Mecanismos Extra- Judiciais

As Reclamações e Recursos dentro da Administração – 158º CPA

Quando um órgão administrativo toma uma decisão que ofende um direito ou interesse legalmente protegido, ex: o direito ao ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, há duas vias possíveis: reclamação ou recurso administrativo.
Há Reclamação quando se peça a modificação ou revogação da decisão ao próprio órgão que a tomou, é um mecanismo de verdadeiro auto-controlo, pois pede-se ao órgão que já se pronunciou sobre a situação para reapreciar a sua própria decisão.
Recurso Administrativo- verifica-se quando se peça a modificação ou revogação a um outro órgão administrativo que exerça algum poder de controlo sobre o órgão do qual emanou a decisão. Consoante órgão competente para apreciar o recurso administrativo, podemos distinguir:
a) recurso hierárquico – apreciado pelo superior hierárquico do autor do acto;
b) recurso hierárquico impróprio – decidido pelo órgão que exerça poder de supervisão fora do âmbito da hierarquia administrativa sobre o orgão recorrido, existe, nomeadamente, no âmbito de uma delegação de competências entre órgãos administrativos
c) recurso tutelar – apreciado pelo órgão que exerça o poder de tutela ou superintendência, no caso de actos administrativos praticados por órgãos de pessoas colectivas públicas diferentes, e ligadas por uma relação de tutela ou superintendência, ex: o recurso dos actos do presidente do Instituto da Conservação da Natureza apresentado perante o ministro com a pasta do Ambiente, pois entre estes organismos existe uma relação de superintendência.

As reclamações e os recursos podem ter por fundamento tanto a ilegalidade (violação directa de uma norma legal) como a inconveniência (desrespeito de regras técnicas e de boa administração) do acto administrativo impugnado. Uma decisão da Administração quanto à localização.
(ex: A decisão da Administração quanto à localização de uma determinada fábrica é ilegal se, por exemplo, o local em causa estiver incluído numa zona de Reserva Ecológica Nacional onde é proibido construir. Agora, a decisão até pode não violar qualquer norma jurídica, pode é ser considerada mais ou menos acertada, mais ou menos conveniente, consoante os interesses que satisfaz ou prejudica.)
O mérito ou conveniência das decisões administrativas só pode ser contestado perante a própria Administração, no âmbito das reclamações e recursos administrativos. Atendendo ao princípio da separação de poderes, os tribunais não podem avaliar a conveniência das decisões administrativas, pois isso seria assumir o papel da própria Administração.
A reclamação tem por característica o facto de ser um procedimento relativamente rápido: deve ser apresentada no prazo de 15 dias a contar do conhecimento do acto administrativo, sendo a decisão tomada no prazo de 30 dias.

Efeitos do recurso, o órgão que aprecia o recurso pode:
- confirmar ou revogar o acto recorrido e, se o acto não tiver sido praticado no âmbito de uma competência exclusiva do seu autor, pode ainda modificá-lo ou substituí-lo, isto se a lei expressamente conferir poderes de tutela substitutiva ao órgão que aprecia o recurso
- anular todo o procedimento administrativo que conduziu à prática do acto e a determinação da realização de nova instrução ou de diligências complementares.

O requerimento de recurso administrativo pode ser entregue junto do autor do acto administrativo ou junto do órgão que vai apreciar o pedido, sempre dirigido a este último, devendo ser apresentado no prazo de 30 dias a contar do respectivo conhecimento, caso se trate de recurso hierárquico necessário, ou três meses se o recurso for facultativo. O procedimento é um pouco mais longo, uma vez que tem de ser dada oportunidade ao autor do acto para se pronunciar (tem para isso 15 dias).
Aos titulares dos interesses difusos é reconhecida a legitimidade para reclamar e recorrer dos actos administrativos que ofendam esses interesses (arts. 160º n.º 2 e 53º n.º 2 e 3 do CPA).

Da Articulação entre os recursos administrativos e a interposição de acções judiciais:

Já foi um tema muito discutido na doutrina saber se antes de impugnar judicialmente um acto administrativo, é necessário esgotar primeiro as possibilidades de recurso perante a própria Administração.
O CPA distingue entre os recursos facultativos e os necessários, consoante se possa contestar o acto administrativo em tribunal sem necessidade de passar previamente pelo
controlo interno da Administração, ou a interposição do recurso administrativo seja um requisito prévio e necessário à contestação judicial.
Com a revisão da Constituição de 1997 consagrou-se como direito fundamental de todos os administrados a possibilidade de recorrerem a tribunal para contestar qualquer acto administrativo lesivo dos respectivos direitos e interesses legalmente protegidos. Na prática, o recurso administrativo só é necessário se a lei expressamente o determinar para a situação em causa. Mesmo nos casos de recurso administrativo facultativo, se o mesmo for interposto, suspende-se o prazo para a impugnação judicial, sendo ainda possível recorrer aos tribunais durante a pendência do recurso administrativo. O que significa que se garante a possibilidade de utilizar sucessiva e simultaneamente os dois mecanismos de controlo dos actos administrativos.

Queixa perante a Comissão de Acesso aos Docs Administrativos

Sempre que um pedido de acesso a um documento, formulado no âmbito da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, alterada pelas Leis n.º 8/95, de 29 de Março, e 94/99, de 16 de Julho), seja recusado ou não obtenha resposta, o interessado pode dirigir uma queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).
A CADA é uma entidade pública independente, que funciona junto da Assembleia da República, criada para zelar pelo cumprimento da referida Lei de Acesso aos Documentos Administrativos.
A queixa deve ser apresentada no prazo de 20 dias a contar da recusa expressa ou do fim do prazo que a Administração tinha para responder (10 dias a contar do pedido). A CADA tem então um prazo de 30 dias para emitir o seu parecer e enviá-lo a todos os interessados. Este parecer não é vinculativo, a Administração apenas tem de o tomar em consideração numa decisão em segunda leitura, que deve ser tomada num prazo de 15 dias.
Caso se mantenha a recusa ou não haja decisão final neste prazo, resta ao interessado recorrer ao tribunal.
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Contra- Ordenações

As autoridades administrativas dispõem de um meio eficaz através do qual é possível impor coercivamente as normas ambientais (e outras) – a aplicação de coimas (sanções pecuniárias) e eventualmente ainda de sanções acessórias no âmbito de processos de contra-ordenação.
O regime geral das contra-ordenações consta de um diploma específico (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro), o qual define os pressupostos gerais de aplicação das coimas e sanções acessórias bem como a tramitação do processo contra-ordenacional.
A generalidade dos diplomas que disciplina as actividades susceptíveis de provocar impactes ambientais contém um capítulo relativo à fiscalização e sanções, no qual se identificam as entidades com competência para fiscalizar a aplicação das normas daquele diploma, os comportamentos considerados como contra-ordenações, as coimas e sanções acessórias aplicáveis e as entidades competentes para as aplicar.
As autoridades policiais têm uma competência genérica para tomar conta de todos os eventos ou circunstâncias susceptíveis de implicar responsabilidade por contra-ordenação e tomar as medidas necessárias para impedir o desaparecimento de provas. Nestes casos levanta-se um auto de notícia, que atesta a situação que indicia a infracção, e remete-se o mesmo para a autoridade competente que irá instruir o processo de contra-ordenação.
A nível de contra – ordenações ambientais as entidades especializadas na fiscalização são: o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da Guarda Nacional Republicana e o Corpo Nacional da Guarda Florestal.
A Inspecção-Geral do Ambiente é o serviço inspectivo central do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, sendo por isso, em regra, a autoridade competente para instaurar, instruir e decidir os processos de contra-ordenação nas áreas do ambiente, ordenamento do território e conservação da natureza. Dependendo da matérias, pode ainda haver outras entidades encarregues dos processos contra-ordenacionais.
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Qualquer pessoa pode dar conhecimento da prática de uma infracção que constitua contra-ordenação. Essa queixa dará, em princípio, origem à abertura de um processo de contra-ordenação, no qual a autoridade administrativa vai averiguar se existe ou não infracção, investigando os factos que indiciam a prática da contra-ordenação, ouvindo testemunhas e peritos e realizando as demais diligências necessárias. O alegado infractor tem sempre o direito de ser ouvido e pode ser representado por defensor. Caso a autoridade administrativa considere provada a prática da contra-ordenação, aplicará uma coima ao infractor, eventualmente acompanhada de sanções acessórias. O infractor pode recorrer para os tribunais judiciais pedindo o reexame da decisão.
Os cidadãos e as organizações não governamentais de ambiente (ONGA) não podem impugnar judicialmente a decisão administrativa nem tomar parte, como assistentes (acusadores), quer na fase administrativa quer na fase judicial. Contudo, podem acompanhar o processo contra-ordenacional, apresentando memoriais, pareceres técnicos, sugestões de exames ou outras diligências de prova até que o processo esteja pronto para decisão final (artigo 10º da Lei das ONGA – Lei n.º 35/98, de 18 de Julho).
A responsabilidade contra-ordenacional não exclui outros tipos de responsabilidade: se tiverem sido causados danos ao ambiente o infractor é ainda responsável pela reposição da situação anterior ou pela indemnização pelos danos (responsabilidade civil); se o comportamento em causa constituir simultaneamente a prática de um crime, o infractor é punido pela prática deste (em vez da contra-ordenação), podendo ser aplicáveis as sanções acessórias previstas para a contra-ordenação.

A reposição da situação anterior pode ser ordenada pela própria autoridade competente para o processo de contra-ordenaçã, ou por um tribunal a pedido dos cidadãos afectados.
Quando a infracção constituir crime e contra-ordenação compete à autoridade administrativa remeter automaticamente o processo para ser julgado em tribunal.

Mediação Ambiental

Na mediação todo o processo é controlado pelas partes em conflito e não por um terceiro exterior que vem impor a sua decisão. O mediador funciona assim como um terceiro neutro e imparcial cuja tarefa consiste em facilitar o diálogo e auxiliar os participantes a dialogar, a compreender mutuamente os respectivos interesses e necessidades e a gerarem soluções.
Para que este modelo funcione é necessário que as partes abandonem a tradicional postura adversarial e assumam um espírito colaborativo, construtivo e criativo, de procura conjunta de soluções satisfatórias para todos. A mediação exige mesmo um particular empenhamento das partes, estas participam activamente no diálogo, trazem o máximo de informação que possa ser relevante para conhecer todos os ângulos do conflito e todos os interesses em jogo, e contribuir para a procura de consensos. O facto de o processo ser confidencial permite que as partes se sintam livres de constrangimentos exteriores e colaborem melhor.
O papel do mediador, um técnico especializado, é essencial, na medida em que estrutura o diálogo, assegurando o respeito mútuo e estimulando os participantes a partilhar informação importante e a buscar soluções criativas em conjunto, sem contudo interferir, ele próprio, no conteúdo dessas soluções.
O acordo a que se consiga é totalmente construído pelas partes existindo assim maiores garantias de ser cumprido e respeitado pelas mesmas.
Os conflitos em torno de bens ambientais opõem uma multiplicidade de partes e interesses públicos e particulares, eventualmente locais e nacionais, sendo que as partes se apresentam muitas vezes através de representantes de grupos e/ou comunidades. O processo de mediação destes conflitos multi-partes é assim bastante complexo. No entanto, é possível chegar a soluções que satisfaçam todos na medida em que atendam a alguns interesses de cada uma das partes.
Em Portugal estes processos colaborativos não estão ainda muito divulgados.
A mediação foi “oficialmente” adoptada nos Gabinetes de Mediação Familiar e nos Julgados de Paz, como uma fase prévia à resolução judicial dos conflitos. Se as partes quiserem tentar a mediação e através dela chegarem a um acordo, o juiz poderá homologá-lo, ganhando assim a força jurídica de uma sentença judicial. Os conflitos ambientais não cabem, contudo, no âmbito de competência dos Julgados de Paz.
Isabel Machado, nº 14475, Subturma 3

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