Artigo 278.º

(Danos contra a natureza)

1. Quem, não observando disposições legais ou regulamentares, eliminar exemplares de fauna ou flora ou destruir habitat natural ou esgotar recursos do subsolo, de forma grave, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 600 dias.
2. Para os efeitos do número anterior o agente actua de forma grave quando:
a) Fizer desaparecer ou contribuir decisivamente para fazer desaparecer uma ou mais espécies animais ou vegetais de certa região;
b) Da destruição resultarem perdas importantes nas populações de espécies de fauna ou flora selvagens legalmente protegidas;
c) Esgotar ou impedir a renovação de um recurso do subsolo em toda uma área regional.
3. Se a conduta referida no n.º 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa.


É hoje incontestável a natureza do ambiente como bem jurídico fundamental, materializada nos nossos já bem conhecidos artigos 9.º e 66.º da Constituição da República Portuguesa. Constituindo o direito penal a última e mais acerada forma de reacção por parte da ordem jurídica contra violações especialmente graves dos referidos bens jurídicos, temos deste modo preenchidos todos os pressupostos necessários para a criminalização de condutas atentatórias do ambiente. É neste seguimento que surge − com o DL 48/95, de 15 de Março − o tipo legal de crime constante do artigo 278.º do Código Penal (CP), que nos propomos a analisar.
Nos termos do artigo 278.º, n.º 1, “quem, não observando disposições legais ou regulamentares, eliminar exemplares de fauna ou flora ou destruir habitat natural ou esgotar recursos do subsolo, de forma grave, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa até 600 dias”.
O bem jurídico tutelado é, pois, o ambiente, integrando-se o tipo legal em análise no complexo dos denominados crimes contra o ambiente − artigos 278.º a 281.º do CP.
Quanto ao tipo objectivo de ilícito, da leitura do preceito resultam desde logo claros dois aspectos: em primeiro lugar, estamos perante um dos casos em que o direito penal surge com uma função acessória relativamente ao direito administrativo, uma vez que se faz depender a punição da inobservância de normas regulamentares; em segundo lugar, a determinação do conteúdo da norma é feita mediante remissão a “disposições legais ou regulamentares”, pelo que se trata de norma penal em branco.
No que concerne à questão da acessoriedade do direito penal relativamente ao direito administrativo, surge a problemática de saber quais os requisitos a que o acto administrativo − no nosso caso o regulamento − está sujeito de modo a que a sua violação seja apta à afirmação da tipicidade da conduta do agente. Em primeira linha, deve entender-se que nunca preenche o tipo objectivo de ilícito o agente que viola um acto administrativo inválido ou ineficaz. Por outro lado, como defende a Professora Fernanda Palma, a validade do acto administrativo não deve ser aferida exclusivamente em função de critérios administrativos, mas também segundo critérios de direito penal, ou seja, de danosidade social.
Prosseguindo na análise da factualidade típica, podemos dizer que temos três situações que constituem a base do tipo objectivo: a) eliminação de exemplares de fauna (conjunto de todos os animais) ou flora (universo das espécies vegetais); b) destruição de habitat natural (condições ambientais de que dependem a vida, desenvolvimento e reprodução de determinadas espécies); c) esgotamento de recursos do subsolo (recursos naturais existentes na crosta terrestre integrantes das categorias de depósitos minerais, recursos hidrominerais, recursos geotérmicos, massas minerais e águas de nascente).
Com efeito, para que haja preenchimento do tipo objectivo de ilícito não basta que o agente, com a sua conduta, tenha provocado um dos resultados acabados de referir, mas que o tenha feito de forma grave, o que sucederá quando: “fizer desaparecer ou contribuir decisivamente para fazer desaparecer uma ou mais espécies animais ou vegetais de certa região” [n.º 2, al. a)]; “da destruição resultarem perdas importantes nas populações de espécies de fauna ou flora selvagens legalmente protegidas” [n.º 2, al. b)]; “esgotar ou impedir a renovação de um recurso do subsolo em toda uma área regional” [n.º 2, al. c)]. O n.º 2 vem, pois, concretar o que deva entender-se por forma grave de produção dos resultados previstos no n.º 1; efectivamente, só nos casos em que estes últimos forem gerados nos moldes acabados de referir é que se poderá afirmar a tipicidade da conduta do agente.
Em relação à tipicidade subjectiva, iremos unicamente referir que se admite o preenchimento do tipo legal tanto a título doloso como negligente − a esta última hipótese se refere o n.º 3.
Também não se afigura de todo despiciendo fazer notar que são configuráveis hipóteses de concurso efectivo entre o crime em análise e os previstos nos artigos 279.º (poluição) e 280.º (poluição com perigo comum).
Por fim, no que toca à moldura penal, temos que se o crime for praticado dolosamente o agente será punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa até 600 dias (n.º 1); se, pelo contrário, se verificar a negligência do tipo, o n.º 3 prevê pena de prisão até um ano ou pena de multa.

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