Em Portugal, o problema do lixo tecnológico pode ser visto segundo duas perspectivas diferentes. Como o proverbial como, ora semicheio para os optimistas, ora semivazio para os cépticos, também a análise do caminho já percorrido da valorização de resíduos e equipamentos eléctricos e electrónicos (REEE) em Portugal revela diversas interpretações.
Para os optimistas , têm-se vindo a registar progressos desde a transposição da directiva europeia para a legislação portuguesa, que obriga á recolha selectiva, proveniente de particulares, numa proporção mínima de 4kg/habitante/ano (Dezembro de 2004), até á actualidade, tendo em conta que outros países europeus, como a Itália, ainda nem efectuaram a transposição da directiva para as suas legislações internas e não começaram ainda a recolher REEE para valorização.
Existem duas sociedades gestoras licenciadas que promovem a recepção e recolha destes resíduos – a Amb3E e a ERP Portugal – que têm disseminado rapidamente pelo território português as suas infra-estruturas que recolhem e fazem uma primeira triagem dos REEE pelos cincos principais fluxos: grandes equipamentos; equipamentos de arrefecimento e refrigeração; equipamentos diversos; lâmpadas fluorescentes e de descarga; monitores e aparelhos de televisão (tubos de raios catódicos).
Não obstante as licenças das duas sociedades gestores terem sido atribuídas apenas em 2006, o facto é que este projecto tem-se vindo a expandir a uma velocidade encorajadora.
Para além disto, importa reconhecer que ainda existe uma grande distância a separar o público dos centros de recolha, mas a Amb3E tem feito esforços no sentido de implementar mais dispositivos de recolha. Ainda em Dezembro do ano passado, a Amb3E implementou os Pontos Electrão em cinco grandes superfícies comerciais de Lisboa e Porto, com o intuito de facilitar a entrega de equipamentos obsoletos, visando também atenuar a dificuldade que as pessoas sentem em encontrar centros de recolha destes resíduos a distâncias acessíveis dos principais centros urbanos.
Temos também que ter em conta, que em Portugal há, de facto, capacidade tecnológica para tratar grande parte destes fluxos. Os resíduos de grandes equipamentos eléctricos e electrónicos não perigosos e também os resíduos de pequenos equipamentos são “desmantelados e os materiais separados em unidades de tratamento e valorização e posteriormente enviados para recicladores nacionais”, segundo o consultor da Amb3E, Victor Sousa Uva.
Outros equipamentos, como os que contêm circuitos de refrigeração são “desmantelados e os respectivos componentes separados, sendo o gás que contém CFC [clorofluorcarbonetos] enviado para unidades no espaço europeu para incineração”. Quanto ás lâmpadas de descarga e tubulares fluorescentes, “os componentes são separados numa unidade industrial existente em Portugal, e o mercúrio é introduzido na indústria”. Quanto aos monitores “após desmantelamento, o vidro do cinescópio é canalizado para a indústria de produção de novos cinescópios”.
Para os pessimistas, estes pensam que muitos consumidores não sabem que, ao comprarem um novo equipamento, podem exigir ao vendedor que aceite o equipamento velho. De facto, consciencializar as pessoas para a importância da reutilização de REEE é uma desafio enorme, comparável ao que a Sociedade Ponto Verde teve que enfrentar há cerca de uma década quando iniciou a gestão dos resíduos de embalagens. Há ainda muito a fazer, um longo caminho a percorrer, informando e estimulando mais os cidadãos a exigir aos vendedores que aceitem os equipamentos velhos, mas criando, também mais pontos de recepção dos mesmos.
No entanto, as sociedades gestoras reconhecem que, em 2007, ficaram aquém das metas comunitárias. A Amb3E recolheu e encaminhou para tratamento perto de 20 mil toneladas e a ERP Portugal 9 mil – perfazendo um total na ordem dos 3 Kg por habitante. Segundo o Centro de Informação de Resíduos da Quercus, estima-se que este ano ir-se-á registar novo incumprimento, embora esta perspectiva não mereça a concordância das sociedades gestoras.
A Quercus alerta ainda para a existência de muitos operadores ilegais, nomeadamente sucateiros, que distorcem o esforço de valorização, já que tratam de forma incorrecta e potencialmente perigosa para o ambiente os REEE.
Muitas pessoas depositam ainda os REEE na via pública, deixando os mesmos sujeitos ás mais variadas violações. Alguns equipamentos são negligentemente manipulados por particulares, libertando gases que contêm CFC o que leva ao encarecimento da valorização, já que os componentes mais valiosos já não estão nos equipamentos quando chegam aos pontos de reciclagem.
A Recielectric anunciou um investimento de cerca de 5 milhões de euros na implantação de tecnologias mais sofisticas, capazes de, nomeadamente, tratar 600 frigoríficos e arcas congeladoras num só dia. Contudo, a verdade é que, como sublinha a Quercus, continuam a exportar-se REEE, “como lâmpadas ou equipamentos de refrigeração, para tratamento noutros países, quando em Portugal existe essa capacidade”.
“Copo semicheio ou copo semivazio...É uma questão de perspectiva”.
In National Geographic Portugal (Fevereiro 2008)
Tânia Maltez,
nº13160,
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