Deferimento tácito no Direito ao Ambiente
1- Contexto histórico do Contencioso Administrativo Português
2- Direito Comparado – Alemanha, Itália, França e Espanha
3- Natureza do Deferimento tácito
4- Posição adoptada acerca da necessidade da figura
5- Deferimento tácito no Direito do Ambiente
Contexto histórico
Tradicionalmente, existe uma dicotomia entre um modelo subjectivista e um modelo objectivista. Se no modelo subjectivista a tutela de direitos e interesses legítimos era uma das suas características, já no modelo objectivista era a defesa da legalidade e do interesse público a sua principal função.
A lei de Processo dos Tribunais, doravante designada por LPTA, publicada em 1985 e revogada pelo CPTA, consignava uma forte matriz francesa, um sistema objectivista que indirectamente influenciou o Contencioso Administrativo Português.
Com efeito, antes do Novo Regime de Processo nos Tribunais Administrativos, a justiça administrativa limitava-se a ser uma mera formulação de pedidos de anulação ou de declaração de nulidade de actos administrativos, denotando um pendor objectivista. Contudo, a Reforma do Contencioso Administrativo veio permitir a convivência entre subjectivismo e objectivismo.
Com a reforma, há, por um lado, o reforço da ideia de que o processo administrativo é cada vez mais um processo de partes. Não deixa de ser um controlo da legalidade objectiva mas é gradualmente, e cada vez mais, um processo de partes. Por outro lado, há um alargamento claro, nítido, dos poderes de cognição e dos poderes de decisão do juiz perante a Administração e em defesa do particular, reflexamente. Portanto, o pendor subjectivista foi acentuado.
Anteriormente, existia um contencioso que assentava nos poderes cassatórios do juiz, visto como um mero contencioso de anulação, ou seja de jurisdição meramente anulatória, pelo que o juiz anula a decisão, mas por aí se fica.
Considerava-se que o juiz estava apenas a controlar a conformidade da decisão administrativa com a lei, não lhe cabendo a reposição da situação subjectiva do particular.
Com a revisão constitucional de 1997, deixou flagrantemente de fazer sentido este rumo caduco e interminável, que o nosso contencioso tomava, pois bem, foi a própria Lei Fundamental que no seu artigo 268º/4, passou a incluir na tutela jurisdicional efectiva, “a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos”.
A verdade é que a partir deste momento, estava a porta aberta para singrar, a possibilidade de condenar a Administração à prática de actos administrativos, restava enquadrar estes poderes condenatórios, num determinado meio processual no âmbito da LPTA, algo que foi sendo feito pela doutrina.
Ainda assim, os tribunais administrativos continuaram a não determinar a Administração a praticar os actos devidos, porventura por uma linha jurisprudencial demasiado conservadora.
Com a entrada em vigor do CPTA, tudo se alterou, com criação do regime estabelecido nos artigos 66º e seguintes do CPTA, caminhando-se em passos largos para um cenário que até ai parecia idílico, onde a tutela jurisdicional dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, é efectiva.
Pretendemos explorar então a problemática relativa ao acto tácito positivo, com especial incidência para as situações em que se reconhece aos particulares o direito de pedirem a condenação da administração.
Direito Comparado
Tendo em conta a forte influência do Direito Administrativo Alemão, no Contencioso Administrativo Português, decidimos começar esta nossa “viagem” em termos de Direito Comparado pelo Direito Alemão.
Direito Alemão
No Direito Alemão existem várias acções:
1- Anfechtungsklage – sendo uma acção impugnatória, tendo carácter constitutivo e é procedente quando o acto é contrário ao direito e essa ilegalidade afecta o direito subjectivo do demandante – 42º/1 VwGo.
2- Feststellungsklage – é uma acção declarativa com carácter subsidiário, tratando-se de um pedido, essencialmente de declaração de existência ou inexistência de relação jurídica – 43º/1VwGo.
3- Normenkontrollverfahren – consiste no recurso directo contra regulamentos.
4- Leistungsklagen – acções de condenação de que nos ocuparemos em maior detalhe pois comportam uma subdivisão.
Existe a Verpflichtungsklage sendo o pedido em causa, o pedido de condenação da Administração, a ditar um acto após um de dois momentos:
- A Recusa da pretensão do particular – a Versagungsklage – o que implica um prévio recurso administrativo.
- A Omissão da Administração ou inactividade - a Untätigskeitsklage – havendo um recurso directo para Tribunal.
A Allgemeine Leistungsklage – representa uma pretensão genérica de condenação, aplicável quando o pedido ao tribunal condenatório da Administração corresponde a levar a cabo uma prestação material distinta de um acto administrativo.
Dito isto, a primeira pergunta que se nos coloca é: quais os poderes do juiz no âmbito destas acções condenatórias?
Depende do facto de o assunto julgado estar, ou não, apto, susceptível, de ser julgado num sentido concreto.
Se sim, o Tribunal condena a Administração a praticar um acto com um determinado conteúdo concreto. Se não o for, o Tribunal efectua oficiosamente uma investigação com vista a permitir que o caso fique em condições de ser objecto de uma decisão de um acto concreto. Se tal for possível, emite uma decisão nos termos anteriores, senão for, condena à prática de um acto sem determinar o conteúdo.
A existência deste meio de reacção contra o silêncio, contudo não significa que não haja efeitos positivos do silêncio, só que a chamada Fiktions der Genehmigungsurteilung, revela-se tão excepcional, que até no caso do pedido de licença de construção, a reacção contra a inércia administrativa é feita pela Verpflichtungsklage.
Direito Italiano
No Direito Italiano, não existe uma regulação unitária da significação do silêncio administrativo, tal como a podemos encontrar nos ordenamentos jurídicos português e espanhol.
Assim, resulta essencialmente de legislação extravagante, sendo possível distinguir várias figuras, sem existir uma regra geral de deferimento ou indeferimento.
Existem no Direito Italiano, três figuras importantes na caracterização do silêncio: o silenzio-rigetto – correspondendo ao indeferimento tácito, o silenzio-assensso ou accoglimento – que equivale ao deferimento tácito, e por fim o silenzo-rifiuto – uma terceira figura, híbrida, que consagra uma obrigação de fundamentação para a ausência de resposta expressa após o decurso de tempo determinado, não implicando qualquer deferimento ou indeferimento tácito, obrigando a Administração apenas a revelar as razões que a levaram à ausência de resposta.
Assim, o particular possui um interesse legítimo a que o órgão administrativo decida expressamente, podendo fazê-lo valer numa acção que elimine o silenzo-rifiuto havendo duas decisões possíveis:
No caso de poder discricionário – o Tribunal declara que a Administração está obrigada a decidir.
Ao invés, no caso de poder vinculado – o juiz indica o sentido do acto a adoptar.
Se a Administração insistir no silêncio é possível usar outra acção para dar cumprimento à execução da decisão anterior, sendo que nestes casos e nos de silenzo-rigetto, a Administração está ainda obrigada a decidir expressamente, uma vez que o dever de decidir não se extinguiu.
França
No Direito Francês, o indeferimento enquanto regra geral serve como norma garantística de acesso aos Tribunais, sendo isso visível no facto de a regra ter sido consagrada em legislação respeitante a Contencioso Administrativo.
Ora, desde 1864, através do art.7º de um decreto de 2 de Novembro desse ano, existe essa regra geral, contudo só regulava os efeitos do silêncio do Ministro na sequência de recurso hierárquico do subalterno, ainda que o Conseil d’Etat interpretasse de forma liberal a norma em causa, considerando possível o recurso contra o silêncio do subalterno com fundamento no mesmo, só posteriormente se procedeu à extensão legal do regime de indeferimento tácito à generalidade da actividade administrativa.
Neste contexto o papel do deferimento tácito corresponde a dois tipos: casos de controlos inter-administrativos e inter-orgânicos – mais concretamente quanto a actos de aprovação de outros actos.
Espanha
Em Espanha, o Procedimento Administrativo iniciado pelos particulares obedece à regra do Deferimento Tácito, com a ressalva de que uma lei ou o Direito Comunitário estabeleça em contrário, nos termos do art. 43º/1 e 2 da Lei 4/1999.
O efeito do silêncio será contudo o indeferimento tácito no caso de o interessado exercer o seu “derecho de petición” – Ex. Solicitação de licenças.
Será ainda nos casos em que o deferimento tácito concede ao particular ou a terceiros faculdades relativas ao domínio ou serviço público – Ex. Concessões.
Em qualquer dos casos, os efeitos do silêncio provocam resultados diferentes: o deferimento acaba com o procedimento administrativo, enquanto o indeferimento permite recorrer ao Contencioso Administrativo ou recurso administrativo.
Tendo uma visão muito generalizada do Direito Comparado da matéria em causa, passamos a analisar a natureza jurídica do Deferimento Tácito.
Natureza do Deferimento Tácito
Antes de analisarmos a natureza do deferimento tácito, apresentamos uma noção de acto tácito positivo, que a nosso ver se afigura como a mais correcta.
O Deferimento Tácito corresponde a um acto ficcionado, pois não é um verdadeiro acto administrativo, mas antes um facto jurídico ao qual, por meio de ficção legal, é aplicado o regime jurídico desse acto administrativo, seguimos neste ponto a posição de JOÃO TIAGO SILVEIRA.
Ora, este acto ficcionado concede ao particular o correspondente à sua pretensão, pois não existe outro dado seguro sobre o qual seja possível determinar o conteúdo do acto tácito de deferimento, este forma-se portanto sobre a pretensão do particular, correspondendo à satisfação do pedido dirigido pelo particular à Administração, excluindo-se os actos tácitos positivos que não resultam da solicitação dos administrados.
Tendo ainda que estar legalmente previsto, o deferimento tácito, tem ainda como requisito – o decurso de um lapso temporal sem que a Administração se tenha pronunciado, para que seja possível que este se produza.
A principal função deste Instituto é impedir que o particular fique sem obter o que pretende face uma inactividade da Administração.
Será que agora tendo em conta o novo Contencioso faz sentido manter esta figura? Não terá perdido sentido útil, principalmente tendo em conta a acção de “condenação à prática do acto devido”?
São algumas destas questões que o nosso estudo visa responder, portanto, cabe-nos analisar as características desta figura.
Antes de mais, devemos ainda referir três requisitos importantes para a formação do Deferimento Tácito:
- Pedido a um órgão para que adopte um acto administrativo – sendo necessária uma iniciativa do interessado para a emissão de um acto administrativo, para a formação de um Deferimento Tácito.
- Competência do órgão ao qual o pedido é dirigido – o acto tácito positivo só se forma se o pedido dirigido o for a um órgão legalmente habilitado a adoptar um acto expresso, seguindo a lógica do art. 9º/1 CPA. – Havendo contudo excepções, nomeadamente, artigo 34º/1ª) CPA e 74ºCPA.
- Existência de um dever legal de decidir que vincule o órgão – Existe um dever legal de decisão para levar a Administração a decidir e nestes casos cabe à mesma pronunciar-se sobre essas pretensões dos particulares, sendo que o artigo 9º/1 CPA consagra um dever genérico de decisão. Sendo que este artigo exige a legitimidade, aferida nos termos do artigo 51ºCPA, a competência do órgão em causa, uma solicitação identificável e inteligível sob pena de indeferimento liminar do pedido nos termos do artigo 76º/3 CPA e exige ainda que não esteja reunido o pressuposto do artigo 9º/2 CPA, contudo neste caso nos termos do artigo 66ºCPA, tem o dever de notificar o particular que não aprecia o mérito da causa.
Partindo desta pequena elucidação, podemos indicar as várias doutrinas acerca da natureza do Deferimento Tácito.
Para AROSO DE ALMEIDA, o Deferimento Tácito corresponde a uma presunção de assentimento e, portanto a lei extrai de uma conduta de inércia da Administração o efeito jurídico de um deferimento que para todos os efeitos substitui, o acto administrativo de sentido positivo que foi omitido. Poderia assim, o particular, apenas recorrer à acção comum, havendo interesse, sendo esta acção dirigida ao reconhecimento de que o acto tácito se produziu ou porventura uma acção de condenação à Administração para o efeito de adoptar os actos jurídicos ou as operações materiais que sejam devidos por esse facto.
Concordamos em parte com a solução dada por este autor, pois bem poderá ser útil o particular pedir o reconhecimento da produção do acto tácito, pois assim havendo caso julgado, o particular ganha em segurança jurídica, caso contrário poderia este ser declarado nulo ou anulável nos termos do artigo 133º e 136º do CPA, respectivamente.
A nosso ver este e outro factor, nomeadamente, o de normalmente as lesões no Direito ao Ambiente serem irreversíveis dificultando, consequentemente, a sua reconstituição natural, implica ser difícil compreender a manutenção desta figura do Deferimento tácito.
Isto traduz-se, por vezes, a que o deferimento tácito seja basicamente, um deferimento provisório que já não serve os propósitos de defesa do particular, e acima de tudo, até em muitos casos revela ser altamente prejudicial para o interesse público tendo em conta a falta de ponderação dos valores em causa por parte da Administração e é exactamente este último ponto que nos choca na existência desta figura.
Por agora continuaremos com a nossa indagação acerca das várias posições sobre a natureza do deferimento tácito, contudo posteriormente voltaremos à nossa posição quanto à utilidade da figura objecto de estudo.
Assim podemos ainda referir, a posição de MARCELLO CAETANO, que identifica o deferimento tácito como uma interpretação legal do comportamento omissivo da Administração, baseado na circunstância de que, se esta tivesse algo a objectar, tê-lo-ia feito antes do prazo para a formação do acto tácito positivo.
Simplesmente, a ausência de vontade, seria umas vezes interpretada de forma positiva e outras de forma negativa.
Esta posição revela-se errada, pois na maioria das vezes a vontade dita psicológica, pois não é exteriorizada, nem existe. Podendo-se configurar duas hipóteses contraditórias, a que esta tese nos levaria:
- Os casos em que a Administração ainda não adoptou um acto válido, pelo que não se formou qualquer vontade que nos permita afirmarem a sua existência.
- Situação em que a Administração já adoptou um acto definitivo, sendo possível descortinar uma vontade, mas o prazo para formação do acto tácito terminou antes do acto em causa se tornar eficaz – maxime não ter ocorrido a notificação a tempo – sendo que neste caso por via da dita “interpretação legal” a conclusão a que chegaríamos por via interpretativa até seria a oposta.
Tendemos a concluir que esta tese confunde a existência de vontade meramente psicológica num comportamento omissivo, com a solução legal para a ausência de vontade da Administração.
Para quem concebe o deferimento tácito como um acto administrativo, revemos duas posições.
Para uns o deferimento tácito corresponderia a um direito de veto da Administração, que esta exerceria caso assim entendesse, e que quando não o fizesse estaria a emitir uma declaração de vontade, ou seja a praticar um verdadeiro acto administrativo.
Para outros, a lei mandaria presumir a vontade do órgão administrativo, criando um acto administrativo, ao qual estariam associados todos os seus efeitos típicos.
A presunção surgiria apenas como uma forma de revelação da vontade administrativa, e não como caracterizador da natureza do acto tácito positivo, sendo que como a lei presumiria a existência de uma vontade administrativa todos os requisitos do acto estariam preenchidos.
Se quanto à primeira posição, ainda que dificilmente, tendemos a concordar que neste ponto já se poderia retirar alguma vontade por parte dos órgãos administrativos, essa vontade operaria por via da lei, em confronto com os elementos essenciais do acto administrativo, não a podemos aceitar, pelos motivos que posteriormente enunciaremos.
Relativamente à segunda posição, discordamos pois padece do vício insuperável, tal como a primeira posição, de que a vontade é elemento caracterizador do conceito de acto administrativo, e essa vontade será sempre uma determinação declarada pela Administração e não meramente uma vontade psicológica, de decisão num determinado sentido.
Assim nos parece, tendo em conta o disposto no artigo 120º CPA, pois os elementos essenciais do acto são:
1 - Ser uma decisão de um órgão da Administração
2 - Adoptada ao abrigo de normas de direito público
3 – Visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta
Ora, tendo em conta o conceito de acto administrativo, dificilmente conseguimos retirar de que a vontade é um elemento caracterizador do conceito de acto administrativo.
Para SÉRVULO CORREIA, o elemento conduta unilateral imprescindível à existência do acto administrativo, corresponde a uma declaração de vontade, vendo no acto tácito uma conduta não declarativa, mas ao qual a lei faria corresponder uma determinada vontade.
Discordamos, salvo o devido respeito, pois tendo em conta os elementos essenciais do acto administrativo, julgamos que a decisão deve ser da Administração e não ser retirada da lei, mas se antes dissermos que essa vontade é ficcionada pela lei, podendo esta mesma associá-la a um determinado regime, nomeadamente, de um acto administrativo, a solução já é mais correcta quando nos referimos à natureza do acto tácito positivo.
Resta-nos aderir à posição de JOÃO TIAGO SILVEIRA, que se nos afigura como correcta, pois o acto tácito positivo só pode ser concebido como ficção, de seguida enunciaremos os motivos pela qual aderimos a esta posição.
Ora, para este autor o silêncio da Administração enquanto facto jurídico não é um indício objectivo e seguro de que a vontade da Administração seja de sinal positivo, tanto que esse mesmo silêncio, igual em outras situações, provoca o deferimento e indeferimento noutros casos.
Daí, ser importante distinguir a ficção da presunção inilídivel, pois enquanto a primeira é uma assimilação factícia de realidades factuais diferentes, para efeitos de as sujeitar ao mesmo regime jurídico, na segunda o legislador supõe, embora de forma irrefutável, que o facto presumido acompanha sempre o facto que serve de base à presunção.
São então figuras distintas, pois a presunção não pode ser desrazoável ao ponto de dar como provada uma realidade quando os factos que a permitem fazer operar não contenham um mínimo de correspondência com ela.
Dispõe o artigo 349º C.C., que são as ilações que o legislador ou a lei retira de um facto conhecido para firmar um desconhecido, tendo por isso de ser verificar um mínimo de correspondência que permita afirmar que do facto conhecido se pode concluir, de se verifica outro.
No caso da ficção, o legislador é livre de efectuar uma equiparação entre regimes, não havendo qualquer tipo de preocupação quanto à escolha dos factos que servem de base à mesma.
Um dos erros então das outras posições será de afirmar a natureza do deferimento enquanto presunção, o que não é correcto, pois o facto jurídico é o silêncio e não o mecanismo legal utilizado para fazer equiparar um facto jurídico a outra realidade, neste caso, o acto.
Um último argumento e que achamos corroborar a nossa posição, será de que não havendo publicação, nem notificação do deferimento, tendo em conta o disposto no artigo 130º e 131º CPA, não faz sentido fazer-se uma equiparação plena ao regime do acto administrativo, senão haveria ainda fundamento para declaração de nulidade na falta de publicação ou notificação, nos termos do artigo 133º/2 i).
Também as formalidades essenciais se revelarão, não obrigatórias dada a natureza do deferimento.
Posição adoptada acerca da necessidade da figura
Passamos agora a tecer considerações acerca da problemática subjacente à valoração do silêncio, passaremos depois a invocar as razões que nos chocam na existência de uma valoração do silêncio da Administração e posteriormente enunciaremos dois casos em particular em que o deferimento tácito se revela desprovido de lógica no direito ao ambiente.
Ora, dispõe o artigo 67º/1 CPTA, que a primeira situação em que é possível a condenação da Administração à prática do acto devido corresponde aos casos em que tendo sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido.
Corresponde, portanto, às situações em que haveria, prima facie, lugar à formação de actos tácitos, não sendo contudo o silêncio da Administração considerado um acto de indeferimento, sendo possível, pedir directamente ao Tribunal que condene a entidade a praticar o acto omitido ou recusado.
Terminou-se com a ficção controversa, erigida em torno de um contencioso de mera anulação, dada a sua exigência da existência de um acto administrativo impugnável para permitir o acesso do particular à justiça.
Era um contencioso em que tudo girava em torno de um acto administrativo, uma concepção “heliocêntrica”, não imune a críticas devido a esta necessidade de ficção da existência de um acto administrativo em situações de pura omissão por parte da Administração.
Esta solução propugnada pelo CPTA, é de aplaudir, pois consegue uma conjugação quase perfeita, isto porque a nosso ver todos os modelos são falíveis, tanto subjectivistas como objectivistas.
Foi o fim anunciado, dum objectivismo, diferente do rumo escolhido pela Alemanha, onde a lei processual seguiu um rumo subjectivista, sendo uma inspiração para o legislador nacional.
A nosso entender a valoração negativa do silêncio, foi definitivamente arredada por força da entrada em vigor da nova lei processual administrativa e da consagração da figura da acção administrativa especial para a condenação à prática do acto devido – 46º/2 a) e b) e 66º e 67º/ 1 a) CPTA.
Contudo a este propósito, o STA veio considerar que nada impediria que o legislador, em lei especial consagrasse a formação de indeferimento no procedimento gracioso, desde que semelhante desvio das regras comuns se mostre necessário à eficácia e prontidão das decisões a proferir na matéria, ficando garantida a segurança jurídica, a efectividade da tutela e que seja dirigido à obtenção de valores superiores sacrificados.
Carece a nosso ver de crítica, pois bem sendo a ficção de indeferimento na sua génese um instrumento para permitir o acesso dos particulares ao contencioso administrativo, não nos é possível compreender, como é possível a perversão da ratio desta ficção.
Relativamente ao acto tácito positivo, se à primeira vista, o pedido de condenação à prática do acto devido, em caso de omissão ou inércia ilegal por parte da Administração perante um requerimento do particular, revogou o regime dos actos tácitos de indeferimento, há questões que nos cabe analisar.
A primeira questão será saber se a alínea a) do número um do artigo 67º CPTA, será apenas aplicável nos casos a que a lei fazia corresponder o indeferimento tácito, ou se pelo contrário, a possibilidade de condenação da Administração à prática do acto omitido, é aplicável, em geral, a toda e qualquer situação de omissão ou inércia da administração, abrangendo actos negativos e actos tácitos de deferimento, previstos genericamente no artigo 108º CPA e em alguns diplomas avulsos.
Tendo em conta a literalidade do preceito, constata-se que nenhuma distinção é feita entre actos de silêncio negativo ou positivo, sendo que a norma simplesmente estabelece que a condenação à prática do acto devido pode ser pedida quando não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido.
Este indício levar-nos-ia a pensar que o CPTA tratou de igual modo, actos de silêncio negativo e positivo, para este efeito, ainda assim a doutrina considerou que o instituto do deferimento tácito não foi revogado pelo CPTA, pelo que AROSO DE ALMEIDA considera que a lei associa ao decurso de tempo do prazo legal para tomada de decisão a presunção de que a pretensão apresentada pelo requerente foi julgada conforme às exigências postas pelo ordenamento jurídico, sendo que nestes não há lugar à propositura de acção de uma condenação à pratica do acto omitido, pois ao resultar da lei a produção do mesmo, não existe necessidade de qualquer intervenção judicial.
Por outro lado, o indeferimento tácito, ao consistir numa ficção legal, necessária para ultrapassar as barreiras de acesso dos particulares ao contencioso administrativo, considera que a partir do momento em que se deixa de fazer depender o acesso à jurisdição administrativa da existência de um acto administrativo passível de impugnação, deixa de ser necessário ficcionar, em situações de pura inércia ou omissão, a existência de actos administrativo que possam ser objecto de impugnação.
Para AROSO DE ALMEIDA, enquanto o indeferimento tácito representa uma figura de alcance processual, que deixa de ter razão de ser com a entrada em vigor do novo CPTA, o deferimento tácito, constituindo uma figura que a lei atribui o efeito substantivo de se considerar deferida a solicitação de um particular, não seria afectado pelo pedido de condenação à prática do acto devido, já que se permite o efeito que se pretende com esta, sem recurso a tribunal.
Se um dos motivos fundadores deste instituto do acto tácito de deferimento assente na ficção de que o acto cuja prática se requer é conforme a legalidade, este não é o único, fundamento para a criação de tal figura.
Para CARLOS CADILHA, o deferimento tácito corresponde a uma técnica de intervenção de polícia administrativa ou de intervenção tutela que tem em vista evitar consequência desvantajosas que para a esfera jurídica dos particulares podiam resultar da inércia administrativa em relação a certos direitos ou actividades, cujo exercício dependa de um prévio procedimento autorizatório, ao mesmo tempo que força a Administração a dar resposta expressa ao particular, sob pena de se considerar tacitamente deferido um requerimento eventualmente contrário à lei.
Enquanto o indeferimento tácito se destina a por termo a uma situação de indefinição, gerada pela falta de decisão expressa da autoridade administrativa, o acto tácito positivo confere ao particular o direito substantivo correspondente à satisfação da sua pretensão, como forma de evitar prejuízos que resultariam da excessiva demora na resolução do caso, quando a Administração não emita uma decisão expressa no prazo legalmente previsto.
Assim, se a construção dogmática dos efeitos do silêncio administrativo, nas suas vertentes positivas e negativas, representa, uma garantia dos direitos dos particulares, não se pode deixar de ter presente que as razões subjacentes a cada uma das tais vertentes são totalmente diferentes, sendo também distintos os efeitos que do mesmo decorrem.
Só assim é possível admitir e entender a função e valor processual do acto tácito de indeferimento, enquanto forma fundamental de direito a tutela plena e efectiva dos particulares, num contencioso onde a regra de decisão administrativa prévia é essencial, ao invés do que se passa com o acto tácito de deferimento.
Contudo, consideramos o silêncio positivo a demonstração das insuficiências do Direito, pois a lei requer a intervenção, e se o faz é por razões de interesse público, sendo chocante considerar que o decurso de tempo possa produzir efeitos idênticos ao controlo da Administração.
Pois bem, do ponto de vista substantivo o deferimento tácito não é nada mais, que a atribuição de um direito cujo exercício, a lei fazia depender de avaliação da Administração e da qual se prescinde, por falta de actuação dos órgãos administrativos no prazo legalmente estabelecido, pelo que a tutela da legalidade e do interesse público fica fragilizada com este procedimento.
Faz ainda mais sentido em termos em atenção estes factos, quando pensamos quais as áreas prementes na actuação do silencia positivo, nomeadamente, o Urbanismo e o Ambiente, áreas sensíveis, onde a actuação do particular acarreta consequências para bens públicos essenciais, assim como para direitos subjectivos de particulares, que são afectados pelo exercício do direito tacitamente atribuído pela Administração.
Não parece fazer efectivamente muito sentido que, havendo um meio próprio de acção para colmatar a inércia administrativa, seja um imperativo a existência deste silêncio positivo.
Principalmente, não apenas pela existência da possibilidade da condenação da prática do acto devido, mas também pela possibilidade de antecipação de condenação em sede de processo cautelar, nos termos do artigo 112º CPTA, argumento esse que é facilmente apreensível pelo motivo da existência do silêncio positivo, pelo que se insiste na lógica de que o particular requerente da aprovação ou autorização não seja prejudicado pela demora da Administração na resolução do seu pedido, num contexto em que não é possível recorrer aos tribunais para ultrapassar esse atraso de forma efectiva.
Pelo que a criação da tutela cautelar de requerer uma condenação da Administração a autorizar ou aprovar provisoriamente a pretensão deduzida, permite obter provisoriamente a licença ou aprovação solicitada, até que o processo principal se resolva, não fazendo sentido por isso que esta figura continue a existir dadas as circunstâncias.
É desprovido de sentido que funcione de forma cega, sem qualquer tipo de ponderação casuística, sobretudo em áreas tão sensíveis, havendo a possibilidade de nos termos do artigo 120º/1 c) CPTA no âmbito do processo cautelar, a apreciação do mérito do pedido do particular em causa – fumus bonus iuris, e ainda uma ponderação dos interesses públicos e privados nos termos do artigo 120º/2 CPTA.
Cabe fazer contudo uma ressalva, em termos condenatórios o particular ganha uma pronúncia da Administração em caso de silêncio, contudo isso não significa que lhe seja concedida a sua pretensão, ou seja a Administração no âmbito da acção de condenação é instada a decidir expressamente, quer seja pela negativa ou pela positiva, será essa declaração a que o particular terá direito.
Faria muito mais sentido que se utilizassem os meios cautelares, pois levaria a uma solução que permitiria ao particular requerente, interessado em obter o mais rapidamente possível a autorização ou aprovação em causa e aos afectados pelo deferimento da pretensão do particular, interessados em fazer valer a sua posição e obstar à satisfação do pedido apresentado por aquele.
Contudo é evidente que o CPTA, não revogou a figura do deferimento tácito, diferente do que julgamos ter sucedido ao indeferimento tácito.
Consideramos ainda que para se efectivar o desaparecimento do deferimento tácito não deverá ser fruto duma pura e simples das normas que este se encontra previsto, mas antes corresponder a uma revisão profunda e global dos regimes em que se integra.
E a nosso ver essa revisão passaria pela criação de uma figura idêntica à existente no direito italiano, nomeadamente, o silenzo-rifiuto, de modo a que o dever legal de decisão não se extinga pelo decurso de tempo, permitindo o particular decorrido um determinado prazo, recorrer a tribunal e como sanção para a Administração, criar-se legalmente uma mecanismo que criasse uma obrigação de fundamentação pela sua inércia, para além da não extinção do dever legal de decisão.
Deferimento tácito no Direito do Ambiente
Agora passemos à análise em particular deste fenómeno, nomeadamente, no Direito do Ambiente.
Decidimos particularizar um diploma, em que a figura tem um papel particularmente duvidoso e até paradoxal.
Comecemos então por analisar o Decreto-Lei 69/2000, relativo à Avaliação de Impacte Ambiental.
Ora, a AIA corresponde a um instrumento privilegiado de concretização do princípio da prevenção, sendo definida por PAULO PINHO como o processo concebido para garantir, no fundamental, que impactes ambientais significativos sejam satisfatoriamente caracterizados e tomados em consideração no planeamento, dimensionamento e licenciamento de um conjunto relevante de projectos ou acções que, pela sua natureza, dimensão ou localização, são susceptíveis de gerarem consequências nefastas sobre o meio ambiente. Trata-se de um procedimento de apoio à decisão baseado na elaboração de um Estudo de Impacte Ambiental e na condução obrigatória de um processo formalizado de consulta pública.
Assim, trata-se de um procedimento prévio à decisão autorizativa ou licenciadora de projectos susceptíveis de impacto ambiental significativos, tendo como objectivo fornecer à entidade decisória, as informações necessárias para esta ponderar os possíveis efeitos ambientais.
Cabe então analisar quais os projectos sujeitos a AIA.
Nos termos do artigo 1º/3 DL 68/2000, estão sujeitos a AIA os projectos que correspondem aos tipificados neste número, contudo, tendo em conta os números 4 e 5 deste mesmo artigo, estarão sujeitos em moldes casuísticos os projectos referidos.
Este DL 68/2000 prevê ainda uma dispensa do procedimento de AIA, podendo ser total, ou parcial, o que pode ocorrer em circunstâncias excepcionais, nos termos do artigo 3º/1 do mesmo diploma. A nosso ver, tendo em conta que este conceito carece de concretização, pois não é previsto no mesmo diploma, é criticável na medida em que aumenta a discricionariedade nestes casos.
Centremo-nos agora na Declaração de Impacte Ambiental (DIA), por se revelar de extrema importância para o nosso estudo.
Para o Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, a DIA corresponde a um acto administrativo recorrível, que se insere numa relação jurídica administrativa duradoura, e que resulta de um procedimento faseado, no âmbito dos quais ele constitui simultaneamente condição de existência e de determinação do conteúdo de outro acto administrativo posterior.
Pode a DIA ser qual pode ser favorável, condicionalmente favorável ou desfavorável, nos termos do artigo 17º do DL 69/2000.
Fazendo agora a “ponte” para o deferimento tácito, este diploma, dedica um artigo ao instituto objecto do nosso estudo, nomeadamente, o artigo 19º.
Considerando-se, deferida a pretensão do particular, caso passe o prazo para a decisão sem que ela tenha sido comunicada à entidade licenciadora ou competente para a autorização.
A nosso ver, isto representa uma contradição e perversão do próprio regime de avaliação de impacte ambiental. Se se trata de um procedimento essencialmente pensado, para analisar os potenciais perigos para o Ambiente, estranho é que depois se venha permitir ao particular o deferimento da sua pretensão, em sequência do silêncio da Administração no âmbito da apreciação das potenciais consequências ambientais, procedimento considerado tão importante pelo legislador, tendemos por isso a concordar com VASCO PEREIRA DA SILVA.
Segundo VASCO PEREIRA DA SILVA, esta ficção legal de um acto administrativo, representa uma má solução, pois se a finalidade da avaliação ambiental é a de autonomizar a apreciação das consequências ecológicas de uma decisão, no quadro de um procedimento especial, para que a autoridade licenciadora tome uma decisão mais adequada, em razão também da dimensão ambiental dos projectos, não faz sentido que o legislador permita que o silêncio equivalha ao deferimento.
Considera ainda, é preciso ter presente que o deferimento tácito do acto de avaliação não significa a aprovação do pedido de licenciamento do projecto. E que não tendo havido acto de avaliação isso significa que ainda não foi avaliada nem ponderada a dimensão ambiental da actividade proposta, pelo que tal juízo deve ser obrigatoriamente realizado, tanto através da licença ambiental quando ela ainda deva ter lugar, como pela entidade competente para o licenciamento ou autorização do projecto, sob pena de nulidade.
E é precisamente neste ponto que discordamos, pois VASCO PEREIRA DA SILVA, considera que através de interpretação conforme à CRP, do disposto no artigo 20º/3 DL 69/2000, por violação ao princípio da prevenção, o desvalor seria a nulidade, mas que também chegaríamos à nulidade por via do disposto no artigo 133º g) CPA, por se tratar de uma ilegalidade de tal maneira grave, que o conteúdo do acto em causa seria legalmente impossível, sendo que o vício seria o mesmo por se tratar também de ofensa ao conteúdo a um direito fundamental, nomeadamente o Ambiente.
Ora, a nosso ver, a discussão sobre a nulidade ou anulabilidade de um deferimento tácito, só faz verdadeiramente sentido em termos práticos quando se esgotam os prazos para invocação da anulabilidade.
Mas em moldes meramente académicos, consideramos, salvo o devido respeito pelo Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, que não chegamos à nulidade do acto administrativo em causa, nem por via do princípio da prevenção, nem por se tratar de um acto cujo objecto é legalmente impossível e muito menos por ofensa ao conteúdo de um direito fundamental, o suposto direito fundamental ao Ambiente.
A questão subjacente ao problema analisado, é a de saber se a actividade em causa é potencialmente perigosa para o Ambiente, pois sabemos que o legislador em determinados casos fixou quais seriam, noutros seria analisado caso a caso. Mas se essa avaliação não se fez, será impossível saber, se no caso concreto constitui um perigo real para o Ambiente ou não.
Ora, cominar com a nulidade os actos produzidos através de deferimento tácito, seria retirar-lhe efeito útil, será até uma forma de ultrapassar a sua consagração legal, pelo que ainda que critiquemos a figura, não nos parece adequada a nulidade como sanção.
Quanto à nulidade por via da ofensa ao conteúdo de um direito fundamental, discordamos, apesar de a compreendermos, pois bem a concepção unitária de direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos, propugnada pelo Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, era face ao antigo Contencioso uma verdadeira preciosidade, pois permitia o acesso em termos contenciosos aos particulares, contudo apesar de entendermos o esforço nesse sentido, consideramos, salvo o devido respeito, que é neste momento desprovida de utilidade.
Mais, o suposto direito ao ambiente é a nosso ver um interesse difuso, pois representa um interesse relativo à comunidade globalmente considerada, ou a um grupo indeterminado de cidadãos, que se expressa através da relação a um certo bem jurídico – o ambiente - podendo ser encabeçado por qualquer pessoa ou entidades mencionadas no artigo 9º/2 do CPTA, mediante a denominada acção popular.
Seguimos na integralidade a posição de CARLA AMADO GOMES, não se tratando aqui verdadeiramente de um direito a uma prestação ambiental, mas tão somente de um interesse no aproveitamento individual de um bem de dimensão comunitária, cuja violação é susceptível de avaliação jurisdicional através de um mecanismo de extensão de legitimidade pessoal encarnado na acção popular, concluindo pelo dever fundamental ao ambiente.
Tendo em conta o que anteriormente foi dito, concluímos ainda assim que um deferimento em violação dos princípios ambientais, são susceptíveis a nosso ver de anulabilidade, nos termos do artigo 135º CPA.
Deixamos então a nossa crítica de um dos efeitos perversos, do deferimento tácito no Direito ao Ambiente, embora não concordemos com os efeitos da figura em geral, consideramos que o regime devia ser globalmente revisto e a solução deveria passar, como dissemos anteriormente, pela criação de um dever de fundamentação decorrido o prazo legal de decisão e consagrar a perpetuação do dever legal de decisão, em termos idênticos à figura do silenzo-rifiuto, existente no ordenamento jurídico italiano.
Concluímos, esta nossa longa caminhada, tentado esclarecer a nossa concepção acerca da existência da figura, pretendíamos, acima de tudo, suscitar as grandes questões, indicar um caminho, através de uma crítica pessoal.
Consideramos que esta figura não deve ser instrumentalizada pelo legislador, de forma a chegarmos a resultados tão perversos, totalmente desenquadrados com o fundamento da criação deste instituto.
Ainda que se pretenda uma simplificação do processo autorizativo ou licenciador, não será, com certeza, este o caminho a adoptar.
Defendemos que a Administração também não se pode “barricar”, na sua burocracia, impedindo os particulares de verem deferidos os seus pedidos, mas por outro lado não será de todo um bom caminho deixar que a Administração se demita das suas valorações e considerações, quando obrigada pela lei, a favor da salvaguarda dos interesses dos particulares, sendo que por isso mesmo, a nosso ver existe a necessidade de rever o regime do deferimento, de modo a existir um ponto de equilíbrio, nos vários interesses em jogo.
Terminamos com uma citação de Máximo Gorki – “Tudo o que é sábio é simples é claro.”
1- Contexto histórico do Contencioso Administrativo Português
2- Direito Comparado – Alemanha, Itália, França e Espanha
3- Natureza do Deferimento tácito
4- Posição adoptada acerca da necessidade da figura
5- Deferimento tácito no Direito do Ambiente
Contexto histórico
Tradicionalmente, existe uma dicotomia entre um modelo subjectivista e um modelo objectivista. Se no modelo subjectivista a tutela de direitos e interesses legítimos era uma das suas características, já no modelo objectivista era a defesa da legalidade e do interesse público a sua principal função.
A lei de Processo dos Tribunais, doravante designada por LPTA, publicada em 1985 e revogada pelo CPTA, consignava uma forte matriz francesa, um sistema objectivista que indirectamente influenciou o Contencioso Administrativo Português.
Com efeito, antes do Novo Regime de Processo nos Tribunais Administrativos, a justiça administrativa limitava-se a ser uma mera formulação de pedidos de anulação ou de declaração de nulidade de actos administrativos, denotando um pendor objectivista. Contudo, a Reforma do Contencioso Administrativo veio permitir a convivência entre subjectivismo e objectivismo.
Com a reforma, há, por um lado, o reforço da ideia de que o processo administrativo é cada vez mais um processo de partes. Não deixa de ser um controlo da legalidade objectiva mas é gradualmente, e cada vez mais, um processo de partes. Por outro lado, há um alargamento claro, nítido, dos poderes de cognição e dos poderes de decisão do juiz perante a Administração e em defesa do particular, reflexamente. Portanto, o pendor subjectivista foi acentuado.
Anteriormente, existia um contencioso que assentava nos poderes cassatórios do juiz, visto como um mero contencioso de anulação, ou seja de jurisdição meramente anulatória, pelo que o juiz anula a decisão, mas por aí se fica.
Considerava-se que o juiz estava apenas a controlar a conformidade da decisão administrativa com a lei, não lhe cabendo a reposição da situação subjectiva do particular.
Com a revisão constitucional de 1997, deixou flagrantemente de fazer sentido este rumo caduco e interminável, que o nosso contencioso tomava, pois bem, foi a própria Lei Fundamental que no seu artigo 268º/4, passou a incluir na tutela jurisdicional efectiva, “a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos”.
A verdade é que a partir deste momento, estava a porta aberta para singrar, a possibilidade de condenar a Administração à prática de actos administrativos, restava enquadrar estes poderes condenatórios, num determinado meio processual no âmbito da LPTA, algo que foi sendo feito pela doutrina.
Ainda assim, os tribunais administrativos continuaram a não determinar a Administração a praticar os actos devidos, porventura por uma linha jurisprudencial demasiado conservadora.
Com a entrada em vigor do CPTA, tudo se alterou, com criação do regime estabelecido nos artigos 66º e seguintes do CPTA, caminhando-se em passos largos para um cenário que até ai parecia idílico, onde a tutela jurisdicional dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, é efectiva.
Pretendemos explorar então a problemática relativa ao acto tácito positivo, com especial incidência para as situações em que se reconhece aos particulares o direito de pedirem a condenação da administração.
Direito Comparado
Tendo em conta a forte influência do Direito Administrativo Alemão, no Contencioso Administrativo Português, decidimos começar esta nossa “viagem” em termos de Direito Comparado pelo Direito Alemão.
Direito Alemão
No Direito Alemão existem várias acções:
1- Anfechtungsklage – sendo uma acção impugnatória, tendo carácter constitutivo e é procedente quando o acto é contrário ao direito e essa ilegalidade afecta o direito subjectivo do demandante – 42º/1 VwGo.
2- Feststellungsklage – é uma acção declarativa com carácter subsidiário, tratando-se de um pedido, essencialmente de declaração de existência ou inexistência de relação jurídica – 43º/1VwGo.
3- Normenkontrollverfahren – consiste no recurso directo contra regulamentos.
4- Leistungsklagen – acções de condenação de que nos ocuparemos em maior detalhe pois comportam uma subdivisão.
Existe a Verpflichtungsklage sendo o pedido em causa, o pedido de condenação da Administração, a ditar um acto após um de dois momentos:
- A Recusa da pretensão do particular – a Versagungsklage – o que implica um prévio recurso administrativo.
- A Omissão da Administração ou inactividade - a Untätigskeitsklage – havendo um recurso directo para Tribunal.
A Allgemeine Leistungsklage – representa uma pretensão genérica de condenação, aplicável quando o pedido ao tribunal condenatório da Administração corresponde a levar a cabo uma prestação material distinta de um acto administrativo.
Dito isto, a primeira pergunta que se nos coloca é: quais os poderes do juiz no âmbito destas acções condenatórias?
Depende do facto de o assunto julgado estar, ou não, apto, susceptível, de ser julgado num sentido concreto.
Se sim, o Tribunal condena a Administração a praticar um acto com um determinado conteúdo concreto. Se não o for, o Tribunal efectua oficiosamente uma investigação com vista a permitir que o caso fique em condições de ser objecto de uma decisão de um acto concreto. Se tal for possível, emite uma decisão nos termos anteriores, senão for, condena à prática de um acto sem determinar o conteúdo.
A existência deste meio de reacção contra o silêncio, contudo não significa que não haja efeitos positivos do silêncio, só que a chamada Fiktions der Genehmigungsurteilung, revela-se tão excepcional, que até no caso do pedido de licença de construção, a reacção contra a inércia administrativa é feita pela Verpflichtungsklage.
Direito Italiano
No Direito Italiano, não existe uma regulação unitária da significação do silêncio administrativo, tal como a podemos encontrar nos ordenamentos jurídicos português e espanhol.
Assim, resulta essencialmente de legislação extravagante, sendo possível distinguir várias figuras, sem existir uma regra geral de deferimento ou indeferimento.
Existem no Direito Italiano, três figuras importantes na caracterização do silêncio: o silenzio-rigetto – correspondendo ao indeferimento tácito, o silenzio-assensso ou accoglimento – que equivale ao deferimento tácito, e por fim o silenzo-rifiuto – uma terceira figura, híbrida, que consagra uma obrigação de fundamentação para a ausência de resposta expressa após o decurso de tempo determinado, não implicando qualquer deferimento ou indeferimento tácito, obrigando a Administração apenas a revelar as razões que a levaram à ausência de resposta.
Assim, o particular possui um interesse legítimo a que o órgão administrativo decida expressamente, podendo fazê-lo valer numa acção que elimine o silenzo-rifiuto havendo duas decisões possíveis:
No caso de poder discricionário – o Tribunal declara que a Administração está obrigada a decidir.
Ao invés, no caso de poder vinculado – o juiz indica o sentido do acto a adoptar.
Se a Administração insistir no silêncio é possível usar outra acção para dar cumprimento à execução da decisão anterior, sendo que nestes casos e nos de silenzo-rigetto, a Administração está ainda obrigada a decidir expressamente, uma vez que o dever de decidir não se extinguiu.
França
No Direito Francês, o indeferimento enquanto regra geral serve como norma garantística de acesso aos Tribunais, sendo isso visível no facto de a regra ter sido consagrada em legislação respeitante a Contencioso Administrativo.
Ora, desde 1864, através do art.7º de um decreto de 2 de Novembro desse ano, existe essa regra geral, contudo só regulava os efeitos do silêncio do Ministro na sequência de recurso hierárquico do subalterno, ainda que o Conseil d’Etat interpretasse de forma liberal a norma em causa, considerando possível o recurso contra o silêncio do subalterno com fundamento no mesmo, só posteriormente se procedeu à extensão legal do regime de indeferimento tácito à generalidade da actividade administrativa.
Neste contexto o papel do deferimento tácito corresponde a dois tipos: casos de controlos inter-administrativos e inter-orgânicos – mais concretamente quanto a actos de aprovação de outros actos.
Espanha
Em Espanha, o Procedimento Administrativo iniciado pelos particulares obedece à regra do Deferimento Tácito, com a ressalva de que uma lei ou o Direito Comunitário estabeleça em contrário, nos termos do art. 43º/1 e 2 da Lei 4/1999.
O efeito do silêncio será contudo o indeferimento tácito no caso de o interessado exercer o seu “derecho de petición” – Ex. Solicitação de licenças.
Será ainda nos casos em que o deferimento tácito concede ao particular ou a terceiros faculdades relativas ao domínio ou serviço público – Ex. Concessões.
Em qualquer dos casos, os efeitos do silêncio provocam resultados diferentes: o deferimento acaba com o procedimento administrativo, enquanto o indeferimento permite recorrer ao Contencioso Administrativo ou recurso administrativo.
Tendo uma visão muito generalizada do Direito Comparado da matéria em causa, passamos a analisar a natureza jurídica do Deferimento Tácito.
Natureza do Deferimento Tácito
Antes de analisarmos a natureza do deferimento tácito, apresentamos uma noção de acto tácito positivo, que a nosso ver se afigura como a mais correcta.
O Deferimento Tácito corresponde a um acto ficcionado, pois não é um verdadeiro acto administrativo, mas antes um facto jurídico ao qual, por meio de ficção legal, é aplicado o regime jurídico desse acto administrativo, seguimos neste ponto a posição de JOÃO TIAGO SILVEIRA.
Ora, este acto ficcionado concede ao particular o correspondente à sua pretensão, pois não existe outro dado seguro sobre o qual seja possível determinar o conteúdo do acto tácito de deferimento, este forma-se portanto sobre a pretensão do particular, correspondendo à satisfação do pedido dirigido pelo particular à Administração, excluindo-se os actos tácitos positivos que não resultam da solicitação dos administrados.
Tendo ainda que estar legalmente previsto, o deferimento tácito, tem ainda como requisito – o decurso de um lapso temporal sem que a Administração se tenha pronunciado, para que seja possível que este se produza.
A principal função deste Instituto é impedir que o particular fique sem obter o que pretende face uma inactividade da Administração.
Será que agora tendo em conta o novo Contencioso faz sentido manter esta figura? Não terá perdido sentido útil, principalmente tendo em conta a acção de “condenação à prática do acto devido”?
São algumas destas questões que o nosso estudo visa responder, portanto, cabe-nos analisar as características desta figura.
Antes de mais, devemos ainda referir três requisitos importantes para a formação do Deferimento Tácito:
- Pedido a um órgão para que adopte um acto administrativo – sendo necessária uma iniciativa do interessado para a emissão de um acto administrativo, para a formação de um Deferimento Tácito.
- Competência do órgão ao qual o pedido é dirigido – o acto tácito positivo só se forma se o pedido dirigido o for a um órgão legalmente habilitado a adoptar um acto expresso, seguindo a lógica do art. 9º/1 CPA. – Havendo contudo excepções, nomeadamente, artigo 34º/1ª) CPA e 74ºCPA.
- Existência de um dever legal de decidir que vincule o órgão – Existe um dever legal de decisão para levar a Administração a decidir e nestes casos cabe à mesma pronunciar-se sobre essas pretensões dos particulares, sendo que o artigo 9º/1 CPA consagra um dever genérico de decisão. Sendo que este artigo exige a legitimidade, aferida nos termos do artigo 51ºCPA, a competência do órgão em causa, uma solicitação identificável e inteligível sob pena de indeferimento liminar do pedido nos termos do artigo 76º/3 CPA e exige ainda que não esteja reunido o pressuposto do artigo 9º/2 CPA, contudo neste caso nos termos do artigo 66ºCPA, tem o dever de notificar o particular que não aprecia o mérito da causa.
Partindo desta pequena elucidação, podemos indicar as várias doutrinas acerca da natureza do Deferimento Tácito.
Para AROSO DE ALMEIDA, o Deferimento Tácito corresponde a uma presunção de assentimento e, portanto a lei extrai de uma conduta de inércia da Administração o efeito jurídico de um deferimento que para todos os efeitos substitui, o acto administrativo de sentido positivo que foi omitido. Poderia assim, o particular, apenas recorrer à acção comum, havendo interesse, sendo esta acção dirigida ao reconhecimento de que o acto tácito se produziu ou porventura uma acção de condenação à Administração para o efeito de adoptar os actos jurídicos ou as operações materiais que sejam devidos por esse facto.
Concordamos em parte com a solução dada por este autor, pois bem poderá ser útil o particular pedir o reconhecimento da produção do acto tácito, pois assim havendo caso julgado, o particular ganha em segurança jurídica, caso contrário poderia este ser declarado nulo ou anulável nos termos do artigo 133º e 136º do CPA, respectivamente.
A nosso ver este e outro factor, nomeadamente, o de normalmente as lesões no Direito ao Ambiente serem irreversíveis dificultando, consequentemente, a sua reconstituição natural, implica ser difícil compreender a manutenção desta figura do Deferimento tácito.
Isto traduz-se, por vezes, a que o deferimento tácito seja basicamente, um deferimento provisório que já não serve os propósitos de defesa do particular, e acima de tudo, até em muitos casos revela ser altamente prejudicial para o interesse público tendo em conta a falta de ponderação dos valores em causa por parte da Administração e é exactamente este último ponto que nos choca na existência desta figura.
Por agora continuaremos com a nossa indagação acerca das várias posições sobre a natureza do deferimento tácito, contudo posteriormente voltaremos à nossa posição quanto à utilidade da figura objecto de estudo.
Assim podemos ainda referir, a posição de MARCELLO CAETANO, que identifica o deferimento tácito como uma interpretação legal do comportamento omissivo da Administração, baseado na circunstância de que, se esta tivesse algo a objectar, tê-lo-ia feito antes do prazo para a formação do acto tácito positivo.
Simplesmente, a ausência de vontade, seria umas vezes interpretada de forma positiva e outras de forma negativa.
Esta posição revela-se errada, pois na maioria das vezes a vontade dita psicológica, pois não é exteriorizada, nem existe. Podendo-se configurar duas hipóteses contraditórias, a que esta tese nos levaria:
- Os casos em que a Administração ainda não adoptou um acto válido, pelo que não se formou qualquer vontade que nos permita afirmarem a sua existência.
- Situação em que a Administração já adoptou um acto definitivo, sendo possível descortinar uma vontade, mas o prazo para formação do acto tácito terminou antes do acto em causa se tornar eficaz – maxime não ter ocorrido a notificação a tempo – sendo que neste caso por via da dita “interpretação legal” a conclusão a que chegaríamos por via interpretativa até seria a oposta.
Tendemos a concluir que esta tese confunde a existência de vontade meramente psicológica num comportamento omissivo, com a solução legal para a ausência de vontade da Administração.
Para quem concebe o deferimento tácito como um acto administrativo, revemos duas posições.
Para uns o deferimento tácito corresponderia a um direito de veto da Administração, que esta exerceria caso assim entendesse, e que quando não o fizesse estaria a emitir uma declaração de vontade, ou seja a praticar um verdadeiro acto administrativo.
Para outros, a lei mandaria presumir a vontade do órgão administrativo, criando um acto administrativo, ao qual estariam associados todos os seus efeitos típicos.
A presunção surgiria apenas como uma forma de revelação da vontade administrativa, e não como caracterizador da natureza do acto tácito positivo, sendo que como a lei presumiria a existência de uma vontade administrativa todos os requisitos do acto estariam preenchidos.
Se quanto à primeira posição, ainda que dificilmente, tendemos a concordar que neste ponto já se poderia retirar alguma vontade por parte dos órgãos administrativos, essa vontade operaria por via da lei, em confronto com os elementos essenciais do acto administrativo, não a podemos aceitar, pelos motivos que posteriormente enunciaremos.
Relativamente à segunda posição, discordamos pois padece do vício insuperável, tal como a primeira posição, de que a vontade é elemento caracterizador do conceito de acto administrativo, e essa vontade será sempre uma determinação declarada pela Administração e não meramente uma vontade psicológica, de decisão num determinado sentido.
Assim nos parece, tendo em conta o disposto no artigo 120º CPA, pois os elementos essenciais do acto são:
1 - Ser uma decisão de um órgão da Administração
2 - Adoptada ao abrigo de normas de direito público
3 – Visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta
Ora, tendo em conta o conceito de acto administrativo, dificilmente conseguimos retirar de que a vontade é um elemento caracterizador do conceito de acto administrativo.
Para SÉRVULO CORREIA, o elemento conduta unilateral imprescindível à existência do acto administrativo, corresponde a uma declaração de vontade, vendo no acto tácito uma conduta não declarativa, mas ao qual a lei faria corresponder uma determinada vontade.
Discordamos, salvo o devido respeito, pois tendo em conta os elementos essenciais do acto administrativo, julgamos que a decisão deve ser da Administração e não ser retirada da lei, mas se antes dissermos que essa vontade é ficcionada pela lei, podendo esta mesma associá-la a um determinado regime, nomeadamente, de um acto administrativo, a solução já é mais correcta quando nos referimos à natureza do acto tácito positivo.
Resta-nos aderir à posição de JOÃO TIAGO SILVEIRA, que se nos afigura como correcta, pois o acto tácito positivo só pode ser concebido como ficção, de seguida enunciaremos os motivos pela qual aderimos a esta posição.
Ora, para este autor o silêncio da Administração enquanto facto jurídico não é um indício objectivo e seguro de que a vontade da Administração seja de sinal positivo, tanto que esse mesmo silêncio, igual em outras situações, provoca o deferimento e indeferimento noutros casos.
Daí, ser importante distinguir a ficção da presunção inilídivel, pois enquanto a primeira é uma assimilação factícia de realidades factuais diferentes, para efeitos de as sujeitar ao mesmo regime jurídico, na segunda o legislador supõe, embora de forma irrefutável, que o facto presumido acompanha sempre o facto que serve de base à presunção.
São então figuras distintas, pois a presunção não pode ser desrazoável ao ponto de dar como provada uma realidade quando os factos que a permitem fazer operar não contenham um mínimo de correspondência com ela.
Dispõe o artigo 349º C.C., que são as ilações que o legislador ou a lei retira de um facto conhecido para firmar um desconhecido, tendo por isso de ser verificar um mínimo de correspondência que permita afirmar que do facto conhecido se pode concluir, de se verifica outro.
No caso da ficção, o legislador é livre de efectuar uma equiparação entre regimes, não havendo qualquer tipo de preocupação quanto à escolha dos factos que servem de base à mesma.
Um dos erros então das outras posições será de afirmar a natureza do deferimento enquanto presunção, o que não é correcto, pois o facto jurídico é o silêncio e não o mecanismo legal utilizado para fazer equiparar um facto jurídico a outra realidade, neste caso, o acto.
Um último argumento e que achamos corroborar a nossa posição, será de que não havendo publicação, nem notificação do deferimento, tendo em conta o disposto no artigo 130º e 131º CPA, não faz sentido fazer-se uma equiparação plena ao regime do acto administrativo, senão haveria ainda fundamento para declaração de nulidade na falta de publicação ou notificação, nos termos do artigo 133º/2 i).
Também as formalidades essenciais se revelarão, não obrigatórias dada a natureza do deferimento.
Posição adoptada acerca da necessidade da figura
Passamos agora a tecer considerações acerca da problemática subjacente à valoração do silêncio, passaremos depois a invocar as razões que nos chocam na existência de uma valoração do silêncio da Administração e posteriormente enunciaremos dois casos em particular em que o deferimento tácito se revela desprovido de lógica no direito ao ambiente.
Ora, dispõe o artigo 67º/1 CPTA, que a primeira situação em que é possível a condenação da Administração à prática do acto devido corresponde aos casos em que tendo sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido.
Corresponde, portanto, às situações em que haveria, prima facie, lugar à formação de actos tácitos, não sendo contudo o silêncio da Administração considerado um acto de indeferimento, sendo possível, pedir directamente ao Tribunal que condene a entidade a praticar o acto omitido ou recusado.
Terminou-se com a ficção controversa, erigida em torno de um contencioso de mera anulação, dada a sua exigência da existência de um acto administrativo impugnável para permitir o acesso do particular à justiça.
Era um contencioso em que tudo girava em torno de um acto administrativo, uma concepção “heliocêntrica”, não imune a críticas devido a esta necessidade de ficção da existência de um acto administrativo em situações de pura omissão por parte da Administração.
Esta solução propugnada pelo CPTA, é de aplaudir, pois consegue uma conjugação quase perfeita, isto porque a nosso ver todos os modelos são falíveis, tanto subjectivistas como objectivistas.
Foi o fim anunciado, dum objectivismo, diferente do rumo escolhido pela Alemanha, onde a lei processual seguiu um rumo subjectivista, sendo uma inspiração para o legislador nacional.
A nosso entender a valoração negativa do silêncio, foi definitivamente arredada por força da entrada em vigor da nova lei processual administrativa e da consagração da figura da acção administrativa especial para a condenação à prática do acto devido – 46º/2 a) e b) e 66º e 67º/ 1 a) CPTA.
Contudo a este propósito, o STA veio considerar que nada impediria que o legislador, em lei especial consagrasse a formação de indeferimento no procedimento gracioso, desde que semelhante desvio das regras comuns se mostre necessário à eficácia e prontidão das decisões a proferir na matéria, ficando garantida a segurança jurídica, a efectividade da tutela e que seja dirigido à obtenção de valores superiores sacrificados.
Carece a nosso ver de crítica, pois bem sendo a ficção de indeferimento na sua génese um instrumento para permitir o acesso dos particulares ao contencioso administrativo, não nos é possível compreender, como é possível a perversão da ratio desta ficção.
Relativamente ao acto tácito positivo, se à primeira vista, o pedido de condenação à prática do acto devido, em caso de omissão ou inércia ilegal por parte da Administração perante um requerimento do particular, revogou o regime dos actos tácitos de indeferimento, há questões que nos cabe analisar.
A primeira questão será saber se a alínea a) do número um do artigo 67º CPTA, será apenas aplicável nos casos a que a lei fazia corresponder o indeferimento tácito, ou se pelo contrário, a possibilidade de condenação da Administração à prática do acto omitido, é aplicável, em geral, a toda e qualquer situação de omissão ou inércia da administração, abrangendo actos negativos e actos tácitos de deferimento, previstos genericamente no artigo 108º CPA e em alguns diplomas avulsos.
Tendo em conta a literalidade do preceito, constata-se que nenhuma distinção é feita entre actos de silêncio negativo ou positivo, sendo que a norma simplesmente estabelece que a condenação à prática do acto devido pode ser pedida quando não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido.
Este indício levar-nos-ia a pensar que o CPTA tratou de igual modo, actos de silêncio negativo e positivo, para este efeito, ainda assim a doutrina considerou que o instituto do deferimento tácito não foi revogado pelo CPTA, pelo que AROSO DE ALMEIDA considera que a lei associa ao decurso de tempo do prazo legal para tomada de decisão a presunção de que a pretensão apresentada pelo requerente foi julgada conforme às exigências postas pelo ordenamento jurídico, sendo que nestes não há lugar à propositura de acção de uma condenação à pratica do acto omitido, pois ao resultar da lei a produção do mesmo, não existe necessidade de qualquer intervenção judicial.
Por outro lado, o indeferimento tácito, ao consistir numa ficção legal, necessária para ultrapassar as barreiras de acesso dos particulares ao contencioso administrativo, considera que a partir do momento em que se deixa de fazer depender o acesso à jurisdição administrativa da existência de um acto administrativo passível de impugnação, deixa de ser necessário ficcionar, em situações de pura inércia ou omissão, a existência de actos administrativo que possam ser objecto de impugnação.
Para AROSO DE ALMEIDA, enquanto o indeferimento tácito representa uma figura de alcance processual, que deixa de ter razão de ser com a entrada em vigor do novo CPTA, o deferimento tácito, constituindo uma figura que a lei atribui o efeito substantivo de se considerar deferida a solicitação de um particular, não seria afectado pelo pedido de condenação à prática do acto devido, já que se permite o efeito que se pretende com esta, sem recurso a tribunal.
Se um dos motivos fundadores deste instituto do acto tácito de deferimento assente na ficção de que o acto cuja prática se requer é conforme a legalidade, este não é o único, fundamento para a criação de tal figura.
Para CARLOS CADILHA, o deferimento tácito corresponde a uma técnica de intervenção de polícia administrativa ou de intervenção tutela que tem em vista evitar consequência desvantajosas que para a esfera jurídica dos particulares podiam resultar da inércia administrativa em relação a certos direitos ou actividades, cujo exercício dependa de um prévio procedimento autorizatório, ao mesmo tempo que força a Administração a dar resposta expressa ao particular, sob pena de se considerar tacitamente deferido um requerimento eventualmente contrário à lei.
Enquanto o indeferimento tácito se destina a por termo a uma situação de indefinição, gerada pela falta de decisão expressa da autoridade administrativa, o acto tácito positivo confere ao particular o direito substantivo correspondente à satisfação da sua pretensão, como forma de evitar prejuízos que resultariam da excessiva demora na resolução do caso, quando a Administração não emita uma decisão expressa no prazo legalmente previsto.
Assim, se a construção dogmática dos efeitos do silêncio administrativo, nas suas vertentes positivas e negativas, representa, uma garantia dos direitos dos particulares, não se pode deixar de ter presente que as razões subjacentes a cada uma das tais vertentes são totalmente diferentes, sendo também distintos os efeitos que do mesmo decorrem.
Só assim é possível admitir e entender a função e valor processual do acto tácito de indeferimento, enquanto forma fundamental de direito a tutela plena e efectiva dos particulares, num contencioso onde a regra de decisão administrativa prévia é essencial, ao invés do que se passa com o acto tácito de deferimento.
Contudo, consideramos o silêncio positivo a demonstração das insuficiências do Direito, pois a lei requer a intervenção, e se o faz é por razões de interesse público, sendo chocante considerar que o decurso de tempo possa produzir efeitos idênticos ao controlo da Administração.
Pois bem, do ponto de vista substantivo o deferimento tácito não é nada mais, que a atribuição de um direito cujo exercício, a lei fazia depender de avaliação da Administração e da qual se prescinde, por falta de actuação dos órgãos administrativos no prazo legalmente estabelecido, pelo que a tutela da legalidade e do interesse público fica fragilizada com este procedimento.
Faz ainda mais sentido em termos em atenção estes factos, quando pensamos quais as áreas prementes na actuação do silencia positivo, nomeadamente, o Urbanismo e o Ambiente, áreas sensíveis, onde a actuação do particular acarreta consequências para bens públicos essenciais, assim como para direitos subjectivos de particulares, que são afectados pelo exercício do direito tacitamente atribuído pela Administração.
Não parece fazer efectivamente muito sentido que, havendo um meio próprio de acção para colmatar a inércia administrativa, seja um imperativo a existência deste silêncio positivo.
Principalmente, não apenas pela existência da possibilidade da condenação da prática do acto devido, mas também pela possibilidade de antecipação de condenação em sede de processo cautelar, nos termos do artigo 112º CPTA, argumento esse que é facilmente apreensível pelo motivo da existência do silêncio positivo, pelo que se insiste na lógica de que o particular requerente da aprovação ou autorização não seja prejudicado pela demora da Administração na resolução do seu pedido, num contexto em que não é possível recorrer aos tribunais para ultrapassar esse atraso de forma efectiva.
Pelo que a criação da tutela cautelar de requerer uma condenação da Administração a autorizar ou aprovar provisoriamente a pretensão deduzida, permite obter provisoriamente a licença ou aprovação solicitada, até que o processo principal se resolva, não fazendo sentido por isso que esta figura continue a existir dadas as circunstâncias.
É desprovido de sentido que funcione de forma cega, sem qualquer tipo de ponderação casuística, sobretudo em áreas tão sensíveis, havendo a possibilidade de nos termos do artigo 120º/1 c) CPTA no âmbito do processo cautelar, a apreciação do mérito do pedido do particular em causa – fumus bonus iuris, e ainda uma ponderação dos interesses públicos e privados nos termos do artigo 120º/2 CPTA.
Cabe fazer contudo uma ressalva, em termos condenatórios o particular ganha uma pronúncia da Administração em caso de silêncio, contudo isso não significa que lhe seja concedida a sua pretensão, ou seja a Administração no âmbito da acção de condenação é instada a decidir expressamente, quer seja pela negativa ou pela positiva, será essa declaração a que o particular terá direito.
Faria muito mais sentido que se utilizassem os meios cautelares, pois levaria a uma solução que permitiria ao particular requerente, interessado em obter o mais rapidamente possível a autorização ou aprovação em causa e aos afectados pelo deferimento da pretensão do particular, interessados em fazer valer a sua posição e obstar à satisfação do pedido apresentado por aquele.
Contudo é evidente que o CPTA, não revogou a figura do deferimento tácito, diferente do que julgamos ter sucedido ao indeferimento tácito.
Consideramos ainda que para se efectivar o desaparecimento do deferimento tácito não deverá ser fruto duma pura e simples das normas que este se encontra previsto, mas antes corresponder a uma revisão profunda e global dos regimes em que se integra.
E a nosso ver essa revisão passaria pela criação de uma figura idêntica à existente no direito italiano, nomeadamente, o silenzo-rifiuto, de modo a que o dever legal de decisão não se extinga pelo decurso de tempo, permitindo o particular decorrido um determinado prazo, recorrer a tribunal e como sanção para a Administração, criar-se legalmente uma mecanismo que criasse uma obrigação de fundamentação pela sua inércia, para além da não extinção do dever legal de decisão.
Deferimento tácito no Direito do Ambiente
Agora passemos à análise em particular deste fenómeno, nomeadamente, no Direito do Ambiente.
Decidimos particularizar um diploma, em que a figura tem um papel particularmente duvidoso e até paradoxal.
Comecemos então por analisar o Decreto-Lei 69/2000, relativo à Avaliação de Impacte Ambiental.
Ora, a AIA corresponde a um instrumento privilegiado de concretização do princípio da prevenção, sendo definida por PAULO PINHO como o processo concebido para garantir, no fundamental, que impactes ambientais significativos sejam satisfatoriamente caracterizados e tomados em consideração no planeamento, dimensionamento e licenciamento de um conjunto relevante de projectos ou acções que, pela sua natureza, dimensão ou localização, são susceptíveis de gerarem consequências nefastas sobre o meio ambiente. Trata-se de um procedimento de apoio à decisão baseado na elaboração de um Estudo de Impacte Ambiental e na condução obrigatória de um processo formalizado de consulta pública.
Assim, trata-se de um procedimento prévio à decisão autorizativa ou licenciadora de projectos susceptíveis de impacto ambiental significativos, tendo como objectivo fornecer à entidade decisória, as informações necessárias para esta ponderar os possíveis efeitos ambientais.
Cabe então analisar quais os projectos sujeitos a AIA.
Nos termos do artigo 1º/3 DL 68/2000, estão sujeitos a AIA os projectos que correspondem aos tipificados neste número, contudo, tendo em conta os números 4 e 5 deste mesmo artigo, estarão sujeitos em moldes casuísticos os projectos referidos.
Este DL 68/2000 prevê ainda uma dispensa do procedimento de AIA, podendo ser total, ou parcial, o que pode ocorrer em circunstâncias excepcionais, nos termos do artigo 3º/1 do mesmo diploma. A nosso ver, tendo em conta que este conceito carece de concretização, pois não é previsto no mesmo diploma, é criticável na medida em que aumenta a discricionariedade nestes casos.
Centremo-nos agora na Declaração de Impacte Ambiental (DIA), por se revelar de extrema importância para o nosso estudo.
Para o Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, a DIA corresponde a um acto administrativo recorrível, que se insere numa relação jurídica administrativa duradoura, e que resulta de um procedimento faseado, no âmbito dos quais ele constitui simultaneamente condição de existência e de determinação do conteúdo de outro acto administrativo posterior.
Pode a DIA ser qual pode ser favorável, condicionalmente favorável ou desfavorável, nos termos do artigo 17º do DL 69/2000.
Fazendo agora a “ponte” para o deferimento tácito, este diploma, dedica um artigo ao instituto objecto do nosso estudo, nomeadamente, o artigo 19º.
Considerando-se, deferida a pretensão do particular, caso passe o prazo para a decisão sem que ela tenha sido comunicada à entidade licenciadora ou competente para a autorização.
A nosso ver, isto representa uma contradição e perversão do próprio regime de avaliação de impacte ambiental. Se se trata de um procedimento essencialmente pensado, para analisar os potenciais perigos para o Ambiente, estranho é que depois se venha permitir ao particular o deferimento da sua pretensão, em sequência do silêncio da Administração no âmbito da apreciação das potenciais consequências ambientais, procedimento considerado tão importante pelo legislador, tendemos por isso a concordar com VASCO PEREIRA DA SILVA.
Segundo VASCO PEREIRA DA SILVA, esta ficção legal de um acto administrativo, representa uma má solução, pois se a finalidade da avaliação ambiental é a de autonomizar a apreciação das consequências ecológicas de uma decisão, no quadro de um procedimento especial, para que a autoridade licenciadora tome uma decisão mais adequada, em razão também da dimensão ambiental dos projectos, não faz sentido que o legislador permita que o silêncio equivalha ao deferimento.
Considera ainda, é preciso ter presente que o deferimento tácito do acto de avaliação não significa a aprovação do pedido de licenciamento do projecto. E que não tendo havido acto de avaliação isso significa que ainda não foi avaliada nem ponderada a dimensão ambiental da actividade proposta, pelo que tal juízo deve ser obrigatoriamente realizado, tanto através da licença ambiental quando ela ainda deva ter lugar, como pela entidade competente para o licenciamento ou autorização do projecto, sob pena de nulidade.
E é precisamente neste ponto que discordamos, pois VASCO PEREIRA DA SILVA, considera que através de interpretação conforme à CRP, do disposto no artigo 20º/3 DL 69/2000, por violação ao princípio da prevenção, o desvalor seria a nulidade, mas que também chegaríamos à nulidade por via do disposto no artigo 133º g) CPA, por se tratar de uma ilegalidade de tal maneira grave, que o conteúdo do acto em causa seria legalmente impossível, sendo que o vício seria o mesmo por se tratar também de ofensa ao conteúdo a um direito fundamental, nomeadamente o Ambiente.
Ora, a nosso ver, a discussão sobre a nulidade ou anulabilidade de um deferimento tácito, só faz verdadeiramente sentido em termos práticos quando se esgotam os prazos para invocação da anulabilidade.
Mas em moldes meramente académicos, consideramos, salvo o devido respeito pelo Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, que não chegamos à nulidade do acto administrativo em causa, nem por via do princípio da prevenção, nem por se tratar de um acto cujo objecto é legalmente impossível e muito menos por ofensa ao conteúdo de um direito fundamental, o suposto direito fundamental ao Ambiente.
A questão subjacente ao problema analisado, é a de saber se a actividade em causa é potencialmente perigosa para o Ambiente, pois sabemos que o legislador em determinados casos fixou quais seriam, noutros seria analisado caso a caso. Mas se essa avaliação não se fez, será impossível saber, se no caso concreto constitui um perigo real para o Ambiente ou não.
Ora, cominar com a nulidade os actos produzidos através de deferimento tácito, seria retirar-lhe efeito útil, será até uma forma de ultrapassar a sua consagração legal, pelo que ainda que critiquemos a figura, não nos parece adequada a nulidade como sanção.
Quanto à nulidade por via da ofensa ao conteúdo de um direito fundamental, discordamos, apesar de a compreendermos, pois bem a concepção unitária de direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos, propugnada pelo Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, era face ao antigo Contencioso uma verdadeira preciosidade, pois permitia o acesso em termos contenciosos aos particulares, contudo apesar de entendermos o esforço nesse sentido, consideramos, salvo o devido respeito, que é neste momento desprovida de utilidade.
Mais, o suposto direito ao ambiente é a nosso ver um interesse difuso, pois representa um interesse relativo à comunidade globalmente considerada, ou a um grupo indeterminado de cidadãos, que se expressa através da relação a um certo bem jurídico – o ambiente - podendo ser encabeçado por qualquer pessoa ou entidades mencionadas no artigo 9º/2 do CPTA, mediante a denominada acção popular.
Seguimos na integralidade a posição de CARLA AMADO GOMES, não se tratando aqui verdadeiramente de um direito a uma prestação ambiental, mas tão somente de um interesse no aproveitamento individual de um bem de dimensão comunitária, cuja violação é susceptível de avaliação jurisdicional através de um mecanismo de extensão de legitimidade pessoal encarnado na acção popular, concluindo pelo dever fundamental ao ambiente.
Tendo em conta o que anteriormente foi dito, concluímos ainda assim que um deferimento em violação dos princípios ambientais, são susceptíveis a nosso ver de anulabilidade, nos termos do artigo 135º CPA.
Deixamos então a nossa crítica de um dos efeitos perversos, do deferimento tácito no Direito ao Ambiente, embora não concordemos com os efeitos da figura em geral, consideramos que o regime devia ser globalmente revisto e a solução deveria passar, como dissemos anteriormente, pela criação de um dever de fundamentação decorrido o prazo legal de decisão e consagrar a perpetuação do dever legal de decisão, em termos idênticos à figura do silenzo-rifiuto, existente no ordenamento jurídico italiano.
Concluímos, esta nossa longa caminhada, tentado esclarecer a nossa concepção acerca da existência da figura, pretendíamos, acima de tudo, suscitar as grandes questões, indicar um caminho, através de uma crítica pessoal.
Consideramos que esta figura não deve ser instrumentalizada pelo legislador, de forma a chegarmos a resultados tão perversos, totalmente desenquadrados com o fundamento da criação deste instituto.
Ainda que se pretenda uma simplificação do processo autorizativo ou licenciador, não será, com certeza, este o caminho a adoptar.
Defendemos que a Administração também não se pode “barricar”, na sua burocracia, impedindo os particulares de verem deferidos os seus pedidos, mas por outro lado não será de todo um bom caminho deixar que a Administração se demita das suas valorações e considerações, quando obrigada pela lei, a favor da salvaguarda dos interesses dos particulares, sendo que por isso mesmo, a nosso ver existe a necessidade de rever o regime do deferimento, de modo a existir um ponto de equilíbrio, nos vários interesses em jogo.
Terminamos com uma citação de Máximo Gorki – “Tudo o que é sábio é simples é claro.”
Artur Silva
Subturma 11
14402
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