O direito de propriedade individual é um direito de expressão constitucional (62/I CRP), classificado como direito de natureza análoga a direitos, liberdades e garantias, não sendo despiciendo o enquadramento sistemático que este encontra na Constituição. Esta colocação estratégica do direito de propriedade confirma a sugestão constitucional de que não existe uma ligação directa entre direito de propriedade e a tutela da autonomia privada e da liberdade e dignidade pessoais.
Do que foi dito não se deve concluir a negação da importância deste direito, cujo enquadramento sistemático é facilmente explicável com o recurso à História Constitucional recente. Todavia, a definição do conteúdo do direito foi deixado pela CRP ao critério da lei ordinária, no caso, o Código Civil.
O âmbito do direito de propriedade abrange, em teoria, pelo menos quatro elementos, a sabre: a) a liberdade de adquirir bens; a liberdade de usar e fruir dos bens de que se é proprietário; a liberdade de os transmitir e, por fim, o direito de não ser privado desses bens. O art.º 1305 do CC diz a este respeito que o proprietário goza destes poderes de modo pleno e exclusivo, precisando que acima dos poderes do proprietário não existam outros poderes sobre a coisa, não obstante, ser o mesmo artigo a consagrar as possíveis restrições susceptíveis de comprimir esse direito.
A ideia de um direito de propriedade absoluto e ilimitado, fruto das concepções liberalistas, tem vindo a descaracterizar-se pela acentuação do fim social deste direito, em paralelo a necessidades de tutelar outras realidades e valores constitucionais incompatíveis com um direito de propriedade absoluto e inabalável.
A este propósito interessa ter em conta os limites explícitos na CRP, mas também limites não expressos, decorrentes de outras normas e princípios constitucionais, dos quais os direitos sociais são um bom exemplo.
A ausência de uma “reserva de lei restritiva” impede que se determinem restrições mais ou menos profundas ao direito de propriedade desde que estas respeitem os limites impostos às leis restritivas de direitos, liberdades e garantias ( e a disposições análogas como é o caso).
A Constituição da República Portuguesa desde a sua primeira versão incluo o ambiente no elenco de direitos e deveres económicos, sociais e culturais, estabelecendo que “todos têm direito a um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender (art. 66/I, CRP).
Trata-se da consagração de um direito fundamental, um direito subjectivo, público, que abrange uma vertente positiva (direito a acções do estado no sentido de defender o “ambiente”), mas também de conteúdo negativo (direito a exigir do Estado e de terceiros que se abstenham de praticar actos ambientalmente lesivos).
A defesa do Ambiente pode pois justificar restrições a outros direitos constitucionalmente protegidos. O direito de propriedade está assim sujeito a medidas planeadoras de protecção do ambiente (Planos de ordenamento territorial, reservas e parques naturais, classificação e protecção de áreas, paisagens e sítios).
Ganha assim consistência, a ideia atrás exposta, de um direito de propriedade não absoluto, com um cariz reconhecidamente social e sujeito a necessárias restrições.
O Direito do Ambiente assume-se assim, como mais do que um regulador ou ordenador das relações do homem com o meio. Trata-se com toda a certeza de um sistema jurídico que tende a infiltrar e influenciar outros ramos do direito, completando ou restringindo-os.
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