurso desta actividade é perfeitamente dispensável. Não sou sequer da opinião de que as touradas (ou outras actividades que envolvam a exploração do sofrimento e da morte dos animais em si envolvidos) devam ser justificadas por tradições antigas, logo, neste caso não se comprovando sequer a existência de um motivo justificante, e tendo em conta a anterior argumentação, ainda menos me posso mostrar a favor da licitude da actividade do tiro aos pombos.

    Ana Isabel Cid nº14661  

  14. Anónimo disse...

    Detenção de cães e gatos:

    No Acórdão do T.C. n.º229/2007 debate-se a questão da (in)constitucionalidade da norma constante do art.º3.º/6 do decreto-lei 314/2003 de 17/12, a qual se refere à emissão de mandado judicial que permita aceder ao local da situação dos animais.
    O T.C. pronunciou-se pela inconstitucionalidade orgânica da norma em questão, aduzindo vários argumentos.
    Contudo, cremos que partiu de um pressuposto errado, o qual carece de demostração e, que consiste em interpretar o art.º3.º/6 no sentido de atribuir competência aos tribunais judiciais. "[...] o Decreto-lei n.º314/2003, de 17 de Dezembro, art.º3.º n.º6, dispõe expressamente no sentido de serem competentes os tribunais judiciais para verificação da legalidade do acto administrativo, pressuposto da emissão do mandado requerido..."
    Ora, isto não é demonstrado no Acórdão em análise nem se pode retirar da letra e espírito do art.º3.º/6 do d.l. 314/2003.
    Se é verdade que se trata de uma questão da competência dos Tribunais Administrativos, pois estamos perante um acto administrativo no art.º3.º/5, e que, porttanto, o tribunal onde a providência foi intentada é incompetente em razão da matéria, não podemos concordar com a declaração de inconstitucionalidade da norma em causa, pois a argumentação aduzida nesse sentido padece de um vício porquanto se baseia num pressuposto errado, a incorrecta interpretação do art.º6.º/3.
    O mandado judicial referido neste art.º pode ser da competência de um juíz dos Tribunais Administrativos e Fiscais, não se estando com isso a violar qualquer norma de competência.
    Incumbe-nos, ainda, fazer uma breve referência às alegações do Ministério Público, com as quais somos obrigados a concordar, sobretudo quando argumenta que a interpretação adequada da norma é a que atribui competência á jurisdição administrativa, pois não há nada que nos indique em sentido contrário. "Nestes termos, deve a norma desaplicada na decisão recorrida ser interpretada em conformidade com a Constituição, de modo a caber à jurisdição administrativa a competência para a emissão do "mandado judicial" previsto no n.º6 do artigo 3.º do Decreto Lei n.º 314/03."
    Assim, verificamos que não há qualquer vício de argumentação a apontar ao T.C., o qual se apresenta coerente nas suas conclusões, todavia, o pressuposto de onde parte está errado, o que inutiliza toda a argumentação jurídica subsequente.

    Marina Isabel C. Pereira
    sub.4; n.º14674  


 

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