Não nos parece que este procedimento pelo menos quando o licenciamento resulte de um deferimento tácito possa ser tido como compatível com a avaliação dos danos que se podem produzir e com a previsão de todos os mecanismos possíveis por parte dos Estados em matéria ambiental como pretendem as Directivas.
O Acórdão condena o Reino da Bélgica porque a regulamentação de duas das suas regiões, a da Flandres e a da Valónia não estavam de acordo com as Directivas: 75/442/CEE, 76/464/CEE, 80/68/CEE, 84/360/CEE e 85/337/CEE.
Manda esta legislação que seja feita pelos Estados tudo o que estiver ao seu alcance para evitar a lesão do meio ambiente o que pareceu ao tribunal não estar assegurado porque é admitido o deferimento tácito na legislação Belga.
Ora importa-nos este acórdão porque na nossa legislação também é consagrado em matéria de Avaliação de Impacto Ambiental o deferimento tácito, veja-se o artigo 19 nº 1 do regime de AIA.
Ora um deferimento tácito parece não fazer sentido pois este procedimento é especial do Direito do Ambiente e especificamente destinado a avaliar, efectivamente, se o projecto apresentado prejudica ou não o ambiente e para fazer o balanço entre os interesses em presença o que pode acabar numa de três decisões; decisão favorável ao particular, decisão condicionalmente favorável (aquela em que o particular estará condicionado à realização de determinados requisitos que a administração entendeu adequados para não lesar o ambiente), e por fim a decisão desfavorável.
Assim quando analisamos o procedimento da AIA verificamos também que ele poderá estar sujeito a quatro apreciações. Primeiro um parecer da Comissão de Avaliação, depois haverá o parecer final da comissão de avaliação (já tendo sido efectuado a discussão pública), elabora-se em seguida uma decisão de impacto ambiental e por fim o Ministro do Ambiente tem de emitir a decisão final. Pelo menos o estudo feito pela comissão técnica nomeada faz ou deve fazer um bom estudo para que sejam ponderados os interesses ambientais de forma séria.
Com a possibilidade consagrada no nº1 do artº19 o que parece acontecer é uma parcial irrelevância destes estudos pois uma vez corrido o prazo estabelecido (e que não é por vezes suficiente) a decisão favorável terá de ser dada. Neste ponto parece que a nossa legislação está, à semelhança do que fazia a legislação Belga, a desrespeitar as directivas supra referidas.
Contudo a nossa legislação consagra no nº 5 do art. 19 uma condição que a lei Belga não prevê. A entidade competente para o licenciamento terá antes de o conceder que proceder de forma condicionada. Deve tomar em consideração o estudo de impacto ambiental, os pareceres das entidades consultadas, a consulta pública e as razões de facto e de direito que permitam decidir favoravelmente.
Embora esta condição imposta pela legislação nacional permita defender que o caso Português é diferente do caso Belga parece incontornável que a entidade que em última instância vai verificar da compatibilidade do projecto com o interesse ambiental não é a mais competente nem a que foi pensada para tal, pois como já foi referido o procedimento da AIA é especial e particularmente criado para interesses ambientais por isso o cuidado com as entidades intervenientes devia ser maior.
Comentário ao Acórdão do Tribunal das Comunidades Europeias contra o Reino da Bélgica.
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Comentário sobre a legislação referente a canídeos do dia 11 de Março.
Sub.3
A problemática dos direitos dos animais é hoje muito actual. Dentre as várias perspectivas apresentadas parece-nos desde logo, face a nossa lei, de repudiar a tese de que os animais são titulares de direitos, uma vez que são considerados coisas. Inclinamo-nos mais para a tese de que os animais não devem ser sujeitos a situações penosas e cruéis porque ao homem, ser racional, cabe acautela-los uma vez que integram o habitat comum. Não que se tenha um dever jurídico de proteger os animais mas isto não significa que se sujeitem a situações penosas e degradantes só por impulsos perversos e fúteis quando não há razões culturais que o justifiquem. Mais assim é porque actualmente a tendência, quer de instrumentos jurídicos internacionais quer comunitários caminha no sentido de admitir a protecção dos animais de condutas abusivas.
Exceptuam-se claro está as excepções que a lei expressamente prevê mas que se justificam por motivos ora históricos ora culturais. O condenável é a submissão dos animais a actos cruéis perfeitamente evitáveis porque passíveis de serem substituídos por objectos que desempenhariam as mesmas funções.
É esta a linha de raciocínio que o acórdão da Relação de Guimarães de 29.10.2003 faz quando ajuíza da conformidade da prática de tiro aos pombos e conclui pela sua ilicitude uma vez que os alvos (pombos) eram perfeitamente substituíveis por objectos. Para além deste argumento o tiro aos pombos não é excepcionado na lei como o são a caça ou as touradas.
Mas tal não implica que por vezes não seja necessário regulamentar as condições de conservação dos animais seja por motivos de saúde pública seja por respeito aos direitos subjectivos que podem ser afectados. É o que faz o decreto-lei nº 314/2003 quando estabelece medidas sanitárias a que os animais domésticos devem ser submetidos e quando estabelece igualmente as condições em que os particulares devem possuir os animais nas suas casas.
Contudo o artigo 3º, nº6 do decreto-lei foi declarado inconstitucional e consequentemente desaplicado pois que ao atribuir competência aos tribunais judiciais (para emitir o mandato judicial que permitia aceder ao local onde o animal se encontrava) o governo está a definir a competência dos tribunais o que só pode fazer mediante autorização legislativa da Assembleia da República dada a sua reserva de competência prevista no artigo 165º,nº1,alínea p) da Constituição.
Para além do já referido é também de invocar que estamos perante um acto administrativo o que nos remete para a competência dos tribunais administrativos.Pode parecer algo estranho porque a ordem judicial parece ser destinada a permitir a entrada das autoridades em casa de um particular para se apoderar dos animais aí existentes, o que nos levaria para os tribunais judiciais, mas ainda assim o acto traduz um poder público e coercivo de “ius imperii” típico de direito administrativo.
Francisca Fé
Nº 14541
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