Em baixo ficam dedicadas algumas linhas ao tema dos princípios ambientais, com relevo para o princípio da precaução, começando primeiramente pela sua enumeração, seguindo-se um breve desenvolvimento sobre cada um dos mesmos,
Os princípios ambientais têm como escopo fundamental proteger o meio ambiente e, desta forma, garantir melhor qualidade de vida a toda a colectividade.
O Direito do Ambiente deve, então, obedecer, na aplicação das suas normas, a princípios essenciais dos quais se destacam: a Precaução, o Desenvolvimento Sustentável, o Aproveitamento Racional dos Recursos Naturais e o Poluidor-Pagador.
Não obstante a importância de todos os princípios elencados, é de destacar que o princípio da precaução é o principal norteador das políticas ambientais, na medida em que se reporta à função primordial de evitar os riscos e a ocorrência de danos no meio ambiente; ele é a garantia contra os riscos potenciais que, de acordo com o estado actual do conhecimento, não podem ser ainda identificados. A precaução funciona com o objectivo da busca do risco zero, afirmando que na ausência da certeza científica formal, a existência de um risco de um dano sério ou irreversível requer a implementação de medidas que possam prever o mesmo.
É pacífico entre a doutrina que o princípio da precaução é o principal orientador das políticas ambientais, além de ser a base para a estruturação do Direito Ambiental. Na verdade, dada a crescente e visível degradação e devastação a que assistimos do meio ambiente, o princípio da precaução assume contornos cada vez mais relevantes no seio da crise ambiental, competindo quer ao Estado quer à sociedade tomar medidas que num primeiro momento impeça o início de ocorrência de actividades potencialmente lesivas ao ambiente.
É pressuposto do princípio da precaução a certeza científica? Não. Ainda que não haja certeza científica é necessário tomar determinadas medidas no sentido de intervir. A Administração deve proibir, restringir, exigir estudos se existe mero risco; no fundo, só assim se cumprirá o princípio da precaução.
Fundamental se torna, pois, perceber que não é necessária a prova de uma relação causal entre a actuação humana e o dano para o ambiente, bastando-se o princípio da precaução com a existência de um risco para a actuação pública.
Há inclusivamente quem defenda a concretização do “in dubio para o ambiente”, no sentido em que na ausência de certeza científica, mas havendo uma probabilidade deve se decidir a favor do ambiente.
Porém, a partir do momento em que abandonamos a certeza científica deparamo-nos com um problema de fundo que é no da falta de legitimidade na intervenção, o qual culmina com limitações a direitos fundamentais como a livre iniciativa económica e a propriedade privada; pelo que, devemos concluir que a precaução não pode encorpar um radicalismo tal, que a torne imbatível num confronto com outros quaisquer direitos, caminhando-se antes na direcção de uma homogeneização de interesses.
Em suma, presente no princípio da precaução está subjacente a ideia da bondade em tudo o que é natural e os enormes perigos de tudo o que provêm da acção humana, o artificial e tecnológico. Todavia, a aplicação do princípio da precaução com a finalidade de alcançar um risco zero para uma dada comunidade ou para um dado nicho ecológico numa certa época, sem atender aos seus impactos globais, pode revelar-se muito perniciosa. Veja-se, rapidamente, um exemplo:
Muitos são defensores da abolição de substâncias como o cloro porque pode prejudicar a vida selvagem; na essência fruto de alguns efeitos adversos verificados quando o cloro é aplicado em altas doses em experiências com animais. Ora, há riscos conhecidos do uso regular do cloro na desinfecção das águas, mesmo em águas de piscinas? Nenhuns, afora alguma irritação nos olhos! E, quais os prejuízos se se abolir o cloro na desinfecção das águas de abastecimento público? Um custo social enorme, com gastroenterites, pestes e milhares de mortes causadas por difteria, febre tiróide, cólera, etc.
Nunca se poderá, pois, tomar uma visão demasiado reducionista e unilateral, havendo sempre que ponderar os prós e contras e fazer um balanço de custos/benefícios das medidas intervencionistas.
Com esta ideia de ponderação de prós e contras está intimamente ligado o segundo dos princípios enumerados – o desenvolvimento sustentável -, o qual surge na ordem jurídica internacional, através da Declaração de Estocolmo de 1972 e da Carta da Natureza de 1982.
O conceito de Desenvolvimento Sustentável é, normalmente, definido como o desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração actual sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades; significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e económico e de realização humana e cultural, fazendo ao mesmo tempo um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os habitats naturais. O desenvolvimento sustentável chega até a ser, por alguns, encarado como um “princípio da proporcionalidade pintado de verde”!
Inicialmente, o desenvolvimento sustentável tinha um alcance de natureza meramente económica, visando uma chamada de atenção para a necessidade de conciliação da preservação do meio ambiente com o desenvolvimento socioeconómico. Presentemente, ele consagra-se como princípio constitucional no artigo 66º/2 b) CRP, estabelecendo uma exigência de ponderação das consequências para o meio ambiente de qualquer decisão jurídica de natureza económica, tomada por poderes públicos e postulando a sua invalidade, no caso dos custos ambientais inerentes à sua efectivação serem incomparavelmente superiores aos respectivos benefícios económicos, pondo em causa a sustentabilidade dessa medida de desenvolvimento.
Sumariamente o que deve suceder é que, aquando de qualquer decisão jurídica cujo fim último é o desenvolvimento económico, a mesma deve ter por base uma fundamentação ecológica.
Em terceiro lugar na enumeração acima dos princípios que enformam o Direito do Ambiente surge-nos o princípio do aproveitamento racional dos recursos disponíveis.
Na sua essência, o princípio do aproveitamento racional dos recursos disponíveis era, à semelhança do princípio do desenvolvimento sustentável, de natureza sobretudo económica. Hoje, porém, ele tem um alcance constitucional no artigo 66º/2 d) CRP, sendo o seu principal escopo o alerta para a escassez dos recursos naturais, proibindo a tomada de decisões públicas que conduzam ao esbanjamento ou à delapidação dos bens ambientais e obrigando, consequentemente, a Administração Pública a adoptar critérios de eficiência ambiental na tomada de quaisquer decisões.
Por último, mas não de somenos importância, surge-nos o princípio do poluidor-pagador, o qual tem a sua origem no quadro da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), adquirindo posteriormente consagração comunitária, através do Acto Único Europeu (174º/2 TCE). Na ordem jurídica interna o princípio do poluidor-pagador vem postulado no artigo 66º/2 h), o qual impõe ao Estado a tarefa de “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida”.
O princípio do poluidor-pagador decorre da consideração de que os sujeitos económicos, que são beneficiários de uma determinada actividade poluente devem igualmente ser responsabilizados, pela via fiscal, no sentido da compensação dos prejuízos que resultam para toda a comunidade dessa actividade, da qual, de resto, são retirados benefícios lucrativos.
A compensação financeira que se tem defendido como consequência da aplicação deste princípio não deve apenas referir-se aos prejuízos efectivamente causados, devendo antes considerar também os custos de reconstituição da situação, assim como as medidas de prevenção que é necessário levar a cabo para impedir ou minimizar similares comportamentos de risco para o ambiente.
A título de conclusão aproveito para deixar uma questão, sem me alongar demasiado sobre o tema: será que todos estes princípios ambientais não culminam com um Direito Fundamental ao Ambiente, o qual se incluirá numa 3ª geração de Direitos Fundamentais, consubstanciando-se num direito de fruição do Ambiente? No caso de uma resposta positiva não será sta a melhor forma de tutelar os recursos naturais?
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