Estado Constitucional Ecológico

Há, actualmente, toda uma agitação em torno da construção do chamado “Estado constitucional ecológico”. Esta noção pretende abarcar uma nova concepção de Estado, no qual, a institucionalização de deveres fundamentais ecológicos está patente. Assim, o Estado constitucional, além de ser e dever ser um Estado de Direito democrático e social, deve ser também um Estado regido por princípios ecológicos. Um Estado ecologicamente informado e duradouro. Este Estado ecológico aponta para novas formas de participação política, sugestivamente condensadas na expressão “democracia sustentada”, ou seja, uma democracia adequada às exigências de desenvolvimento ambientalmente justo e duradouro.
A grande questão aliada ao tema é a seguinte: como deve ser feita esta positivação normativo-constitucional do ambiente?
Não há conclusões estimulantes. Tudo se centra no dilema de consagrar o ambiente ou como fim e tarefa do Estado ou como direito subjectivo fundamental. Os múltiplos olhares sobre a temática de Direito do Ambiente geraram uma multicomplexidade de respostas no que toca à construção do Estado constitucional ecológico e, actualmente, existem vários postulados jurídicos que tentam dar uma resposta adequada à questão.
De uma forma globalista, alguma doutrina / jurisprudência defende que a protecção do ambiente não deve ser feita através de sistemas jurídicos isolados mas antes ao nível de sistemas jurídico – políticos, internacionais e supranacionais. Segundo este postulado globalista, só desta forma se alcançará um standard ecológico ambiental razoável a nível planetário estruturando, simultaneamente, uma responsabilidade global dos Estados, organizações, grupos, face às exigências de sustentabilidade ambiental. Esta é, no fundo, uma tentativa de Direito do Ambiente mundial, incidindo no âmbito de entidades supranacionais, como forma de resposta aos chamados problemas ecológicos de 2ª geração (camada do ozono, alterações climáticas, biodiversidade) e sob a égide do princípio de sustentabilidade ambiental, apelidado de princípio do Rio, por ter nascido da Conferência do Rio de Janeiro – Agenda 21.
Numa perspectiva mais individualista, poderia aqui fazer referência a um outro postulado, que defende, essencialmente, a existência de um direito individual fundamental ao ambiente, constitucionalmente consagrado. Trata-se de uma teoria individualista. No fundo, esta teoria traduz, apenas e só, a ideia de que a defesa do ambiente passa ainda hoje pela utilização de direitos (acções e recursos) marcadamente privatísticos – direito de propriedade, direito à integridade física, acções de vizinhança. A pergunta essencial a ser feita é: o interesse invocado está juridicamente protegido, por forma a que o seu titular possa obter a sua satisfação ou protecção através do recurso à via judicial? Bom, tendo por base os actuais sistemas jurídicos, o direito ao ambiente postularia a adopção de esquemas processuais individualistas – o recurso a acções populares, acções colectivas de interesses ou acções de associações ambientais só deveriam ser admitidas a título excepcional.
Existe, ainda, um terceiro postulado, baseado numa perspectiva publicística do direito ao ambiente. Segundo esta, o regime jurídico do ambiente deveria assentar na ideia de bem público de uso comum e na protecção do mesmo como função essencialmente pública. Os chamados interesses difusos transitariam, então, para a esfera dos interesses públicos, com a consequente institucionalização e publicização dos instrumentos processuais e procedimentais, destinados à defesa dos interesses ambientais. A emanação de normas é feita pelas entidades públicas, sob a ideia de dever no que toca à feitura da regulação normativa ambiental. Assim, seria um dever geral do Estado adoptar actos positivos para a defesa e protecção de direitos constitucionalmente consagrados, quando a emissão de normas seja comprovadamente condição indispensável à protecção do meio ambiente. Resta saber como, quem e através de que procedimento se poderia recorrer aos Tribunais para estes proferirem um “ mandado de injunção “ dirigido ao Estado, no sentido de este emanar normas, cuja omissão, em caso de lesões irreparáveis, se traduziria em ilícito normativo ambiental.
Independentemente do postulado que se assuma, é clarividente que a construção do Estado constitucional ecológico deve ser ela própria auto-sustentada, para que sejam tomadas em consideração as condições do ambiente nas diversas regiões e as vantagens e desvantagens da actuação e da ausência dela. Como tal, o Estado constitucional ecológico não pode prescindir de um sistema de responsabilidade por danos ambientais suficientemente operatório. No entanto, devemos reconhecer que estamos ainda longe deste sistema.
Em geral, é ainda reconhecido que a responsabilidade civil continua a ser um dos instrumentos mais adequados à imposição de standards de comportamento e, consequentemente, um dos meios mais importantes de tutela preventiva. Fica assim levantada a questão cerne do Estado constitucional ecológico: quais os danos cobertos por um sistema de responsabilidade ambiental? Quais as actividades causadoras de dano ambiental?
Há uma tendência para aceitar que o Estado constitucional ecológico postula necessariamente a consagração de um sistema de responsabilidade que compreenda o ressarcimento de danos ambientais. No entanto, não basta prever uma responsabilidade dirigida à tutela ambiental – é de extrema importância, para além disso, proceder-se à tipificação rigorosa dos danos ecológicos susceptíveis de reparação. Assim, diria que é fundamental à implementação do Estado constitucional ecológico, a criação de um modelo de responsabilidade objectiva pelos danos causados ao ambiente por actividades intrinsecamente perigosas e ainda, a definição, como sujeitos responsáveis, dos operadores que exercitam um controlo efectivo sobre uma actividade reentrante no regime da responsabilidade por danos ambientais.
Por fim, no que toca aos esquemas processuais, nas acções judiciais correspondentes, o professor Gomes Canotilho defende que o Estado deve dinamizar acções tendentes a garantir a reparação dos danos à biodiversidade e a descontaminação de áreas poluídas, fazendo uso de verbas indemnizatórias pagas pelos agentes lesivos e ainda, abrir a possibilidade às associações não governamentais de defesa do ambiente, de agirem a título subsidiário quando o Estado seja omisso ou quando não actue de forma adequada.

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