Comentário ao Acórdão 136/2005

Comentário ao Acórdão 136/2005
Antes de procedermos à análise da problemática subjacente ao acórdão, devemos introduzir a temática e integrá-la históricamente.
Assim, surge-nos o direito de acesso à informação no artigo 268º/1 e 2 da CRP, numa dimensão objectiva e subjectiva.
Subjectiva – que se revela no factor de a informação e o acesso às suas fontes ser essencial para que o cidadão compreenda o fundamento e limite dos seus direitos face aos poderes públicos.
Objectiva – por ser indispensável ao controlo da transparência das decisões Administrativas, a possibilidade de os cidadãos se poderem informar e serem informados sobre os passos do caminho procedimental.
Ora neste contexto, ao longo do tempo o direito à informação Ambiental foi ganhando “fôlego”, nomeadamente em 1990, através da directiva do Conselho – 90/313/CEE.
Mais tarde, foi a Convenção de Aarhus, que surgiu como primeiro instrumento universal de democratização das decisões sobre o Ambiente, tendo esta Convenção duas consequências:
- A revisão da directiva 90/313/CEE.
- A aprovação do regulamento 1367/2006, do Parlamento e do Conselho, relativo à aplicação das disposições da Convenção no âmbito intra-comunitário.
Ressalve-se que Portugal, em 2003, tornou-se parte na Convenção de Aahrus, e que ainda se transpôs, mesmo que deficientemente, a directiva - 90/313/CEE, por via do artigo 22º da LADA – Lei de Acesso aos documentos da Administração.
Passemos então para a matéria de facto.
Relativamente à matéria de facto, podemos identificar como importante: a apresentação de requerimento de intimação do Primeiro-Ministro, efectuado por uma organização ambiental, a facultar-lhe certidões referentes à totalidade do contrato outorgado entre o Estado Português e as empresas do grupo B., incluindo os respectivos Anexos e estudos técnicos, de modo a permitir à requerente avaliar a incidência ambiental e concorrencial do projecto de implantação de uma unidade industrial em Esposende.
Posteriormente, o TAC, veio a indeferir a sua pretensão por considerar que as normas ínsitas no n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, e do n.º 1 do artigo 13.º Decreto-Lei n.º 321/95, de 28 de Novembro, não seriam inconstitucionais.
Consequentemente, a organização ambientalista decide recorrer para o Tribunal Constitucional, da decisão de que prevaleceriam as normas protectoras de segredo industrial, de propriedade privada, de liberdade de iniciativa de propriedade privada dos meios de produção em confronto com o direito à informação para a protecção do Ambiente, e também da decisão de que em caso de colisão, não haveria uma prevalência do direito ao ambiente em confronto com direitos de carácter patrimonial.
Neste contexto, o Tribunal fundamenta a sua decisão de não serem estas normas inconstitucionais alicerçada numa argumentação, que a nosso ver se revela algo falaciosa.
Ora, primeiro o Tribunal Constitucional, considera que o direito à informação ambiental, só existe reflexamente e que tal decorre do artigo 268º 1 e 2, tendo em conta o princípio da tutela jurisdicional efectiva, para lhe ser possível contradizer o argumento apresentado pela organização ambiental, considerando esta que os limites dos direitos de acesso ao artigo 268º/2 CRP, são apenas os que resultam de reserva de lei relativas às matérias descritas.
Concordamos em parte à argumentação de que para saber quais os documentos que podem ser comunicados e quais é que permanecem sob sigilo, que devemos recorrer ao artigo 18º CRP, e até que o direito à informação pode ser restrito nestes termos, pois como se sabe não há direitos absolutos.
Já por outro lado, discordamos consideravelmente da forma como o Tribunal Constitucional, diz que alcança a concordância prática entre estes dois direitos conflituantes.
E discordamos, porque na parte final da sua fundamentação o Tribunal Constitucional, passa a confrontar erróneamente o direito de acesso a informações ambientais, com os valores constitucionais das tarefas fundamentais do Estado, constantes do artigo 9º da CRP, em razão de considerar que nos interesses contrapostos é necessário ter em conta que os contratos de investimento assinados pelo Estado Português e pelas empresas possibilitam o desenvolvimento económico e invoca neste caso a cláusula da “reserva do possível”.
Este é mais um ponto criticável, pois neste momento trata-se de um mero acesso a anexos de um contrato, nada nos diz que este acesso vai tolher o desenvolvimento económico, se num segundo momento este argumento seria bem acolhido, nesta fase em que se trata de um mero acesso a informações, parece que é desprovido de utilidade.
Mas o Tribunal Constitucional vai mais longe, considera que o projecto ao ser objecto de aprovação pelas entidades competentes, numa ideia idílica de que a Administração Pública representa um ideal em termos decisórios, faz cair assim a tutela ao ambiente invocada pela organização, pois a “vigilância" não é a única forma, nem a principal ou privilegiada de acautelar este direito.
Concordamos ainda assim, com o voto de vencido, com efeito, não se deve ignorar o princípio da prevenção, pois para este efeito a informação ambiental tem um carácter decisivo e neste caso estas normas deviam ter sido declaradas inconstitucionais, pelo que o tribunal deveria ter efectuado a ponderação dos interesses em confronto, ao invés de dar prevalência absoluta ao interesse do particular contraente ao sigilo das informações relacionadas com essa operação de investimento estrangeiro.
Por último, cabe-nos indagar a solução dada para estes casos pela Lei 19/2006 – a Lei de acesso à informação ambiental.
Nos termos do artigo 6º da LAIA, as autoridades públicas são obrigadas a disponibilizar informações ao requerente, sem necessidade de demonstração de interesse, contudo quando essa informação prejudicar a confidencialidade das informações comerciais ou industriais, sempre que a mesma esteja prevista na legislação nacional ou comunitária, poderá constituir fundamento de indeferimento, segundo o artigo 11º/6 alínea d).
Ainda assim, quando os fundamentos de indeferimento, referidos no artigo 11º/6 se reportam às alíneas a), d), f), g) e h), não se permite a sua invocação sempre que o pedido de informação incida sobre emissões para o ambiente, trata-se da neutralização do efeito fundamentante da recusa – artigo 11º/7 LAIA.
Segundo o disposto no artigo 11º/ 8 da LAIA, estes fundamentos de indeferimento, devem ser alvo de interpretação restritiva e submetidos ao crivo da proporcionalidade.

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