No art.174.º/1 do Tratado de Roma resulta uma noção ampla de ambiente, que compreende a preservação e promoção da qualidade de bens ambientais naturais. Do art. 175.º/2 decorre também uma compreensão alargada, traduzida na referência a “medidas alargadas ao ordenamento do território, à afectação dos solos, com excepção da gestão dos lixos e das medidas de carácter geral, e à gestão dos recursos hídricos”. A ofensa à integridade de qualquer destes bens fundamentais para a existência e qualidade das populações deve ser assegurada por vias jurisdicionais, pois de acordo com o princípio da tutela jurisdicional efectiva, a todo o direito deve corresponder uma acção.
A lesão de qualquer bem ambiental natural, sito ou habitante de territórios sob jurisdição de algum Estado-membro, não passa pela alegação de um prejuízo directo e individualizado na esfera jurídica pessoal, mas antes configura uma lesão de um interesse colectivo, cuja tutela processual tem forçosamente que operar de forma refractária.
No âmbito da União Europeia a impugnação jurisdicional de actos comunitários susceptíveis de provocar efeitos ambientais nocivos só pode dar-se por uma de duas vias: através da legitimidade institucional das entidades referidas no art.230.º/2, ou através da legitimidade singular, de forma imediata e nos apertados limites fixados pela jurisprudência comunitária a respeito do art.230.º/4.
A acção de anulação está regulada no art.230.º do Tratado de Roma. É através da acção de anulação que o particular, sendo pessoa singular ou colectiva, pode atacar qualquer acto que lhe diga directa e individualmente respeito, seja-lhe a ele dirigido ou a outrem, quer revista a forma de decisão, quer de regulamento.
A intervenção comunitária em sede ambiental tem-se feito através de directivas. As directivas parecem estar isentas do âmbito da acção de anulação promovida por particulares, pois têm como destinatários os Estados-membros. No entanto, a doutrina aponta situações em que o Tribunal de Justiça, tendo embora negado a admissibilidade de pedidos de anulação de disposições de directivas, implicitamente acolheu essa possibilidade, quer tratando-se de decisões “mascaradas” de directivas, quer tratando-se de normas dotadas de efeito directo cujas clareza, precisão e incondicionalidade impliquem obrigações ou diminuição do âmbito de directivas para o particular.
A acção de anulação poderia revelar-se importante em casos de dano ecológico colateral, ou seja, que resulte indirectamente da adopção de um regulamento ou de uma decisão. Mas, surge o problema de se saber como pode ser requerida a anulação de um acto que provoca danos num bem de fruição colectiva, difundindo-se os efeitos lesivos por todos aqueles que usufruem das suas qualidades imateriais, não afectando directamente e individualmente ninguém.
No acórdão Plaumann, o Tribunal de Justiça, pela primeira vez, definiu a afectação individual e directa através de actos com natureza normativa como aquela que “atinge a pessoa em função de certas qualidades que lhe são impostas ou de uma situação de facto que a individualiza relativamente a qualquer outra pessoa, nos mesmos termos em que o seria se fosse destinatário do acto”.
O ambiente sendo um bem colectivo, de utilidades individualmente inapropriáveis, a legitimidade individual é demasiado curta para cobrir a sua defesa, procedimental ou jurisdicional. A tutela ambiental proprio sensu pode ser desenvolvida por associações cujo objecto seja a prevenção de danos ecológicos e a promoção da “causa ambiental”. Quaisquer iniciativas baseadas em alegados “direitos ao ambiente” não passam de acções em defesa de direitos subjectivos, individuais, cuja lesão é sofrida “directa e individualmente” pelo seu titular.
O Acórdão Greenpeace decidiu um recurso interposto de um despacho de inadmissibilidade do Tribunal de Primeira Instância sobre uma acção de anulação proposta por uma coligação de associações ambientais e de particulares contra uma decisão da Comissão atributiva de um financiamento comunitário para a construção de duas centrais eléctricas nas Ilhas Canárias. O Tribunal de Justiça confirmou o julgado, arredando a hipótese de os autores contestarem a medida em causa, em virtude da ausência de interesse directo e individual, conforme exigido no art.230.º/4.
O facto de a decisão ser susceptível de afectar, indiscriminadamente, toda a população das Ilhas Canárias, torna-se impermeável à invocação de um qualquer interesse especial por algum ou alguns cidadãos, impedindo a caracterização de uma lesão, ou ausência de vantagem, directa e individualizada.
O acto objecto do pedido de anulação tem de lesar directamente interesses individualizados e indirectamente tem de afectar a integridade e a qualidade de bens ambientais naturais. No entanto, não é impossível que uma ou várias pessoas afectadas, que constituem um “círculo fechado”, o sejam de maneira particular e se distinguem, por isso, de qualquer outra pessoa, individualizando-se, como consta do art.230.º/4.
Quanto à legitimidade processual das associações de defesa do ambiente, elas devem ser consideradas partes legítimas quando os seus objectivos sejam principalmente os da protecção do ambiente e um ou vários membros da organização forem individualmente afectados pelo acto comunitário impugnado, mas também, de modo autónomo, quando, tendo como objectivo principal a protecção do ambiente, demonstrarem ter um interesse específico na questão em discussão.
O Acórdão Greenpeace tem o mérito de alertar para um vazio de protecção jurídica no âmbito comunitário no que toca a interesses colectivos, insusceptíveis de acolhimento, quer na letra, quer no espírito do art.230.º/4. Este artigo foi pensado para veicular a defesa contra violações de situações subjectivas individualizadas, independentemente da sua forma, ficando de fora a lesão de um bem de fruição colectiva.
Bibliografia: - Carla Amado Gomes, Textos Dispersos de Direito do Ambiente
Carla Lourenço, Subturma 2, N.º14967
A lesão de qualquer bem ambiental natural, sito ou habitante de territórios sob jurisdição de algum Estado-membro, não passa pela alegação de um prejuízo directo e individualizado na esfera jurídica pessoal, mas antes configura uma lesão de um interesse colectivo, cuja tutela processual tem forçosamente que operar de forma refractária.
No âmbito da União Europeia a impugnação jurisdicional de actos comunitários susceptíveis de provocar efeitos ambientais nocivos só pode dar-se por uma de duas vias: através da legitimidade institucional das entidades referidas no art.230.º/2, ou através da legitimidade singular, de forma imediata e nos apertados limites fixados pela jurisprudência comunitária a respeito do art.230.º/4.
A acção de anulação está regulada no art.230.º do Tratado de Roma. É através da acção de anulação que o particular, sendo pessoa singular ou colectiva, pode atacar qualquer acto que lhe diga directa e individualmente respeito, seja-lhe a ele dirigido ou a outrem, quer revista a forma de decisão, quer de regulamento.
A intervenção comunitária em sede ambiental tem-se feito através de directivas. As directivas parecem estar isentas do âmbito da acção de anulação promovida por particulares, pois têm como destinatários os Estados-membros. No entanto, a doutrina aponta situações em que o Tribunal de Justiça, tendo embora negado a admissibilidade de pedidos de anulação de disposições de directivas, implicitamente acolheu essa possibilidade, quer tratando-se de decisões “mascaradas” de directivas, quer tratando-se de normas dotadas de efeito directo cujas clareza, precisão e incondicionalidade impliquem obrigações ou diminuição do âmbito de directivas para o particular.
A acção de anulação poderia revelar-se importante em casos de dano ecológico colateral, ou seja, que resulte indirectamente da adopção de um regulamento ou de uma decisão. Mas, surge o problema de se saber como pode ser requerida a anulação de um acto que provoca danos num bem de fruição colectiva, difundindo-se os efeitos lesivos por todos aqueles que usufruem das suas qualidades imateriais, não afectando directamente e individualmente ninguém.
No acórdão Plaumann, o Tribunal de Justiça, pela primeira vez, definiu a afectação individual e directa através de actos com natureza normativa como aquela que “atinge a pessoa em função de certas qualidades que lhe são impostas ou de uma situação de facto que a individualiza relativamente a qualquer outra pessoa, nos mesmos termos em que o seria se fosse destinatário do acto”.
O ambiente sendo um bem colectivo, de utilidades individualmente inapropriáveis, a legitimidade individual é demasiado curta para cobrir a sua defesa, procedimental ou jurisdicional. A tutela ambiental proprio sensu pode ser desenvolvida por associações cujo objecto seja a prevenção de danos ecológicos e a promoção da “causa ambiental”. Quaisquer iniciativas baseadas em alegados “direitos ao ambiente” não passam de acções em defesa de direitos subjectivos, individuais, cuja lesão é sofrida “directa e individualmente” pelo seu titular.
O Acórdão Greenpeace decidiu um recurso interposto de um despacho de inadmissibilidade do Tribunal de Primeira Instância sobre uma acção de anulação proposta por uma coligação de associações ambientais e de particulares contra uma decisão da Comissão atributiva de um financiamento comunitário para a construção de duas centrais eléctricas nas Ilhas Canárias. O Tribunal de Justiça confirmou o julgado, arredando a hipótese de os autores contestarem a medida em causa, em virtude da ausência de interesse directo e individual, conforme exigido no art.230.º/4.
O facto de a decisão ser susceptível de afectar, indiscriminadamente, toda a população das Ilhas Canárias, torna-se impermeável à invocação de um qualquer interesse especial por algum ou alguns cidadãos, impedindo a caracterização de uma lesão, ou ausência de vantagem, directa e individualizada.
O acto objecto do pedido de anulação tem de lesar directamente interesses individualizados e indirectamente tem de afectar a integridade e a qualidade de bens ambientais naturais. No entanto, não é impossível que uma ou várias pessoas afectadas, que constituem um “círculo fechado”, o sejam de maneira particular e se distinguem, por isso, de qualquer outra pessoa, individualizando-se, como consta do art.230.º/4.
Quanto à legitimidade processual das associações de defesa do ambiente, elas devem ser consideradas partes legítimas quando os seus objectivos sejam principalmente os da protecção do ambiente e um ou vários membros da organização forem individualmente afectados pelo acto comunitário impugnado, mas também, de modo autónomo, quando, tendo como objectivo principal a protecção do ambiente, demonstrarem ter um interesse específico na questão em discussão.
O Acórdão Greenpeace tem o mérito de alertar para um vazio de protecção jurídica no âmbito comunitário no que toca a interesses colectivos, insusceptíveis de acolhimento, quer na letra, quer no espírito do art.230.º/4. Este artigo foi pensado para veicular a defesa contra violações de situações subjectivas individualizadas, independentemente da sua forma, ficando de fora a lesão de um bem de fruição colectiva.
Bibliografia: - Carla Amado Gomes, Textos Dispersos de Direito do Ambiente
Carla Lourenço, Subturma 2, N.º14967
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