E mais uma vez o Deferimento Tácito

Retomamos o estudo acerca do Deferimento Tácito, no Direito ao Ambiente.
Assim, decidimos prosseguir a nossa “viagem” por outro diploma interessante no âmbito deste estudo.
Trata-se do D.L. 178/2006, relativo à gestão de resíduos.
Explicitaremos um em particular, por se tratar da decisão final deste procedimento em causa. Neste caso, encontramos mais um “deslize” do legislador, lançando a confusão, confundindo um deferimento tácito e fundindo uma notificação, com um possível recurso do particular à acção de condenação à prática do acto devido.
Ora, nos termos do artigo 31º/1 do referido diploma, a Administração terá, em condições normais, 10 dias para proferir uma decisão a contar da realização da referida vistoria.
Coloca-se a questão de saber, o que sucede decorrido este prazo?
Dispõe o artigo 31º/5, que pode o particular recorrer ao exercício dos meios de garantia jurisdicional ao seu dispor (acção de condenação), mas que contudo ainda assim concede-se ao particular a faculdade de notificar a Administração (brilhante!), tendo esta 8 dias para se pronunciar após recepção da respectiva notificação, sob pena da produção do deferimento tácito da decisão.
Perante este cenário, colocam-se-nos várias questões, nomeadamente:
- Pode, neste contexto, o particular agir contenciosamente?
- Ainda que a parte inicial do artigo 30º/5 que o possa, existe neste caso verdadeiramente interesse processual no âmbito de uma acção de condenação?
- Será esta suposta notificação do particular um verdadeiro requerimento?
Perante estas questões, iremos ocupar-nos de as tentar solucionar no âmbito deste estudo.
Começaremos por analisar a acção de condenação à prática do acto devido.
A acção administrativa especial, no seu subtipo acção à condenação à prática do acto devido, está prevista no artigo 66º CPTA, tendo como objectivo a condenação da Administração à prática do acto administrativo devido, ou seja o acto ilegalmente omitido ou recusado.
Esta acção inspirada na acção condenatória alemã – Verpflichtungsklage – traduz-se numa imposição de um determinado dever da Administração de realizar uma prestação de facto, um determinado acto administrativo, o acto que devesse ser praticado no caso concreto.
Cabe esclarecer que a condenação tanto se poderá concretizar na imposição de emanação de um acto de conteúdo determinado, como na imposição do dever de praticar um acto que decida a questão colocada pelo particular, independentemente do órgão administrativo se decida pelo indeferimento ou deferimento da sua pretensão.
Ora, o “convite a agir” é pressuposto desta acção, nos termos do artigo 67º/1 a), pelo que neste caso se preenche pelo mero facto de ter ocorrido uma situação de inércia administrativa perante a pretensão formulada por um particular, sendo uma forma de reacção contra a violação do dever legal de decidir.
Contudo, o reconhecimento jurisdicional do direito de acção à emissão do acto devido depende de um juízo sobre a existência do dever legal de decisão, nos quais são relevantes não só os critérios legais expressos no artigo 9º CPA, mas também a verificação do decurso do prazo dentro do qual caberia à Administração pronunciar-se.
Assim, parece que em concreto, só após a notificação do particular, teria decorrido o prazo de pronúncia da Administração, ou seja neste caso decorrido 10 dias.
Não se operando a excepção do princípio da decisão ínsito no artigo 9º/2 CPA, seria possível após estes 10 dias recorrer à acção de condenação à prática do acto devido.
Resta-nos saber se esta notificação poderá ser considerada um requerimento?
Nos termos do artigo 74ºCPA, deve este conter os elementos constantes nas alíneas do número um do mesmo artigo.
Consideramos que desde que, contenha estes elementos, efectivamente poderá a notificação consubstanciar um requerimento.
Ainda assim, notificação prevista na lei, é a prevista nos artigos 66 e ss CPA, mas esta notificação trata-se de uma notificação da Administração aos particulares, pelo que é estranho que a lei exija aos particulares, esta mesma.
Tendo em conta o exposto, tendemos a concluir que esta notificação, mais não é do que uma forma de tornar efectiva a verificação do decurso do prazo ao qual caberia à Administração pronunciar-se.
Em suma, a nosso ver, a ressalva do artigo 31º do diploma em análise, só diz respeito ao período, decorrido os 10 dias, nos 8 dias subsequentes à notificação, será nesses dias até à produção do Deferimento Tácito, que o particular pode aceder à acção de condenação á prática do acto devido.

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