Desenvolvimento sustentavel e energias renovaveis

Introdução

Os recursos naturais são o que de mais precioso a Humanidade possui. Da sua boa gestão dependem as gerações futuras. O ritmo acelerado do consumo dos recursos, nomeadamente os energéticos, contrasta com a sua lenta regeneração.
O presente trabalho versa sobre o princípio do desenvolvimento sustentável e visa demonstrar que numa “sociedade de risco” como a nossa, como diria Beck, face aos perigos ecológicos que enfrenta, exige-se que sejam ponderados os riscos que cada decisão pode acarretar para o ambiente.
As energias renováveis são utilizadas neste trabalho como um exemplo que pode ser dado para demonstrar a aplicação prática do princípio do desenvolvimento sustentável.
A União Europeia e os vários Estados não só da Europa como de todo o Mundo, na senda do Protocolo de Quioto, assumiram o compromisso de tomarem um pacote de medidas com vista à redução da emissão dos gases que provocam o efeito de estufa. Uma das estratégias adoptadas para alcançar este objectivo foi o recurso às energias renováveis.
Neste trabalho, irei fazer referência aos planos e medidas que estão em marcha no sector da energia, quer do ponto de vista interno quer do ponto de vista comunitário, para alcançar aquilo que o Banco Mundial fez ver aos Estados: a preservação é mais barata do que a cura.


“A perspectiva ecológica começa com uma visão do todo, com a compreensão de como as várias partes da natureza interagem em modelos que tendem para o equilíbrio e persistem ao longo do tempo.
Mas esta perspectiva não pode tratar a terra como algo de separado da civilização humana: nós também fazemos parte do todo e, em última análise, olhar para ele significa olhar para nós próprios. E se não virmos que a parte humana da natureza – que nós somos, na verdade, uma força natural, como os ventos e marés – então, não seremos capazes de ver o modo perigoso como ameaçamos empurrar a terra para o desequilíbrio”.

Al Gore, A Terra à Procura de Equilíbrio – Ecologia e Espírito Humano.


O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E AS ENERGIAS RENOVÁVEIS

O desenvolvimento sustentável:

“O desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que permite dar respostas às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras darem respostas às delas”.

WCED, 1987.

A questão da sustentabilidade é discutida desde a década de 60, mas é nos anos 70 que consegue despertar a opinião pública para este problema. O conceito de desenvolvimento sustentável foi desenvolvido pela ordem jurídica internacional, na esteira da Declaração de Estocolmo de 1972.
Este conceito apresenta uma dupla vertente: uma económica e outra jurídica.
A primeira foi concebida com o objectivo de conservar a preservação do meio ambiente com o desenvolvimento socio-económico.
Nas últimas décadas, assistimos a vários indícios de que o desenvolvimento económico alcançado por alguns Estados e perseguido por muitos outros estava a causar efeitos trágicos sobre o meio ambiente. Face a este cenário, tornou-se necessário reavaliar os padrões ou modelos de crescimento e tomar medidas que tivessem como prioridade a eliminação ou, pelo menos, uma redução significativa dos factores prejudiciais ao meio ambiente de modo a construir um desenvolvimento sustentável.
O problema actual já não é apenas o limite das fontes (como o petróleo, o cobre, etc.). Hoje deparamo-nos com problemas igualmente urgentes como a redução da camada do ozono, a poluição do ar e da água, o recuo da biodiversidade ou o efeito de estufa, entre outros. Já não se trata apenas de combater o crescimento económico, também o crescimento e o desenvolvimento podem ser postos em causa pela crescente degradação ambiental. Senão, vejamos dois exemplos: o esgotamento dos solos, a toxidade crescente do ar e da água são incompatíveis com as necessidades de procura de alimentos por uma população em constante crescimento; os padrões de consumo dos países desenvolvidos exigem quantidades crescentes de matérias-primas não renováveis como a energia, que aceleram o esgotamento desses recursos.
O desenvolvimento sustentável implica preocupações com a qualidade de vida, com critérios de igualdade entre as populações actuais, nomeadamente o combate à pobreza e à exclusão social, com critérios de igualdade entre as várias gerações, no sentido de que as populações futuras merecem um ambiente tão equilibrado como o que desejamos hoje para nós. Implica também um desenvolvimento futuro dos ecossistemas artificiais.
Inevitavelmente existem vários limites para os usos de energia, ar, água, solo ou matérias-primas. Esses limites não se manifestam sob a forma de uma extinção súbita, mas serão visíveis os vários indícios disso, tais como a subida do preço e diminuição da rentabilidade de certos recursos ou o aumento do número e intensidade dos desastres ecológicos.
As instituições políticas e económicas nacionais e internacionais pretendem adoptar uma estratégia que visa a busca de um desenvolvimento sustentável. Assim, para além da harmonia entre a humanidade e a natureza, pretende-se garantir um crescimento económico capaz de gerar excedentes, a educação ambiental, um sistema tecnológico que procure constantemente novas soluções, um sistema internacional que estimule padrões sustentáveis de comércio e financiamento, um sistema administrativo flexível e capaz de se autocorrigir, um sistema político que assegure a efectiva participação dos cidadãos no processo, manter a população num número sustentável.
O desenvolvimento sustentável acabou também por ganhar uma preponderância na ordem jurídica interna dos Estados. Na nossa ordem jurídica foi elevado a princípio com dignidade constitucional pelo art. 66º, nº 2.
Do ponto de vista jurídico, o princípio do desenvolvimento sustentável encerra a premissa de que antes de ser tomada qualquer decisão jurídica de cariz económico pelos poderes públicos é necessário que sejam ponderadas as respectivas consequências jurídicas para o meio ambiente.
A decisão será considerada insustentável e, por consequência, inválida sempre que se chegar à conclusão de que os custos ambientais são superiores aos respectivos benefícios económicos.
Face à escassez dos recursos naturais impõe-se que se adoptem critérios de eficiência na tomada de decisões pelos órgãos competentes que permitam retirar a máxima optimização do aproveitamento desses recursos.
As energias renováveis podem ser apontadas como um bom exemplo de concretização do princípio do desenvolvimento sustentável. As decisões jurídicas, no âmbito do sector da energia, devem ser tomadas obrigatoriamente sob a égide de critérios de eficiência, sob pena de serem violados os padrões constitucionais.
No âmbito da estratégia para a utilização sustentável dos recursos naturais inspirada para a União Europeia para os próximos anos estão englobadas energias renováveis como uma estratégia para reduzir as pressões ambientais.
De uma forma bastante simplificada podemos dizer que as energias renováveis são aquelas que estão em constante renovação, não se esgotando, e que podem ser continuamente utilizadas. A grande vantagem destas energias é a sua elevada taxa de renovação. As suas fontes podem ter origem terrestre (energia geotérmica), gravitacional (energia das marés) e solar (energia armazenada na biomassa, energia de radiação solar, energia hidráulica, energia térmica oceânica e energia cinética do vento e das ondas).

As energias renováveis no âmbito da política comunitária:

Protocolo de Quioto:

O Protocolo de Quioto é o culminar de um compromisso assumido pelos vários Estados para a redução da emissão dos gases que provocam o efeito de estufa. Este Protocolo propõe um calendário pelo qual os países desenvolvidos têm a obrigação de reduzir a emissão de gases do efeito de estufa em, pelo menos, 5, 2% comparativamente com os níveis de 1990 num período que decorre entre 2008 a 2012. Trata-se do primeiro período do compromisso.
O Protocolo propõe várias medidas que os Estados signatários, em espírito de cooperação, devem adoptar, tais como: a reforma dos sectores da energia e transportes, a utilização de fontes renováveis, a limitação das emissões de metano no gerenciamento dos resíduos e dos sistemas energéticos, etc.

Políticas adoptadas:

Vários são os actos que a União Europeia publica dando-nos conta das suas estratégias para o sector energético. Da análise de actos como a decisão 1639/ 2006/ CE do Parlamento Europeu e do Conselho que institui um Programa-Quadro para a Competitividade e a Inovação (2007 – 2013) ou o Livro Verde da Comissão, de 08 de Março de 2006, “Estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura”, podemos retirar os objectivos e a medidas que a União Europeia pretende implementar no sector energético:
São três grandes princípios que devem orientar a política energética dos Estados-Membros: a sustentabilidade, realçando a necessidade de investir nas energias renováveis e na eficiência energética, a competitividade para melhorar a eficácia da rede europeia através da realização do mercado interno da energia e a segurança do aprovisionamento. A política energética europeia visa a realização do uma política externa comum em matéria de energia.
A realização de mercados internos do gás e da electricidade é uma das metas principais a prosseguir na estratégia europeia. Alerta-se para o facto de muitos mercados nacionais continuarem a ser marcados pelo proteccionismo e pela posição dominante de algumas empresas históricas. Esta atitude acaba por prejudicar os consumidores, pois são praticados preços demasiados elevados em contraposição com infra-estruturas pouco competitivas.
Por isso, a União quer concretizar a abertura dos mercados fomentando deste modo uma concorrência equitativa entre as empresas a nível europeu.
A criação do mercado interno da energia pressupõe:

• O desenvolvimento de uma rede europeia, com normas comuns sobre as trocas transfronteiriças a fim de permitir aos fornecedores um acesso harmonizado às redes nacionais.
• Um plano de interconexões prioritárias para aumentar o investimento nas infra-estruturas que ligam as várias redes nacionais, na sua maioria ainda demasiado isoladas.
• O investimento em capacidade de produção para fazer face aos picos de consumo, utilizando a abertura dos mercados e a competitividade para incentivar o investimento.
• Uma maior separação das actividades a fim de distinguir claramente as de produção e as de transmissão do gás e da electricidade.
• Aumentar a competitividade da indústria europeia, tendo acesso a energia a um preço mais acessível.

A dependência face às importações exige que sejam adoptadas medidas para assegurar o aprovisionamento constante de energia. O desenvolvimento de mecanismos de reserva é um passo a prosseguir. Por outro lado, a União Europeia entende que a abertura dos mercados é um meio para garantir a segurança do aprovisionamento incentivando as empresas a investir num ambiente estável e concorrencial.
O aprovisionamento pressupõe ainda que sejam criadas reservas energéticas de forma a combater os riscos de ruptura.
A cada Estado-Membro é dada a possibilidade de escolher o seu cabaz energético a partir das fontes de energia disponíveis.
A eficiência energética é outra das metas a alcançar. O que se pretende é separar o crescimento económico do consumo energético para consumir menos mas manter a competitividade. Prevê-se que até 2020 se consiga poupar 20% de energia.
As energias renováveis ocupam um papel de destaque na política energética da União. Está prevista a criação de um roteiro para as fontes de energia renováveis, o qual deverá rever os objectivos da UE para 2020 e elaborar uma lista de medidas para favorecer o desenvolvimento das fontes de energia limpas e renováveis. Integra igualmente as iniciativas no domínio da biomassa e o apoio à electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis.
Também haverá um investimento orientado para o desenvolvimento e implantação de novas tecnologias energéticas. Aliás, o sétimo programa-quadro de investigação da UE oferece um quadro adaptado ao desenvolvimento das novas tecnologias energéticas para melhorar a produção e o consumo de energia na Europa.

As energias renováveis no âmbito da política interna:

Os compromissos internacionais de Portugal decorrentes do Protocolo de Quioto e da Directiva sobre Energias Renováveis impõem, até 2010, por um lado, uma drástica redução das nossas emissões de CO2 e, por outro, um aumento da nossa capacidade de produção de energia eléctrica através das fontes renováveis.

O nosso sistema energético caracteriza-se por estar muito dependente dos combustíveis fósseis (petróleo, carvão e gás natural) como fontes de energia primária, uma dependência directamente relacionada com outras aplicações energéticas, nomeadamente em áreas como os Transportes e a Indústria. Trata-se, portanto, de um sistema energético muito dependente do exterior. Para contrariar esta tendência será necessário aumentar da nossa capacidade de produção de energia, investindo na implementação de energias renováveis.
Portugal assumiu o compromisso de obter uma produção de energia com origem em fontes renováveis na ordem dos 39% até 2010. Este compromisso que também contempla a segurança do abastecimento, para ser uma realidade viável terá de investir na promoção de todas as energias renováveis, permitindo alcançar outros objectivos como a redução da factura energética nas importações e a redução da intensidade carbónica do PIB.
Algumas medidas já estão em andamento como o lançamento de um concurso para a atribuição de até 1800 MW de potência de forma a atingir a meta de 5100 MW de potência eólica para 2012-2013; a valorização da biomassa florestal, em regime compatível com as indústrias da madeira e da pasta de papel. Está prevista a construção de 15 centrais de biomassa. O objectivo é produzir 250 MW de energia a partir da biomassa florestal; a transposição da Directiva sobre Biocombustíveis e a introdução de biocarburantes no nosso país. A directiva foi já transcrita para a ordem jurídica interna e o principal incentivo desta nova fonte de energia será a isenção de ISP. Com esta medida pretende-se atingir 5,75% dos combustíveis utilizados em transportes até 2010; também está prevista a criação de um grupo de trabalho com o objectivo de definir os parâmetros de licenciamento de uma zona piloto no off-shore atlântico para testar, desenvolver e aplicar as tecnologias das ondas tendo em vista a produção de electricidade.

Em Portugal podemos identificar alguns mecanismos de apoio para a aquisição de equipamentos para a utilização de energias renováveis: o regime jurídico que estabelece uma tarifa diferenciada para a produção de electricidade a partir de fontes de energia renovável (Decreto-Lei n.º 168/99 de 18 de Maio, posteriormente actualizado pelo Decreto-Lei n.º 339-C/2001 de 29 de Dezembro) ou a existência de incentivos fiscais para a aquisição de equipamentos que utilizem energias renováveis (IVA à taxa reduzida de 12% e dedução à colecta de 30% do valor global do investimento no IRS).

Conclusão

O desenvolvimento sustentável pode ser entendido como um conceito muito ambicioso em virtude das muitas realidades que contempla.
Para colocar o modelo de desenvolvimento sustentável em prática é necessário atender a determinadas mediadas que implicam a preservação dos recursos naturais que são utilizados, muitas vezes, de forma irracional.
Apesar de as fontes de energias renováveis terem um peso pouco significativo no panorama energético europeu, uma vez que o seu custo é superior ao das fontes de energia tradicioniais, é indiscutível que as fontes de energia renovável são uma forma de aumentar a eficiência energética e de diminuir a nossa dependência que sentimos face aos combustíveis fósseis importados de países terceiros.
Mas é indiscutível que as energias renováveis contribuem para limitar as alterações climáticas, o permite de certa forma contrabalançar a humanidade e a natureza. Para consolidar este objectivo há que investir na poupança de energia, no desenvolvimento de requisitos mínimos de eficiência para os equipamentos consumidores de energia, na sensibilização dos consumidores para comportamento racional e económico no consumo de energia, na eficiência da produção.
Importa ainda realçar a necessidade de um diálogo internacional com os parceiros energéticos da União Europeia, pois o ambiente é uma questão que diz respeito a todos e ninguém está isento de prestar a sua colaboração para melhorar o nosso ecossistema e garantir o sucesso do desenvolvimento sustentável. A responsabilização efectiva de todos é outra meta a prosseguir.

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