Jus aedificandi e planeamento
No âmbito do direito do ambiente surgem uma multiplicidade de interesses em presença que devem ser ponderados aquando a tomada de decisões, daí que possamos falar de relações jurídicas ambientais multilaterais.
O direito de propriedade privada, análogo aos direitos, liberdades e garantias, e regulado no art. 62.º da Constituição da República Portuguesa, deve ser tido em conta em todo o procedimento ambiental. A sua importância é decisiva sobretudo no que diz respeito à definição do destino e formas de utilização do solo, visto condicionar a liberdade de conformação dos planos e influenciar significativamente o seu conteúdo. Note-se que tal não significa que o proprietário do solo possa pretender que o seu interesse prevaleça face a interesses públicos, o facto de ter este direito de propriedade apenas lhe confere o direito de exigir que o seu “interesse” seja tomado em consideração.
Assim sendo e no entendimento de GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, a fórmula «nos termos da Constituição», adoptada no n.º 1 do citado artigo 62.º, não é supérflua, pretendendo significar que «o direito de propriedade não é garantido em termos absolutos, mas sim dentro dos limites e nos termos previstos e definidos noutros lugares da Constituição». Esta ideia de limitação vem também plasmada nos artigos do Código Civil que regulam esta matéria (1305.º + 1344.º). No entanto, tratando-se de um direito fundamental, as limitações legais ao direito de propriedade privada não podem diminuir a extensão e o alcance do seu conteúdo essencial, sob cominação de inconstitucionalidade (n.º 3 do artigo 18.º da Constituição).Estes limites vão ter particular relevo no que respeita à liberdade de uso e fruição do solo, sendo particularmente intensos no domínio urbanístico e do ordenamento do território. Coloca-se assim a questão de saber se o direito de propriedade inclui o direito de construir (jus aedificandi) ou se este radica antes no acto administrativo autorizativo.
A doutrina portuguesa tem-se dividido sobre a natureza jurídica do jus aedificandi e as suas relações com os planos urbanísticos, podendo distinguir-se duas teses: por um lado, uma predominantemente privatística, que é a que vê o jus aedificandi como parte integrante do direito de propriedade privada do solo, invocado o regime do Código Civil; por outro lado, uma tese caracterizada como publicística que recusa que o jus aedificandi seja uma faculdade inserida no conteúdo do direito de propriedade privada, entendendo que se trata de poder que se constitui por força de acto da Administração Pública. O direito de construir nasce no momento do acto de planificação urbanística, mas já se constitui apenas no momento do acto de aprovação dos projectos de obras e da licença de construção, que é uma autorização constitutiva de direitos, em todas as restantes eventualidades.
Assim sendo e como a jurisprudência já entendeu, não há um direito ou liberdade constitucionais de construir o que se quiser, como se quiser e onde se quiser, pelo simples facto de se ser proprietário de um terreno.
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