Notícia sobre a simulação da subturma 2

Já passavam cerca de vinte minutos da uma da tarde, na passada terça-feira, quando finalmente o juiz presidente declarou aberta a audiência. Os autores, Bernardim da Costa Silva e Camilo Abreu de Sousa, pretendiam fundamentalmente que lhes fosse reconhecido o direito de impugnação do acto de dispensa da fase de participação pública, do procedimento de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA). Para além disso, pretendiam também a condenação à prática do acto devido e uma indemnização de 250.000,00€ pelos danos sofridos.
O julgamento, que desde logo se adivinhou bastante agitado, teve início, como seria de esperar, com o pedido da acusação para que fosse declarada procedente a acção. Já a defesa, após afirmar a inocência e boa fé do réu, alegou a validade de toda a actividade em causa (criação e abate de gado bovino), lembrando a todos os presentes o grande investimento económico em causa, assim como as expectativas jurídicas criadas.
A advogada do Ministro do Ambiente, que se pronunciou em seguida, alegou que mesmo que todo o procedimento tivesse sido respeitado, os resultados seriam os mesmos, e que os interesses em jogo não podiam ser postos em causa devido a meras formalidades. Por último, deixou claro que a existir algum dano, nunca poderia ser responsabilizado o Ministro do Ambiente.
O Ministério Público (MP), por sua vez, considerou que o pedido de indemnização, não deveria ser aceite, pois a competência para o mesmo pertencia aos tribunais civis, tendo o colectivo de juízes, logo que terminadas as alegações iniciais, absolvido os réus do pedido de indemnização.
Iniciada a fase de inquirição das partes, foi a vez dos autores darem a conhecer os factos que os levaram a instaurar a acção. Seguidamente o réu Amílcar, invocou a vontade de inovar, tendo assegurado que eram usadas apenas as melhores técnicas. Já o Ministro do Ambiente, referiu que meros formalismos não poderiam impedir a realização de elevados interesses nacionais, nem deixar fugir investimentos tão avultados. Quando o MP o questionou sobre se considerava os interesses económicos superiores aos ambientais, este respondeu que no caso em concreto as vantagens económicas eram superiores ao potencial risco ambiental.
Chegado o momento da inquirição das testemunhas de acusação, Joaquina dos Santos, engenheira ambiental, deu a conhecer um estudo recente que corroborava a versão de que as técnicas usadas não teriam sido as mais adequadas.
Anabela Varela, técnica ambiental, falou acerca da qualidade da água do rio, esclarecendo que se a água não é potável para consumo, também não será para a agricultura, tendo em conta que os alimentos regados serão posteriormente consumidos. Considerou também essenciais avisos/letreiros informativos a alertar a população para a má qualidade da água. Passada a palavra ao advogado de defesa, este questionou a testemunha acerca do seu conhecimento sobre o projecto em causa, relembrando que tinha sido instalada, conjuntamente com a unidade de criação de gado bovino, uma ETAR. Ao confrontá-la com dois documentos da CCDRC, acerca da evolução da qualidade da água desde a instalação da ETAR, ocorreu aquele que foi o momento de maior inquietação durante toda a audiência, tendo a acusação reagido com grande exaltação aos estudos em causa, alegando que a autoridade competente para a elaboração dos mesmos seria a CCDR-Norte, e chegando inclusive a afirmar, que os estudos apresentados seriam sobre o Rio de Oliveira situado no distrito de Santarém.
Devido à confusão momentaneamente instalada os juízes viram-se obrigados a intervir para repor a ordem, pedindo às partes que não entrassem em diálogo.
As testemunhas que se seguiram foram Marta e Gertrudes da Silva, filha e mulher de Bernardim respectivamente. Ambas falaram acerca dos problemas de saúde que a água do rio lhes causou, tenho a primeira sofrido um parto prematuro, vivendo em grandes dificuldades por causa do seu filho ainda doente, e a segunda uma intoxicação alimentar, que para além dos vómitos e náuseas, a levou a uma grande perda de peso. Quando questionadas pelo advogado de defesa acerca do nexo de causalidade entre a qualidade da água do rio e os problemas de saúde, as duas afirmaram que essa desconfiança se devia aos exames médicos feitos, que indicavam elevados níveis de chumbo nos seus organismos.
A última testemunha de acusação, Isaltina de Sá, moradora da zona, que pescava regularmente no rio com o marido, falou nas alterações que observou na qualidade da água, após a instalação da unidade de criação de gado bovino, afirmando que se tinha tornado impossível continuar o seu passatempo, devido à sujidade, ao cheiro e à quantidade de peixes mortos que surgiram naquele local.
Chegado o momento de inquirição das testemunhas de defesa, José de Horta, presidente da Câmara Municipal do Rio de Oliveira, voltou a reforçar a grande importância do projecto em causa, que contribuiu para um grande dinamismo da área. Quanto à qualidade da água, teria melhorado desde a instalação da ETAR. Por último, relembrou que a actividade tinha sido licenciada. Quando o MP o questionou sobre se teria agido com pouca diligência ou cuidado, respondeu que tinha tido acesso a um estudo fornecido por Amílcar, e que tendo havido deferimento tácito, não podia fazer nada quanto ao facto da instalação se encontrar num Parque Natural.
A audiência prosseguiu com as inquirições da cientista Maria Rebelo, que assegurou que o projecto em causa era seguríssimo do ponto de vista ambiental, e do jurista Luisinho Silva, que confirmou estar-se perante uma clara situação de deferimento tácito e que o projecto era de elevada importância para o país. As advogadas de acusação confrontaram-no com a incompetência da entidade que procedeu à dispensa, tendo aliás o MP considerado que a avaliação jurídica do jurista era errada, e que o documento apresentado pela defesa não fazia prova de um despacho conjunto.
Logo em seguida, foram chamadas a testemunhar a técnica ambiental Sílvia Reis, que declarou que a qualidade da água era péssima, tendo melhorado com a instalação da ETAR, e que afirmou ter visto nas margens do rio avisos a informar a população da má qualidade da água (tendo a acusação chamado a atenção para o facto de ter sido a única testemunha a ver isso), e a economista Maria Roscas, que testemunhou a favor do Ministro do Ambiente, confirmando a relevância económica do projecto, e a sua contribuição para a dinamização económica daquela região.
Terminada a longa inquirição de testemunhas a acusação fez as suas alegações finais, onde relembrou que a água inicialmente potável tinha sido contaminada por metais pesados; que o deferimento tácito não era válido; que o Ministro do Ambiente tinha feito prevalecer o interesse económico sobre o ambiente; que o princípio da precaução tinha sido violado e que não havia qualquer documento a provar que o projecto em causa seria PIN+.
Já o advogado de Amílcar relembrou a sua boa fé, as suas expectativas jurídicas, o forte investimento já feito, e a existência de licença para o exercício da actividade em causa.
Por sua vez, a advogada do Ministro do Ambiente reafirmou que mesmo que o procedimento tivesse sido cumprido o resultado seria o mesmo e que a existirem danos, estes nunca seriam da responsabilidade do seu cliente.
Mesmo antes de terminar a audiência, pronunciou-se o MP, que apesar de considerar o projecto inovador, considerou que tinha ficado a dúvida se o mesmo causava ou não danos ambientais.
Se o projecto não poderia ser considerado PIN+, dada a falta de prova, já quanto ao deferimento tácito, ele de facto existiu, sendo opinião do MP que o mesmo é susceptível de impugnação, por ir contra o principio da prevenção previsto no art.66º da CRP e do art.3ª a) da LBA. Tendo havido uma clara violação do dever de fundamentação ecológica, este deferimento não pode subsistir por violar também o Direito Comunitário, tendo sido invocado o acórdão Comissão contra Bélgica.
O MP pediu então que o acto de deferimento tácito fosse anulado, até porque perante as dúvidas criadas quanto aos danos ambientais em causa, funcionaria o princípio in dúbio pro ambiente.
Finalmente por volta das 14h45m, o juiz presidente declarou encerrada a audiência, devendo o acórdão do colectivo de juízes ser conhecido até quinta-feira, dia 29.


Cátia Monteiro, nº14393, sub2

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