É o “pai” da Reserva Ecológica Nacional (REN), que conseguiu aprovar, há quase duas décadas e meia, quando foi ministro da Qualidade de Vida.
As cheias de Fevereiro na Grande Lisboa surpreenderam-no?
Nada, absolutamente nada. E vão repetir-se, porque se tem aumentado a impermeabilização devido ao excesso de construção e continua a fazer-se más obras que impedem a circulação da água. E não se diga que a culpa é da intensidade das chuvas ou das alterações climáticas. Mesmo que assim fosse, é urgente adaptarmo-nos. As cheias são o resultado de erros de urbanismo. Não se pode continuar a cometer erros de planeamento e as autarquias têm de aplicar Planos Verdes. Alguns estão feitos, como em Loures, Sintra e Seixal, mas continuam na gaveta. E em Lisboa estou à espera de que a autarquia aprove medidas cautelares para que possa ser aplicado.
As constantes inundações em Alcântara são inevitáveis?
Não. A autarquia tem um projecto, da minha autoria e do Instituto Superior Técnico, para solucionar o problema, que consiste e destruir o caneiro, renaturalizando a ribeira de Alcântara desde a Amadora e construindo duas pequenas barragens de retenção e recepção. Assim se conseguiria amortecer os caudais mais intensos. Isso deveria ser feito noutras zonas da Grande Lisboa, como no Vale do Jamor. Mas há anos que está na gaveta.
Quatro anos depois das mortíferas cheias de 1967, disse na RTP que a culpa dessa catástrofe era, e cito, “ a falta de planeamento, a inépcia, a ignorância e a incompetência”. E agora?
É a mesma coisa. Talvez pior ainda. Não aprendemos nada com as catástrofes e continuamos a fazer intervenções erradas nos rios, com betão. Ainda agora, no rio Sorraia, fizeram-se canais de betão que aumentam a velocidade de escoamento e assim a água chega mais rápida aos pontos críticos, propiciando as cheias. Mesmo o serviço oficial que trata destas matérias (Instituto da Agua) não aprendeu, ainda está na rotina antiga.
Nada, absolutamente nada. E vão repetir-se, porque se tem aumentado a impermeabilização devido ao excesso de construção e continua a fazer-se más obras que impedem a circulação da água. E não se diga que a culpa é da intensidade das chuvas ou das alterações climáticas. Mesmo que assim fosse, é urgente adaptarmo-nos. As cheias são o resultado de erros de urbanismo. Não se pode continuar a cometer erros de planeamento e as autarquias têm de aplicar Planos Verdes. Alguns estão feitos, como em Loures, Sintra e Seixal, mas continuam na gaveta. E em Lisboa estou à espera de que a autarquia aprove medidas cautelares para que possa ser aplicado.
As constantes inundações em Alcântara são inevitáveis?
Não. A autarquia tem um projecto, da minha autoria e do Instituto Superior Técnico, para solucionar o problema, que consiste e destruir o caneiro, renaturalizando a ribeira de Alcântara desde a Amadora e construindo duas pequenas barragens de retenção e recepção. Assim se conseguiria amortecer os caudais mais intensos. Isso deveria ser feito noutras zonas da Grande Lisboa, como no Vale do Jamor. Mas há anos que está na gaveta.
Quatro anos depois das mortíferas cheias de 1967, disse na RTP que a culpa dessa catástrofe era, e cito, “ a falta de planeamento, a inépcia, a ignorância e a incompetência”. E agora?
É a mesma coisa. Talvez pior ainda. Não aprendemos nada com as catástrofes e continuamos a fazer intervenções erradas nos rios, com betão. Ainda agora, no rio Sorraia, fizeram-se canais de betão que aumentam a velocidade de escoamento e assim a água chega mais rápida aos pontos críticos, propiciando as cheias. Mesmo o serviço oficial que trata destas matérias (Instituto da Agua) não aprendeu, ainda está na rotina antiga.
As cheias não afectariam muito os bens materiais se fosse aplicado, com rigor, o regime da Reserva Ecológica Nacional (REN). Este regime de protecção é, porém, muito mal-amado no nosso país…
Não é só a REN, também acontece com a Reserva Agrícola Nacional (RAN). São poucas as pessoas que entendem o seu alcance, a importância que tem para a comunidade, a preservação do território e da paisagem. O conceito de desenvolvimento aparece erradamente associado à produção de dinheiro a curto prazo, o que não é compatível com a boa gestão dos recursos naturais nem com a necessidade da sua renovação permanente.
Em que aspectos a REN tem sido essencial?
Tanto a REN como a RAN, que estão interligadas, e pese embora tenham sido mal interpretadas e também mal aplicadas – é uma velha história –, têm sido fundamentais para termos ainda um mínimo de paisagem rural e agrícola, de preservação do litoral e de protecção de zonas sensíveis.
As críticas, sobretudo de autarcas, devem-se a quê?
De certo modo, a REN contrariou a especulação, a transferência do uso do solo, do solo rural, para zonas urbanas e industriais. Funcionou como travão, um obstáculo àquilo que se julgava ser o desenvolvimento.
Mas um concelho com mais de 70 % da sua área inserida na REN fica bastante condicionado.
Esse concelho não se deve suicidar, tanto mais que essa área das REN, esse obstáculo, é afinal a sua sustentabilidade. Tem é de se adaptar a essa situação, dentro do contexto nacional.
Ou seja, não pode ambicionar ter muitas casas, muitos empreendimentos turísticos, muitas zonas industriais…
Muitos autarcas vivem num mundo virtual. Aquilo que um autarca tem de exigir, de ambicionar, é que as pessoas que aí vivam tenham a mesma dignidade dos restantes habitantes do País. Mas o País não pode ser um puzzle em que tudo é igual e com o mesmo tipo de desenvolvimento.
Acusa-se o regime da REN de ser demasiado fundamentalista, de proibir tudo e mais alguma coisa. Apresenta-se o agricultor que não pode fazer uma casa de banho por causa da REN…
Isso é uma falácia que determinadas pessoas com responsabilidade lançaram de que tudo é proibido. Mas, na verdade, tudo de pode fazer, mas não na REN. Há espaço noutros locais. Não podemos admitir que todo o País seja loteado de prédios, moradias e indústrias. A REN é uma estrutura biofísica que permite que o desenvolvimento se verifique noutras áreas.
Mas depois surgem alguns empreendimentos privados de grandes dimensões e conseguem-se desafectações por regimes especiais, como acontece com os Projectos de Interesse Nacional (PIN). Isso estava no espírito da lei?
Não estava nada. O espírito era olhar para o território de forma sustentável e não fazer-se especulação, transformando o solo rural em urbano. Não é legítimo que um governo faça isso. Temos de reconhecer a importância da REN e da RAN para o País. Repare naquilo que se está a fazer, por exemplo, na Arábia Saudita. Eles têm o deserto e uma população a aumentar por causa do petróleo, estão ricos mas não têm solo. E estão a fazê-lo, estão a criar, do zero, solo, terra agrícola, as suas REN e RAN, usando água dessalinizada e resíduos orgânicos, sobretudo provenientes dos lixos urbanos. Começam já a fazer agricultura, para garantir o futuro, porque um dia o petróleo acaba.
...
Voltando a REN, em Fevereiro surgiu uma intenção do Governo de entregar definitivamente às autarquias a delimitação destas áreas. Que significará isto, caso avance?
As autarquias não têm um passado exemplar para se acreditar que compreendam um instrumento de nível nacional. Basta olhar para as notícias da comunicação social para saber o que elas querem: fazer dinheiro com aqueles terrenos.
Mas já não era assim, na prática? Na esmagadora maioria dos casos, a delimitação era feita pela autarquia e depois aprovada pelas Comissões de Coordenação Regional…
Por isso, essas cartas da REN são um desastre completo, mal delimitadas, com erros. Basta, aliás, ver, que até legendas dessas cartas, que deveriam integrar-se no todo nacional, variam de concelho para concelho.
No contexto actual, uma legislação como a do regime da REN poderia ser aprovada agora?
Não faço ideia. Se eu fosse ministro do Ambiente, sim. Até poderia não haver condições políticas, mas há uma necessidade tremenda. O País não pode continuar a ser destruído, a assistir ao fim do mundo rural, ao fecho de escolas, à concentração nas cidades e crescer em desordem. No interior, não é com balões de oxigénio, como o baixar o IRS, que se resolve isto.
Como conseguiu, em 1983, aprovar uma legislação tão vanguardista, numa altura em que as questões ambientais não estavam na ordem do dia?
A situação já então era grave. Tinha vingado a ideia da floresta industrial, que ameaçava entrar em determinadas zonas sensíveis. Existiam já problemas de erosão e de destruição dos sistemas hídricos, além das cheias e inundações. Aliás, as inundações que existiram antes do 25 de Abril já justificavam, por si só, que não se permitisse construir em leito de cheia, como ficou estabelecido na lei da REN.
Como vê o desempenho ambiental deste Governo? É diferente dos outros, tendo em conta que é liderado por um antigo ministro do Ambiente?
Não existe desempenho. Vê-o? Não se vê política de ambiente! Veja-se o que aconteceu com o Plano Nacional de Ordenamento do Território. E no que resultou o Plano Regional de Ordenamento do Território [aprovado em Fevereiro de 2002, quando José Sócrates era ministro do Ambiente]? Nada. E nada porque é um plano sem consistência.
in revista “Notícias Sábado” (28 Fevereiro 2008)
Etiquetas: Joana Torres Fernandes (n.º 13931)
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